A ACCCRO – Associação Empresarial das Caldas da Rainha e do Oeste está a comemorar este ano o seu 115º aniversário e vai assinalar a data com a Gala Empresarial este sábado, 25 de Novembro.
Ultrapassado um período de dificuldades devido a um passivo acumulado durante 15 anos superior a 120 mil euros, a associação vive hoje uma fase de dinamismo, que se revela nos eventos que produz, como o de Natal, e no apoio que dá às empresas ao nível da formação, dos programas de investimento e de comunicação e imagem.
Paulo Agostinho, presidente da associação, diz que o sector do comércio e serviços caldense é forte e isso permite-lhe resistir às dificuldades vividas em cidades vizinhas, como Leiria ou Torres Vedras, mas adverte que a recuperação do termalismo é fundamental para que esta dinâmica se mantenha no futuro.
GAZETA DAS CALDAS: Quantos associados tem a ACCCRO, quanto valem em volume de negócios e em número de postos de trabalho?
PAULO AGOSTINHO: A ACCCRO tem actualmente cerca de 720 sócios efectivos, com as quotas em dia ao final do mês passado.
O volume de negócios dos associados é uma informação de que não dispomos. Mas podemos dizer que 96% dos associados são micro-empresas no sector do comércio e serviços, que é o mais importante no concelho. Esse tipo de empresas tem um volume de facturação até 300 mil euros, o que dá para ter uma ideia.
Quanto aos postos de trabalho também não conseguimos quantificar o total porque a ACCCRO tem associados numa área vasta, até Pataias, Porto de Mós, Benedita, mas nas Caldas são superiores aos 3000. É o sector com mais empregabilidade.
Nas Caldas não há grande indústria. Quase todas as empresas de maior dimensão são nossas associadas, como a Thomaz dos Santos, a Auto Júlio, a A. Marques, a Transwhite, ou a Fábrica Bordallo Pinheiro, mas não há muitas mais. O concelho não conseguiu captar grandes empresas a nível nacional.
GC: Como são definidas as quotas das empresas associadas?
PA: O valor é definido em função, primeiro, do número de associados e, depois, do escalão do volume de facturação. A nossa quota mais alta são 24 euros, temos algumas com esse valor, mas a maioria paga a quota mais baixa, que são 8 euros.
“DESDE 1998 A ACCCRO TEVE SEMPRE PASSIVO”
GC: Como tem sido a evolução das contas da associação?
PA: Quando chegámos à ACCCRO, em Setembro de 2013, existia um problema financeiro e de tesouraria porque tinha um passivo superior a 120 mil euros, que era decorrente de má gestão ao longo dos anos. Desde 1998 a ACCCRO teve sempre passivo. Não se podem produzir eventos se não os controlarmos financeiramente, nem investir se não tivermos capacidade para pagar esse financiamento, mas era isso que estava a acontecer.
Conseguimos fazer uma recuperação importante e em 2016 apresentámos passivo zero e em 2017 continuará assim. Controlámos de forma rigorosa as receitas e as despesas operacionais. Depois houve uma recuperação de sócios com quotas em dia como nunca sucedeu. Essa receita certa mensal permitiu-nos negociar planos de pagamento.
E depois os projectos que fizemos não vieram aumentar o passivo, pelo contrário. Tudo o que a associação faz é sustentado – se não tivermos capacidade para pagar, não fazemos. Pagámos dívidas desde 2003.
As dívidas a terceiros condicionavam o que queríamos fazer, mas neste momento não temos esse problema. Foi um esforço significativo e a credibilidade que a associação tem hoje perante os parceiros, e que não tinha antes, é um dos trabalhos mais importantes que fizemos neste mandato.
Por exemplo, o evento do Natal começou em 2013 com sete parceiros, este ano temos mais de 150 entidades a trabalhar connosco.
GC: Que tipo de apoios é que a ACCCRO disponibiliza às empresas associadas?
PA: A maioria dos associados são micro-empresas, que pela sua dimensão precisam de apoios muito simples, como a formação. A ACCCRO começou em Setembro o seu plano de formação, a que as empresas estão obrigas por lei. Temos acções esgotadas e com listas de espera. É um serviço em que os associados se apoiam muito. Mas temos outros, como apoio jurídico, de marketing e comunicação.
Muitas entidades também aderiram ao Comércio Investe. Somos um dos 21 promotores a nível nacional, que é um programa de investimento para a modernização de equipamentos, imagem e marketing. As empresas com grande dimensão têm gabinetes para estas coisas, as pequenas não, por isso este trabalho é fundamental para essas.
Temos cinco pessoas (para a área administrativa, design gráfico e desenvolvimento de programas de investimento e formação) que são a equipa de recursos humanos com mais competências que a ACCCRO tem desde que há registo. Cada vez as empresas nos pedem mais apoio porque vêem trabalho feito e que este é válido e importante.
“NAS CALDAS OS EMPRESÁRIOS CONSEGUIRAM ADAPTAR-SE”
GC: Os últimos anos foram de grande dificuldade para a economia do país. Como foram para o sector do comércio e dos serviços?
PA: Há 25 anos a forma mais habitual de consumo era no espaço físico, mas nos últimos anos isto foi completamente alterado, com a chegada da Internet e dos aparelhos móveis. Hoje qualquer pessoa pode comprar o que quiser, onde e quando quiser. Muitas empresas nem sequer têm um espaço físico.
