Cerâmica contemporânea passa a dar nova vida à Rua Manuel Mafra

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Grandes peças de Mário Reis e de Carlos Enxuto decoram Bairro da Ponte e provam que cerâmica é boa resposta na requalificação do espaço público

Foram inauguradas, a 4 de março, na confluência da Rua Manuel Mafra com as ruas Eduardo Mafra Elias e Francisco Gomes Avelar, duas esculturas cerâmicas de Carlos Enxuto e de Mário Reis. Algumas dezenas de pessoas quiseram assistir ao momento da inauguração destas obras de arte pública que medem perto de dois metros de altura e que foram colocadas em caixas de vidro e que agora dão vida àquela zona do Bairro da Ponte.

Mário Reis colocou referências da cerâmica, da cidade, do bairro e da sua vida

“Quando me convidaram quis juntar várias referências da minha vida, deste bairro, de Mafra e também da cerâmica caldense”, disse Mário Reis, o autor da peça “Conversas de Bairro”, a primeira a ser inaugurada. A obra que tem na base elementos de azulejaria do século XVIII, da cerâmica naturalista que Mafra também fazia, está repleta de símbolos relacionados com familiares do artista. A sua filha faz aquele trajeto entre a Secundária Raul Proença e a casa dos avós, seus sogros e por isso há várias referências pessoais.
“A partir das cinco não faço nem mais um…”, pode ler-se num dos azulejos. Foi desta forma subtil que Mário Reis fez referência à cerâmica fálica local. Além do mais, estão representadas as visitas que fazia à oficina do tio Armindo Reis onde a partir das 17h00 já não se trabalhava pois “era hora de conviver com os amigos na taberna Amália”, contou. “Toda a peça tem a ver com as Caldas”, acrescentou o autor que usou cores como o verde Caldas e o Amarelo Mel. A peça é encimada por um Gato e a uma Gaivota que estão a conversar. “Os gatos são a companhia de muitos que aqui vivem e, as gaivotas, quer queiramos quer não, são as novas moradoras”, explicou o ceramista que espera que a sua peça possa ser apreciada por todos.

Carlos Enxuto colocou Rafael Bordalo Pinheiro a “dialogar” com Manuel Mafra

Bordalo veio conversar
“À conversa”, designa a peça de Carlos Enxuto, que queria referir uma possível conversa entre Manuel Mafra e Bordalo Pinheiro. Deparou-se logo com um problema: não existem fotografias de Manuel Mafra, “há apenas uma caricatura lateral que Bordalo fez de Mafra”, contou o autor que ainda assim se questiona se os autores, que foram rivais, terão conversado já que foram contemporâneos.
A peça, com o perfil de Bordalo, é rodeada por gatos. Um deles convida a que se visite a peça, e um segundo “representa o rei D. Luís, que foi protetor de Manuel Mafra”, disse Enxuto. Há um outro assanhado e outro mais calmo que são personagens desta conversa que Bordalo veio ter à Rua Manuel Mafra. Presentes nesta obra estão também várias placas que representam as fases da cerâmica das Caldas da Rainha.
Para este autor, “faz sentido pensar a cerâmica de uma forma diferente nas Caldas”, acrescentando também que a cerâmica e a arquitetura deveriam ser uma das apostas da cidade.

Cerâmica é marca identitária
A vereadora da Cultura, Conceição Henriques, recordou que a cerâmica é um dos elementos identitários da cidade e que permaneceu ao longo da sua história. Ao contrário de outros locais a cerâmica continua e mantém-se ainda hoje e a sua valorização “culminou com o reconhecimento de Cidade Criativa da UNESCO. O vice-presidente, Joaquim Beato, sublinhou a qualidade do trabalho dos dois autores, de carreira feita, e que agora podem ser apreciadas por todos na Rua Manuel Mafra. Segundo o autarca as peças foram concretizadas em oito meses e cada uma custou 7.500 euros. A escolha de Mário Reis e de Carlos Enxuto para a execução destas obras “é simples”, já que ambos “têm ligações ao Bairro da Ponte”.
Para o edil caldense, Vitor Marques, “Manuel Mafra há-de estar feliz por estar a ser homenageado por dois artistas contemporâneos”.
O presidente fez ainda referência aos muitos autores que trabalham nas Caldas e é preciso “continuar a dar-lhes palco”. E garantiu que o município vai continuar “a trabalhar a nossa identidade, que integra a água e a cerâmica que nos diferencia e distingue dos outros”. Vitor Marques diz que a cerâmica contemporânea continuará a ser apoiada e, sempre que possível, integrada no espaço urbano.
Teresa Pires Lopes é docente na EBI de Sto Onofre e moradora no Bairro da Ponte. “Fico muito feliz com estas peças pois temos ceramistas contemporâneos que são fantásticos e que ainda não tinham o seu espaço na cidade”, disse. A moradora, também ligada à cerâmica, vive há 35 anos neste bairro. Teresa Lopes conhece bem os dois artistas com quem até chegou a estudar no Cencal pois foi modeladora e discípula de Herculano Elias.■