Caixa Negra. Reflexão Sobre a Vida e a Morte da Cultura na Cidade

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O Caixa Negra entrevistou Ana Saramago no ano de 2016. Sendo ela uma cuidadora da nossa cidade, entendi por bem que na mesma entrevista sobre cultura, se pudesse falar de beleza e de virtude. Nesta crónica tal como Aristóteles entendeu, a virtude visa à beleza e para tal auxilio-me de uma cábula da antiguidade grega, para descrever o que eu entendo como alguém que exalta no próximo a beleza, mas que se socorre da sua virtude para que, através de um ato de transformação, o outro possa ser cuidado.

Dificilmente um homem entenderá porque razão as mulheres vão com tanta frequência ao cabeleireiro. Mas é essa necessidade do belo que tanto nos atrai, numa procura da eterna juventude, do eterno sentimento de nos sentirmos em pleno controlo, de o que está por dentro corresponder ao que está por fora.
A tradição enraizada de uma ideia de estética no ser humano, levada aos dias de hoje a conceitos quase ditatoriais, poderá ser uma prisão a que muitas pessoas se entregam numa procura do bem perfeito, no entanto, não é essa a vocação da Ana Saramago quando entrega o seu tempo ao bem-estar de alguém, nem tão pouco o conceito de moda pode ser dissociado da sociedade dos dias de hoje. A cultura da moda é também uma cultura de virtude, no sentido em que estar belo é estar bem, e estar bem é sinónimo de felicidade e de realização pessoal. O culto da beleza, associado a sinónimos de poder e de sucesso, é um atrativo que todos nós perseguimos aos dias de hoje, numa procura de que a nossa virtude corresponda à nossa beleza, o direito e o avesso num só, o estar bem para si e para o outro. Ana Saramago confessava na rádio emocionada, o quanto coloca de si no cuidado do outro, e o quanto recebe em troca, quando esse outro se revê numa transformação da sua própria estética. É uma catarse transformadora, um ato de revisitação de um momento feliz, o reviver de uma plenitude, e a concretização de uma mudança, que nascendo da virtude, se revela no belo criado, pelas mãos de uma cuidadora como a Ana.
A responsabilidade de elevar o belo no próximo, é a sua missão, e é através desta carga emocional, que a inspiração se revela num dom, capaz de fazer brotar uma flor, num terreno por vezes seco e gasto, que é o solo das nossas inquietações. A procura desta essência, que nasce do ambiente informal e profissional da sua equipa, é o catalisador de uma elevada procura de clientes, homens e mulheres que se identificam com esta liberdade criadora, e que procuram a certeza de uma transformação bem-sucedida, nas mãos de uma profissional, que alem de muito competente, consegue gerar esse resultado performativo de um novo eu estruturante.
Aristóteles assegurou há mais de 2000 anos atrás que a virtude visa a beleza, e se essa é a exigência que aos dias de hoje a sociedade pede de nós, é também a certeza de que só do sentimento do belo poderá ser plena a virtude.
O epitáfio poderá ser “Aqui entrou alguém que se deixou cuidar para ser belo” e se é essa a missão que cada um de nós vive intensamente para com o outro, a arte de ser cuidadora é aqui exaltada ao limite como se de uma nova pele se tratasse, na “morte” de quem se deixou levar e um novo eu possa nascer para cada um de nós que tenta ser virtuoso e assim se vê belo.
A Ana Saramago pode ser encontrada na Rua da Cutileira nº 3 em Caldas da Rainha.

CAIXA NEGRA. REFLEXÃO SOBRE A VIDA E A MORTE DA CULTURA NA CIDADE - Gazeta das Caldas
ANA SARAMAGO – A virtude visa à beleza.

Mariana Calaça Baptista
info@marianacalacabaptista.pt