Zé Povinho leva a mão à testa e sente-a quente, mas continua com paladar e cheiro. Pensa duas vezes: telefono ou não para a linha 24? Antes disso vou medir a febre; e se bem o pensa melhor o faz. Não tinha febre: tinha estado sentado num banco da praça ao sol, a contar as pessoas que caminhavam pelo empedrado desenhado. E esta contagem deixa-o desiludido: passaram por ele sete pessoas, dois cães e algumas pombas. – “Isto está mau; as pessoas têm medo de sair de casa mesmo com máscara, para dar uma voltinha pela praça – quando é que isto acabará? O melhor é eu voltar para casa para fazer um confinamento com o desejo que o bicho maldito me passe ao lado!”
E se assim o pensa, melhor o faz.
Regressa a casa, acomoda umas almofadas na sua cadeira preferida, abastece-se de um vasto stock de papel higiénico, providencia uma caixa de frescas cervejinhas, junta o Almanaque Borda d’ Água – sabe-se lá se não terá um desejo de leitura? abastece-se de umas chouriças e umas fatias de pão – pois pode dar-lhe a fome -, não esquece o telefone, porque o seu amigo Silva pode querer falar com ele. E por fim, pega no comando da televisão pois está planeado a transmissão de um Sporting-Benfica.
Ia-se esquecendo, mas ainda bem que se lembra a tempo: pega nos seus chinelos feitos de pele de ovelha e calça-os. Assim equipado, acha-se totalmente preparado para enfrentar qualquer confinamento. Passa a mão pela testa e acredite quem quiser: está fria, fria…
Esta crónica é inspirada nesta peça de Fernando Miguel, autor de cerâmicas paródicas, de sarcasmo e riso.
Isabel Castanheira