A Loja do Sr. Jacinto recebeu a 27 e 28 de Setembro a exposição da Foz Fun que integra caricaturas, t-shirts e brinquedos dedicados ao Zé Povinho, agora retratado de forma mais contemporânea, mas sem perder a atitude contestatária perante os poderes.
Estas obras são de Francisco Moutinho, autor que se apaixonou pela Foz do Arelho, para onde veio viver há dois anos e onde gostaria de desenvolver um atelier de artes comunitário.
Francisco Moutinho sempre achou que Rafael Bordalo Pinheiro era um mestre, mas considerava que o Zé Povinho, figura usada para fazer sátira, precisava de se actualizar e ser retratado a realizar actividades do século XXI.
Com esta ideia, quis aproximar a figura que representa o povo à população mais jovem e começou por criar caricaturas. Por sugestão de amigos, criou também bonecos de madeira representando o Zé Povinho.
O autor, de 53 anos, é natural do Porto e já viveu em Trás os Montes e Lisboa. Durante 31 anos foi delegado de propaganda médica até que lhe foi diagnosticada a doença de Machado-Joseph. Trata-se de uma enfermidade rara e de origem genética que é comummente conhecida como a doença do tropeção, pois uma das primeiras áreas que afecta é a do equilíbrio, depois a fala e mais tarde provoca grandes dificuldades em engolir. “É algo que acontece a quem está vivo”, disse Francisco Moutinho, que encara de forma serena a necessidade de aprender a viver com os sintomas desta doença, que o fez mudar radicalmente de vida.
Escolheu a Foz do Arelho como local para viver e todos os dias ao fim da tarde é a Lagoa que lhe dá a tranquilidade de que precisa. Além do mais, a vila “é um sítio espectacular onde toda a gente se conhece”.
O seu trabalho artesanal também tem um segundo intuito: “achei que era necessário pensar em algo que atraísse as pessoas à Foz”. Daí ter criado a sua marca Foz Fun e de já ter exposto as suas propostas na Casa Museu Jaime Umbelino.
Zé Povinho de skate ou a surfar
E porque não modernizar o Zé Povinho e colocá-lo a andar de skate, a fazer windsurf, surf e halterofilismo? Apesar destes hobbies modernos, a personagem não deixa de ser irreverente e continua a fazer o tradicional manguito aos poderes.
O autor também produz desenhos onde se encontram retratados os flamingos da Lagoa e vários animais típicos da louça caldense, como os lagartos, a cegonha e o sapo. Da Foz Fun fazem parte duas colecções de postais com o Zé do povo nas mais variadas situações.
Os bonecos articulados são feitos com madeira, corda e tinta de água. São entregues a quem os compra em sacos feitos com pano de linho sem logótipo, apelando assim à reutilização.
Francisco conta com a ajuda do seu cunhado para desenvolver os mecanismos necessários aos bonecos de madeira onde o Zé Povinho dá piruetas, voa ou até pedala.
Antes de lhe ter sido diagnosticada a doença, Francisco Moutinho não sabia que tinha tanto jeito para desenhar. Acabou por descobrir esse novo talento, quando só a leitura já não lhe chegava para preencher o quotidiano.
“O público tem reagido muito bem às propostas”, contou o autor que também faz pequenos puzzles em madeira para as crianças.
Atelier comunitário para artistas da Foz
Francisco Moutinho gosta de vender no Sr. Jacinto pois “identifico-me com o conceito de loja onde se vendem peças de autor”, referiu o criador que não depende financeiramente deste seu trabalho.
Além de continuar a querer desenvolver mais trabalhos do Zé Povinho contemporâneo, o artista gostaria muito de criar um atelier de artes comunitário “onde vários autores poderiam desenvolver e vender as suas obras”.
A doença de Francisco Moutinho é progressiva e não se prevêem melhoras. No entanto, garante que enquanto puder vai continuar a desenhar e a fazer os seus trabalhos. Na verdade há um ano que anda a enganar a própria doença pois os médicos anteviam um escalar de sintomas que Francisco Moutinho está a conseguir controlar. “Gostava muito de fazer um pouco mais por esta zona que possui uma cultura fora de série, onde há tanta gente a trabalhar bem”, referiu o autor.