Recordar o “Inferno d’Azenha” no aniversário da P. Bernardo

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azenhaAs semelhanças entre o modo de funcionamento do espaço Inferno d’Azenha e como agora são dinamizadas as acções culturais pela associação P. Bernardo foram bem evidentes durante a tertúlia que teve lugar a 22 de Novembro.
O encontro, que teve como objectivo celebrar o quinto aniversário da associação P. Bernardo, deu-se exactamente no Inferno d’Azenha, na Quinta de Santo António. Aquele espaço mítico para várias gerações de caldenses (desde a década de 60) reabriu as suas portas para uma noite especial de festa e confraternização, onde não faltou uma mesa recheada de iguarias.
A associação P. Bernardo foi criada em 2009 devido à necessidade de dar um carácter formal às actividades promovidas na Casa e Museu Bernardo.
Dois anos antes, a 25 de Julho 2007, tinha sido inaugurado, num primeiro andar no número 16 da rua Engenheiro Duarte Pacheco, o Museu Bernardo.
Desde essa altura o mentor do projecto, Pedro Bernardo, tem contado com a colaboração de vários artistas na promoção das mais diversas actividades, sempre com um carácter muito informal e sem qualquer modelo de negócio por detrás, tal como acontecia no Inferno d’Azenha.
“A Azenha fazia parte dos espaços da vida boémia e cultural, os quais são fundamentais para a vida das cidades e que eram alimentadas por um conjunto de criadores”, destacou o historiador João Serra, um dos três oradores convidados para esta tertúlia.
Luísa Arroz, que esteve por detrás da organização deste evento, destacou que o evento teve como objectivo, não só celebrar o aniversário desta entidade, mas também mostrar o trabalho que desenvolve no campo das artes e ao mesmo tempo fazer uma recolha de fundos “para termos mais um ano com muitas actividades”.
O “Inferno d’Azenha” foi escolhido como local da celebração porque “também era um espaço com o mesmo espírito que a associação P. Bernardo”.

“Ferreira da Silva era a figural central desta casa”

João Serra admitiu que não foi um frequentador assíduo, mas deslocou-se ao local várias vezes durante os verões de 1966 e 1967. Começou a ir ao Inferno d’Azenha pela mão do capitão Aventino Teixeira, que se aproximara do então jovem João Serra porque também estava interessado em ingressar no curso de Direito. O capitão matriculou-se como aluno voluntário e esperava de João Serra, que era aluno ordinário, alguma colaboração em apontamentos e notas relativas às matérias dadas nas aulas.
Foi no carro de Aventino Teixeira que João Serra fez as primeiras viagens à Quinta de Santo António, tendo então conhecido o proprietário do espaço, Luís Barreto, e também Ferreira da Silva.
O orador lembrou que naquela altura não se pagava entrada e que, à saída, cada um pagava o que bem entendia por aquilo que tivesse consumido.
“Era um local de conversa, onde as pessoas comiam qualquer coisa e depois à saída havia um enorme pote onde se metia a mão e deixava-se cair qualquer coisa”, contou.
No entanto, foi Ferreira da Silva quem mais o marcou na altura. “Ele era a figura central desta casa. Quando ele estava, tudo se reduzia ao que ele fazia”, referiu o historiador.
Na altura João Serra escrevia para a Gazeta das Caldas e começou a frequentar a Secla porque queria fazer uma reportagem sobre uma fábrica de cerâmica. Com este trabalho concorreu a um prémio do jornal Diário de Lisboa, o qual viria a vencer.
Foi então que conheceu o chamado “Curral”, o espaço oficinal onde Ferreira da Silva e outros artistas trabalhavam as suas criações na Secla (onde Luís Barreto era técnico).
João Serra começou assim a estabelecer uma relação com Ferreira da Silva, que já era muito amigo de Luiz Pacheco. O escritor tinha vindo para as Caldas da Rainha em Dezembro de 1964, onde escreveu uma das suas obras mais famosas – “A Comunidade”.
Em Julho de 1965, Luiz Pacheco publicou, no Jornal de Letras, uma entrevista a Ferreira da Silva. Em Outubro de 1976 editou um folheto intitulado “Maravilhas e Maravalhas Caldenses”, onde havia um texto denominado “O caso Ferreira da Silva”, no qual referia, entre outras, as esculturas expostas no Inferno d’Azenha.
“Pedro Bernardo é um farol”

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Outro dos palestrantes foi Pedro Ribeiro, que foi convidado principalmente pela sua grande ligação à associação, de cujos eventos se confessou ser grande fã.
Pedro Ribeiro salientou que quando Pedro Bernardo sai das Caldas para promover algum outro projecto fora da cidade “estas coisas deixam de acontecer”. Na sua opinião, “Pedro Bernardo é um farol, tal como foi Luís Barreto com o seu projecto Inferno d’Azenha”, disse.
Embora não tenha nascido nas Caldas, desde que veio para esta cidade Pedro Ribeiro tem contactado com uma série de espaços culturais e descobriu no Museu Bernardo algo de diferente. “Temos de perceber o privilégio que é existirem pessoas como estas na nossa cidade, as quais fazem acontecer coisas incríveis”, referiu.
O pintor Filipe Rocha da Silva agradeceu tudo o que a associação tem feito pela cultura e pelos artistas “a nível nacional”.
O artista referiu que esta era a prova de como a sociedade civil se pode organizar e promover iniciativas culturais sem estarem à espera que estas sejam promovidas por entidades oficiais.
Filipe Rocha da Silva elogiou ainda o espírito de abertura que a associação tem perante as novas gerações de artistas e à inovação. “É uma instituição extremamente progressiva em termos das novas estéticas”, afirmou.
Por outro lado, “apesar de ser uma associação apenas com voluntários, tem um grau de profissionalismo assinalável”.
Até 3 de Janeiro está patente no Museu Bernardo a exposição “Arte Pública”, com trabalhos de Horácio Borralho, João Fonte Santa, Martinho Costa e Rui Carreira. Na Casa Bernardo pode ser visitada, até 15 de Janeiro, uma mostra de desenhos de Vânia Madureira.

Pedro Antunes
pantunes@gazetadascaldas.pt

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