Assiste-se atualmente a uma certa tendência nos textos escolhidos pelos novos escritores. Com uma formação académica na área da história, muitos autores dedicam a sua atenção a episódios ou personagens históricas, com enfase para os enredos portugueses.
Falo hoje de um livro publicado em 2010, por Ana Rodrigues Oliveira, em que a autora se ocupa da história de 17 Mulheres, personagens que ocuparam 4 séculos de história. Entre tão insignes Senhoras encontramos D. Leonor de Lencastre (1458-1525) a que a autora apelida de “Princesa Perfeitíssima”, que será o objeto da nossa atenção. Vamos dedicar a nossa atenção à passagem referente à sucessão ao trono.
[…] “O desaparecimento de D. Afonso abriu um vazio não só no coração da rainha mas também na sucessão régia. Após a morte do filho, D. Leonor não mais quis ver D. Jorge, o bastado do marido, outrora recebido com tanta honra e amor.
Segundo o cronista [Rio de Pina], o rei por se não despertar mais dor à rainha, sua mulher, com a visita do Senhor Dom Jorge lembrando-lhe a morte do filho, houve por bem que por então não viesse a sua casa, entregando-o aos cuidados dos condes de Abrantes. Entretanto, diligenciou junto da Santa Sé o seu reconhecimento como filho legítimo capaz de lhe suceder e a concessão do governo dos mestrados de Aviz e Santiago, que mereceu o acordo do papa Inocêncio VIII logo em 1491. D. João tentava dar ao filho sobrevivente o estatuto e os bens que tinham pertencido ao irmão entretanto desaparecido, a começar pela chefia das próprias Ordens. Nada disto agradava a D. Leonor, e, embora el rei com fundamento honesto e virtuoso o fizesse, a rainha foi tão dura e tão contrária, que nunca em vida del rei o quis recolher nem ver. Se, antes, aceitara o pequeno bastardo enquanto criança desprotegida, não podia no entanto, aceitar que fosse esse filho, que não era seu, a ocupar o lugar que legitimamente pertencera ao seu falecido filho.
Na verdade, o estatuto de D. Jorge alterou-se. De bastardo passou a ocupar o lugar de único filho vivo do rei; o facto de este determinar torna-lo seu sucessor na Coroa constituiu o centro do maior conflito interno que o reino conheceu no final do reinado de D. João II. Neste ponto, a rainha não podia estar em mais desacordo, defendendo os direitos sucessórios de seu irmão D. Manuel, o varão legítimo mais próximo do rei e o único neto por via legítima e varonil do rei D. Duarte, para além do próprio D. João II. Reconhecer este direito ao duque de Beja seria, para além de legitimo, uma forma de o rei se redimir da humilhação e das mortes que tinha infligido à sua família.”
E a narrativa não ficou por aqui…