O fotógrafo é caldense e fotografou cerca de 80 conterrâneos durante o confinamento

O fotógrafo caldense Nuno Conceição retratou os seus conterrâneos à janela das suas casas durante a pandemia, num projecto em que as fotografias eram publicadas online, acompanhadas por textos da autoria dos retratados. “Somos Nós” é o nome deste verdadeiro retrato social de uma era conturbada nas vidas de todos nós

Desde 18 de Abril que o fotógrafo Nuno Conceição sai à rua para fotografar os seus conterrâneos à janela. Pede-lhes que façam um texto sobre este período e publica on-line (no Facebook e Instagram) a fotografia com a descrição feita pelo retratado. O projecto intitula-se “Somos Nós” e é precisamente isso, um retrato social de uma era conturbada, mas cuja experiência de cada um é muito pessoal.
Nestes três meses, o caldense já fotografou cerca de 80 pessoas e ainda continua a publicar. Em termos de fotografias já faltam poucas, entre as quais dos voluntários da Refood.
Tudo começou com sugestões de amigos, mas que não convenceram o fotógrafo. “Pensava que isto ia passar rápido”, contou à Gazeta das Caldas. Nesse dia de 18 de Abril decidiu-se e saiu de casa, tendo fotografado um amigo e os donos de um café. Depois, uma amiga sugeriu a ideia de acompanhar as fotografias com textos dos próprios autores e o projecto ganhou forma.
“O que tinha começado como um pretexto para andar um pouco, ver amigos de forma segura e não perder a prática a fotografar, transformou-se em algo completamente diferente”, recorda.
Nos primeiros dias havia um óbvio receio, até porque é asmático e vive com mais duas pessoas de risco. “O medo esteve sempre muito presente, foi diminuíndo, mas nunca desaparece”, admite.
Nesse sentido, tentou sempre tomar todas as precauções.Entre os episódios caricatos está um, logo nos primeiros dias, em que depois de ver vários amigos e de sentir que não os podia abraçar, chegou a casa e sentou-se nos degraus das escadas, “com as lágrimas já a correr pela cara”. Foi quando se lembrou que não tinha desinfectado as mãos para poder limpar as lágrimas. Dessa vez, conta, viveu um carrossel de emoções – com choro e riso e novamente choro -, que é também um exemplo daquilo que tem sido a sua experiência com a pandemia.
É que “a nossa forma de lidar com os outros é muito próxima”. “Estamos habituados ao toque, ao abraço e isso, de repente, é-nos tirado”, faz notar.
Num balanço do projecto, Nuno Conceição considera que este é muito mais acerca das pessoas do que de si.
“Apesar de o projecto depender da fotografia, sempre disse que esta era apenas uma desculpa para colocar as pessoas a conversar”, disse.
E isso foi conseguido. Além das conversas que ia tendo quando fotografava as pessoas, o projecto conseguiu colocar os caldenses a conversar nas redes sociais, quando viam o retrato de alguém conhecido e acabavam por ler um texto feito por essa pessoa.
Uma das curiosidades deste projecto é que permite perceber quão diferente é a experiência de cada um neste cenário. “Desde os que vivem isto com muita naturalidade aos que ficaram paralisados, por medo ou porque os trabalhos encerraram, até a alguns que gostaram”, faz notar o caldense.
O jovem referiu também que houve uma coisa que o assustou nestes tempos de pandemia. “Dos relatos que ouvi, foi como nos foi fácil virarmo-nos para dentro. Não olhar para o outro, não prestar atenção, não procurar saber das outras pessoas”, nota.
Outro aspecto complicado foi perceber as complicações que a pandemia trouxe à vida de todos e de cada um. “Houve casos, por exemplo, de pessoas que não se puderam despedir de familiares e amigos que faleceram nesta altura, mas por outras causas que não a covid-19”, exemplificou. Outros ficaram separados da família, houve quem visse os rendimentos cortados e quem ficasse a depender da solidariedade dos outros para poder sobreviver.
Sempre a pé, o mais longe que o fotógrafo andou foi até às Gaeiras, sendo que nas Caldas atravessou a cidade do Avenal ao Bowling.

UM CALDENSE DE GEMA

Este caldense, de 35 anos, estudou na escola do Bairro do Ponte, na EBI Sto. Onofre e na Bordalo Pinheiro e também frequentou o curso de Som e Imagem na ESAD. O gosto da fotografia nasceu aí, em 2009, quando adquiriu uma máquina para o curso. “Gostei da sensação”, contou. A partir daí foi-se interessando e aprendendo sobre o tema.
Actualmente trabalha com uma magazine on-line e faz parte da equipa que fotografa o festival NOS Alive. “O que gosto mais é de fotografar concertos”, diz Nuno Conceição, que também faz outros serviços, como casamentos, publicidade e retratos. Nesse campo tem um projecto que se iniciou em 2016 e que também retrata os seus conterrâneos. Chama-se Caras da Minha Terra e conta com mais de 60 retratados.