Maria Efigénia recorda momentos que viveu nos palcos caldenses

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Maria Efigénia Rodrigues das Neves gosta de recordar os idos tempos dos palcos

Desde miúda que lhe pediam para cantar. Era tal o talento que Maria Efigénia chegou aos palcos caldenses e foi convidada para a Emissora Nacional

Maria Efigénia Rodrigues das Neves tem 97 anos e recebeu, com grande afabilidade, a Gazeta das Caldas na sua casa, perto do Natal, para partilhar memórias da sua vida. E fê-lo com grande lucidez e detalhando factos com pormenor. Os seus pais eram portugueses, ambos da Beira Baixa, mas decidiram viver em terras de nuestros hermanos. “Da casa dos meus avós maternos, em Monfortinho, viam-se terras de Espanha”, contou a nonagenária, acrescentando ainda que, por vontade do seu pai, que “era um patriota”, veio nascer a Portugal, à casa dos avós.
Maria Efigénia tem mais três irmãos, todos nascidos em Espanha.”E estamos todos vivos!”, disse a mais velha dos quatro, lembrando que, com o início da Guerra Civil Espanhola, o seu tio Girão, irmão da mãe e um conhecido comerciante das Caldas, mandou a sua família vir para a cidade termal, sobretudo, porque tinham filhos pequenos.
“Cheguei às Caldas em 1936 com apenas 10 anos”, disse Maria Efigénia lembrando que o seu tio “foi uma alma bondosa para nós”, pois ajudou-os muito. Sobretudo porque, ao fim de um ano a viver nas Caldas, o pai de Maria Efigénia quis ver como estava a casa e os bens da família, tendo voltado a Espanha. Só que, por causa de um bombardeamento, apanhou um estilhaço que acabou por o vitimar.
“Aos onze anos já estava orfã de pai”, contou Maria Efigénia explicando que o seu tio – que tinha uma loja de tecidos na Praça -, incentivou a que todos os sobrinhos prosseguissem estudos. Quando acabou o curso do liceu, Maria Efigénia foi ajudar o tio e começou por trabalhar na loja do seu familiar.
“Eu adorava cantar canções espanholas…e portuguesas também”, disse a nonagenária que até chegou a cantar o fado num dos bailes do Casino, para fins de beneficência. E foi nos anos 50 do século passado que “pediram ao meu tio para eu entrar numa revista”. E o tio Girão lá permitiu que Efigénia fizesse parte da revista de costumes populares “A Vida é

Assim”, estreada no Teatro Pinheiro Chagas, na Praça 5 de Outubro, em julho de 1951.
Nesta peça estrearam-se vários debutantes, entre os quais Maria Efigénia Rodrigues, conforme noticiou a Gazeta das Caldas da época. Esta revista teatral teve quatro apresentações e Efigénia entrou em vários números. Era a sua prima, Natália Girão que a ajudava a pintar-se e a vestir-se para regressar ao palco. “Representei um toureiro e o fato que usei veio de propósito de Santarém. Também me recordo que também interpretei um engraxador!”, contou a artista que desde pequena a colocavam em cima da mesa e lhe pediam para cantar.
“Desde miúda eu era toda de cantar e dançar!”, disse e, tendo o talento reconhecido desde catraia, acabou por ser convidada para integrar o grupo de teatro amador das Caldas, que incluía pessoas que trabalhavam no comércio caldense. Como tal, os ensaios decorriam à noite, na cave de um café, situado ao fundo da Praça da Fruta. “Este tinha uma cave onde foi posto um piano e era aí que ensaiávamos”, contou. Sobre a revista “A Vida é assim” diz que “era tudo tão lindo! A música então era maravilhosa!”.

Mostrando as fitas que embelezavam as muitas flores que lhes foram oferecidas

Maria Efigénia foi também uma das pessoas que fez parte da opereta “Aposta Original” e lembra que por se tratar de música clássica até vieram atuar elementos da Orquestra da Emissora Nacional. Os músicos encantaram-se com a sua voz e convidaram-na para integrar a equipa da rádio Emissora Nacional. Só que o tio Girão já não deixou que fosse. Maria Efigénia hoje lamenta ter perdido esta oportunidade, mas na época resignou-se, pois era uma altura de muitas convenções e onde“os artistas tinham muito “má fama””. E até já era casada quando fez a opereta, assim como o tenor com quem Maria Efigénia contracenou. Os respetivos mulher e marido, além das estreias, “assistiram a todos os ensaios!”. Hoje recorda os aplausos e ainda guarda com orgulho as fitas das flores que lhe ofereciam. Maria Efigénia casou duas vezes e lamenta não ter tido filhos.
“O que me vale são os manos pois ainda nos juntamos todos aos domingos!”, disse a nonagenária que cantou em muitos eventos de angariação de fundos que serviram para a construção de equipamentos como a Igreja de N. Sra. da Conceição. ■