Municipalização das Escolas – um processo sem consensos

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Maria do Céu Santos
Maria do Céu Santos

No momento em que se torna irreversível o processo de municipalização das Escolas, é importante refletir um pouco sobre as questões que suscita.
No preâmbulo do DL 21/2019, de 30.01, refere-se o exercício de competências pelas autarquias locais no domínio da educação como uma realidade com mais de três décadas e um dos fatores decisivos na melhoria da escola pública, nomeadamente na promoção do sucesso escolar e na subida constante da taxa de escolarização, bem como o facto de as autarquias terem assumido um papel essencial na expansão da rede nacional da educação pré-escolar, na construção de centros escolares.
Antes de mais, é devida uma palavra de apreço aos autarcas pelo trabalho efetuado no âmbito do ensino pré-escolar e do 1.º ciclo onde a lei lhes atribuía competências que passam a abranger os restantes ciclos.
Garantindo expressamente o respeito pela autonomia curricular e pedagógica das Escolas e Agrupamentos, bem como a salvaguarda da autonomia pedagógica no exercício da atividade docente, o novo regime legal procede à transferência de competências do Ministério da Educação para as Câmaras Municipais, a partir de um de setembro, nos termos que se sintetizam:
– Pessoal não docente: passa a integrar o mapa de pessoal das câmaras municipais, que procedem ao seu recrutamento e seleção para o exercício de funções nas Escolas e Agrupamentos da rede escolar pública do Ministério da Educação localizados nos respetivos territórios,
– Ordenamento da rede educativa: nas comunidades intermunicipais, o planeamento plurianual da rede da oferta educativa passa a ser da competência do secretariado executivo intermunicipal, sendo aprovado pelo conselho intermunicipal, ouvidos os agrupamentos de escolas.
– Plano de transporte escolar: criação de circuitos especiais, sempre que os meios de transporte coletivo não satisfaçam regularmente as necessidades de transporte no que se refere ao cumprimento dos horários escolares, ou que impliquem, para os alunos, tempos de espera superiores a 45 minutos ou deslocações superiores a 60 minutos, em cada viagem simples.
– Fornecimento de refeições: em refeitórios escolares dos estabelecimentos de educação pré -escolar e dos ensinos básico e secundário passa a ser gerido pelas câmaras municipais.
– Construção, requalificação e modernização de todos os edifícios da rede escolar pública, com exceção dos que pertencem à Parque Escolar.
– Gestão de pessoal: Sem prejuízo das competências próprias do presidente da câmara municipal e dos órgãos municipais, os diretores das Escolas e dos Agrupamentos mantêm, relativamente ao pessoal não docente, os seguintes poderes: a) Poder de direção; b) Fixação do horário de trabalho; c) Distribuição do serviço; d) Poder disciplinar de aplicação de pena inferior a multa.
Desde logo verificou-se que o novo regime não agradou a grande parte da comunidade educativa. Os sindicatos dos professores e do pessoal não docente vieram opor-se ao processo de municipalização, alegando que o mesmo se traduz na «desregulação e desresponsabilização do Estado», não trazendo quaisquer vantagens à Escola Pública. As pessoas mais diretamente visadas no novo regime – os trabalhadores não docentes – têm manifestado, quer individual, quer coletivamente, o seu descontentamento relativamente à sua transferência da administração central para a regional.
Finalmente, as autarquias não revelaram particular entusiasmo, propondo algumas a reversão do processo de aceitação das competências, e outras o seu adiamento.
Em suma, não se ouvem nas comunidades educativas, vozes concordantes com as alterações impostas pelo novo regime legal. Talvez os políticos devessem preocupar-se um pouco mais com os consensos dos profissionais envolvidos, tão necessários ao sucesso do processo de transferência de competências.
Independentemente de se concordar ou não com o novo regime legal, não se revelando o mesmo reversível (entra em vigor dentro de dias), aos profissionais da Educação incumbe, em estrita colaboração com os órgãos locais eleitos, fazer o seu melhor, a bem do sucesso dos nossos alunos.