«Pavese no café Ceuta» de Francisco Duarte Mangas

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Reunião de 16 narrativas em 184 páginas, deste recente trabalho de Francisco Duarte Mangas se poderá afirmar um conhecido lugar-comum – «toda a Literatura é uma homenagem à Literatura.» Depois de «Diário de Link», «Geografia do Medo» e «Jacarandá» o autor, logo na primeira narrativa, apresenta um retrato da paixão dos livros: («miram o homenzinho a alojar livros como se os metesse dentro dele.») ao lado de uma lucidez magoada («Se um homem das belas letras, à nossa frente, indispõe – que dizer de um magote, como ratinhos em busca de jorna nas remotas searas do Sul?») passando por Eça de Queirós («respeitoso como se olhasse a bandeira e ouvisse o hino») ao lado da amizade: «Se a doutora Luísa Dacosta perguntar por mim, diga-lhe, por favor, fui a Granada.» Em «Lenha verde» pode ler-se uma frase que resume tudo: «Eu escrevo lendo os outros». Ou dito de outra maneira: «Não se vende o que se ama. Em vez de filhos criei heterónimos – impedidos de herdar qualquer legado.» Em «Clandestinos» o ponto de partida é o anúncio de jornal: «Travesti Cláudia, curta temporada. Activa/Passiva. Peito XXL. Meiguinha. Sem pressas.» mas Gabriela sai do livro de Jorge Amado e procura saber algo mais de Gisberta antes de ela ser «fétida melancolia, brinquedo de moleque…» Em «Pavese no café Ceuta» o equívoco é do autor de «O ofício de viver» : «Li todos os livros do poeta que aqui julgava encontrar» mas o poeta português que o italiano procura está no café Progresso e não no café Ceuta.
Herdeiro de Leitão de Andrade, Camilo Castelo Branco e Carlos de Oliveira com as suas Miscelâneas, Narcóticos e Aprendizes de Feiticeiro, Francisco Duarte Mangas avança uma feliz definição da paixão dos livros que está na origem deste livro: «Tenho o vício absurdo de guardador da palavra escrita.» Tal como antes tinha na página 85 referido a Poesia: «A poesia, se não for o lugar onde o desejo ousa fitar a morte nos olhos, é a mais fútil das ocupações.»
(Edição: Teodolito, Editor: Carlos da Veiga Ferreira)