Nos anos 60, uma jovem inglesa trocou o seu país por Portugal com o sonho de se tornar toureira. Ginnie Dennistoun cumpriu o seu objectivo tendo-se estreado na Praça de Touros das Caldas em Maio de 1965.
Quem descobriu esta história foi Clara Macedo Cabral, autora que vive em Inglaterra e que escreveu, com base em factos reais, o romance A Inglesa e o Marialva.
Gazeta das Caldas entrevistou-a, por e-mail, para saber mais sobre a estrangeira “que se fez quase portuguesa, que aprendeu a falar e a escrever português, a montar à portuguesa, a tourear, deixou aqui amizades e viveu aqui um grande amor”.

GAZETA CALDAS: De que trata este seu livro? Como resolveu organizá-lo?
CLARA MACEDO CABRAL: De uma inglesa que nos anos 60 com vinte e poucos anos trocou a Inglaterra por Portugal com o sonho de se tornar toureira. De uma pessoa extremamente corajosa, com necessidade de se pôr à prova e se superar fisicamente, que foge de Inglaterra porque é aventureira (e por causa também de um desconforto familiar) e que encontra em Portugal um país que aprende a amar.
Trata-se de uma estrangeira que se fez quase portuguesa, que aprendeu a falar e a escrever português, a montar à portuguesa, a tourear, deixou aqui amizades e viveu aqui um grande amor. Trata da tensão das vidas das pessoas que deixam os seus países e tentam integrar-se noutro.
O livro alterna a voz da primeira pessoa (de uma Virgínia na meia idade a aproximar-se progressivamente do fim da vida) com a voz na terceira pessoa que acompanha o período da sua juventude.
GC: Quando foi lançado e onde é que já o apresentou?
CMC: O livro foi lançado em Julho na livraria Buchholz em Lisboa e teve casa cheia. No dia 2 de Setembro dei uma sessão de autógrafos nos jardins do Palácio de Belém, integrada na terceira edição da festa do livro de Belém. E até ao final do ano vou fazer lançamentos e apresentações no Porto (19/10) Coruche (20/10) Golegã (10/11) e Ponta Delgada (17/11).
Uma curiosidade: o vídeo promocional do meu livro tem imagens da Ginnie numa corrida na Praça de Touros das Caldas e pode ser visto em www.youtube.com/watch?v=JukyWPxq5pg
GC: Como descobriu esta história?
CMC: Descobri esta história em Londres, num cocktail, quando fui apresentada ao irmão de Ginnie. Ele percebeu logo pelo meu nome que eu era portuguesa e disse-me: “sabe, tive uma irmã que foi para o seu país, aprendeu a tourear e viveu com um português”.
GC: Qual é a ligação de Ginnie Dennistoun à região Oeste?
CMC: Ginnie fez férias em S. Martinho do Porto onde a família do seu professor, Alberto Luís Lopes, passava sempre o Verão. Aliás, São Martinho é referido no livro, a praia e o “Delírio”, o ponto de encontro da época. Ginnie estreou-se na praça de touros das Caldas da Rainha a 16/5/1965, numa corrida em que participou o Grupo de Forcados Amadores da Estremadura.
GC: O que mais a impressionou quando descobriu o percurso desta inglesa, apaixonada pelo mundo dos cavalos e do toureio?
CMC: A coragem dela até ao fim, como ela se adaptou e o que ela gostou de Portugal apesar do atraso, da pobreza, da ditadura, da diferença do seu país.
GC: Não deverá ter tido vida fácil num meio tão masculino…
CMC: Foi muito difícil furar um meio tão fechado, elitista e masculino e foi ainda mais difícil conformar-se com um mundo em que a posição da mulher era dentro de casa, calada e submissa.
GC: Ginnie Dennistoun tem um percurso inverso ao seu. Quer comentar?
CMC: Ela veio de Inglaterra para Portugal e apaixonou-se ali por um homem. Eu mudei-me de Portugal para Inglaterra por causa do meu marido que já lá vivia. Ambas sabemos o difícil que é a integração. É um processo mais difícil no início, mas sempre em aberto, nunca acabado.
GC: Ginnie regressou a Inglaterra?
CMC: Regressou. Mas no fim da vida recordou muito Portugal, escrevia aos amigos portugueses, queria comprar um cavalo lusitano.
GC: A que projectos está a dedicar-se neste momento?
CMC: Tenho ideias para um novo livro, mas também tenho sérias reticências. Um livro esgota-nos, agrava o isolamento de quem vive num país de invernos longos, escuros e frios, e pouco propícios à sociabilidade (em Londres costumamos dizer, por brincadeira, que hibernamos).
Um livro deseja-se e não se deseja ao mesmo tempo, e certamente requer pausas até nos sentirmos capazes de novo empreendimento. Vou fazer uma pausa de certeza e quem sabe surgem até projectos diferentes.