Manuel Carvalho da Silva, ex-líder da CGTP, foi convidado pela Direcção Regional do Oeste do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa, para falar sobre “O trabalho – A solidariedade intergeracional – O tempo da Reforma”. Este defendeu que é preciso repensar a questão dos direitos e deveres no trabalho e alertou para o facto da instabilidade nos empregos ser cada vez mais aceite como normal. O mesmo acontece com as medidas tomadas em regime de excepção pelos Governos, que não devem passar a normas com o avançar do tempo.
Onde é que vivemos? “Em Estados cada vez mais governados por delinquentes, no sentido de corruptos”. Foi com esta frase provocadora que Carvalho da Silva – que agora é investigador do ISCTE – deu início à sua intervenção, numa reflexão sobre a situação actual dos Estados Unidos, um país que agora é governado “por um indivíduo cujos comportamentos seriam condenáveis com pena de prisão se este não fosse um cidadão rico, mas sim pobre”. Passando para uma visão mais global, o ex-sindicalista afirmou que actualmente o principal drama é que o roubo acontece numa dimensão legal: “são as próprias leis que permitem que alguns se apropriem indevidamente daquilo que é de todos”.
Outra questão que preocupa Carvalho da Silva é a relação entre os direitos e os deveres. Referindo-se em particular aos professores, o convidado reconhece que nos últimos anos estes profissionais viram ser-lhes cortados direitos fundamentais com a justificação (não fundamentada) de que eram regalias. Este tipo de medidas provoca a desresponsabilização dos mesmos relativamente aos seus deveres e tem impacto no futuro da profissão. “Se às novas gerações de professores lhes amputam determinados direitos, estas não assumem deveres que até podiam não estar plasmados na lei, mas estavam adquiridos pelas práticas”, referiu.
A “normalidade” da insegurança
A instabilidade e a precariedade são dois factores que actualmente também definem o trabalho. Na opinião de Carvalho da Silva, criou-se uma ideia, com base na tese da “sociedade de risco”, que as inseguranças diárias do indivíduo, incluindo no seu trabalho, devem ser encaradas com normalidade. “Mas isso não é verdade porque aquilo que tem de ser feito é tratar estas instabilidades na sua origem e não aceitar que os trabalhadores é que devem ser flexíveis e tolerantes”, disse.
Esta ideia de “normalização” também deve ser combatida relativamente às medidas que foram adoptadas pelos governos como provisórias, em regime de excepção. Sobre este tema, o ex-sindicalista deu o exemplo das reformas: “actualmente parece que só se discutem as reformas mínimas. Não é que estas não sejam importantes claro, mas então e a preocupação com a evolução e actualização das pensões médias, já não existe?”.
Tecnologia
Quanto à tecnologia, outro aspecto que marca o trabalho, Carvalho da Silva considera que existe um determinismo negativista – “diz-se muito que as novas tecnologias destroem emprego” – que não é correcto. “O que se alteram são os perfis de competências e qualificações, surgem novos desafios e exigências, mas não se perdem profissionais”, reforçou.
QUAL O FUTURO DO TRABALHO?
Sobre o futuro do trabalho, Carvalho da Silva diz que assenta em três eixos: menos sofrimento, mais realização e mais liberdade criativa. Sobretudo, deve-se lutar por um trabalho que conduza à felicidade. Para isso, é necessário investir no “não trabalho”. “Não falo apenas do lazer, mas principalmente do tempo para formação, cultura, participação cívica e ação política”, explicou o convidado.
Dirigindo-se aos reformados, Carvalho da Silva alertou que a maior conquista da humanidade no último século foi o aumento da esperança média de vida. “Mas se vamos ter a geração mais numerosa de sempre acima dos 65 anos, há que esquecer as artroses. Os mais velhos também têm que se mexer, até para ajudar os mais jovens”, concluiu.
“Memórias – Os sonhos continuam. Os direitos não se extinguem”
No âmbito da conferência, foi inaugurada uma exposição promovida pelo Departamento de Professores e Educadores Aposentados do SPGL. Esta compila em imagens as principais áreas de intervenção deste núcleo, incluindo as acções reivindicativas e socio-culturais que desenvolveu no último ano.
Actualmente, os eixos prioritários deste departamento são as condições de aposentação (só podem reformar-se profissionais com 40 anos de serviço e 66 anos), os horários de trabalho dos professores, a valorização do salário, a gestão democrática das escolas e o rejuvenescimento do corpo docente (43% dos professores têm mais de 50 anos).