O mercado é resultado da oferta e a concorrência deixou de estar na mesma rua, ou na mesma cidade. A concorrência hoje é global. Isso teve um resultado negativo nas empresas que não tiveram capacidade para evoluir. Em muitas cidades os centros foram esvaziados do seu comércio, como são os exemplos de Torres Vedras, Santarém e Leiria.
Nas Caldas da Rainha, felizmente, os empresários tiveram capacidade para se adaptar. A cidade mantém-se viva e não há muitos espaços por arrendar. A autarquia e a ACCCRO também têm realizado eventos de âmbito nacional que têm trazido muitos visitantes e consumidores, o que tem ajudado o tecido empresarial. O evento de Natal tem esse objectivo.
GC: Que impacto teve no comércio o encerramento das termas, e mesmo antes disso a sua decadência, e que impacto pode ter também a sua reabertura?
PA: A génese da cidade são as termas. À volta da estrutura termal mandada fundar pela Rainha D. Leonor a cidade desenvolveu-se económica e socialmente. Foi das cidades mais importantes há algumas décadas atrás. Tinha um casino e o triplo dos hotéis que tem hoje porque era um destino de excelência da corte e das famílias abastadas devido ao Hospital Termal.
Havia em média 10 mil pessoas por ano que vinham para as termas e essas pessoas procuravam o comércio e serviços, que tiveram um grande desenvolvimento.
O concelho tem capacidade de oferta de comércio e serviços para o triplo da população residente: 150 mil pessoas. E isso tem por base ser uma cidade termal.
O declínio das termas nos últimos 20 anos teve uma influência negativa no tecido empresarial e observou-se uma fase de dificuldades, com muitas lojas a fechar.
O turismo termal é hoje uma área em que muitas entidades investem por todo o mundo e vai ser fundamental para que a cidade mantenha a mesma vitalidade, ou não.
O turismo termal tem que ser uma realidade e no curto prazo. Não podemos estar à espera que se decida se o modelo é de serviço público ou privado. É importante que todos decidam de forma rápida onde e como investir porque o turismo termal é fundamental para o desenvolvimento do tecido empresarial da cidade. A população do concelho não mantém o comércio que temos, é preciso uma oferta que traga mais pessoas.
GC: Há muitas empresas antigas e também vai havendo renovação. A taxa de insucesso dessas novas empresas nas Caldas está dentro do normal a nível nacional?
PA: Todos os anos homenageamos na Gala Empresarial cinco empresas, que têm todas elas à volta de 50 anos de existência. Isto reflecte esta capacidade do tecido empresarial, fruto da competência dos empresários. Há muitas empresas novas e isso é saudável porque é preciso haver renovação, é preciso haver investimento em novas áreas de negócio e complementar a oferta que temos. Mesmo na Praça da Fruta isso acontece.
Algumas não conseguem sobreviver mas isso faz parte do ciclo e nas Caldas não é diferente. A taxa de insucesso está dentro do normal.
Parabéns Associação Comercial – Uma prenda de anos.

Nos primeiros anos do novo século (XX) a vila das Caldas da Rainha era uma terra em constante mutação. Servida por linha férrea, o meio de transporte dos novos tempos, permitia a vinda rápida e cómoda de todos aqueles que para cá vinham em busca da cura dos males do corpo e da alma. Nas Caldas encontrava-se periodicamente a nata da sociedade e muitos dos visitantes dedicavam um dia da sua estada numa visita à Fábrica de Faianças de Caldas da Rainha, a fábrica de Bordalo, de quem toda a gente ouvia falar, pelo exotismo das peças de cerâmica que produzia.
Rafael Bordalo Pinheiro ocupava um lugar de peso na sociedade caldense. Responsável pela mais importante fábrica de cerâmica, homem moderno e de ideias arejadas, a sua opinião era respeitada por todos, e conversar e ser visto na sua companhia era sem dúvida prestigiante. Ninguém perdia a oportunidade de trocar com ele um cumprimento ou meia dúzia de palavras sobre as últimas novidades da terra.
Os mais diversificados tipos de comércio situavam-se em redor da Praça e ruas confluentes. Um comércio diversificado emoldurava a praça, o centro palpitante da vila, lugar onde tudo se tratava e onde todos se encontravam. Um grupo desses homens empreendedores e cientes da necessidade de unirem os seus esforços em defesa do bem comum, resolveu criar uma Associação, a que chamaram Associação Comercial e Industrial das Caldas da Rainha.

E qual foi a personagem a quem todos, ou quase todos, confiaram e que escolherem para o lugar mais prestigiante da projetada associação? Esse mesmo, Rafael Bordalo Pinheiro.
Reunida uma Comissão Instaladora resolveu esta, por unanimidade, convidar o artista-oleiro para ocupar o lugar de Presidente da Assembleia Geral da Associação. E com a data de 28 de Novembro de 1902, endereçaram-lhe a seguinte carta:
“Illº. e Exmº. Snr.
Tenho a honra de participar a V. Ex.ª que em sessão d’assembleia geral de 27 de Novembro, convocada para eleger os corpos gerentes que hão de funcionar durante o próximo ano, foi V. E.ª eleito por unanimidade de votos para Presidente d’Assembleia Geral, ficando d’esde logo investido na pose do referido cargo para que tão merecidamente foi eleito, o que comunico a V. Exª. para os devidos feitos, servindo-lhe o presente ofício de diploma.
Deus Guarde a V. Ex.ª
Illmº. e Exmº. Snr. Rafael Bordalo Pinheiro
Digmº. Presidente d’Assembleia Geral da Associação Comercial e Industrial das Caldas da Rainha
Caldas da Rainha, Secretaria da A. C. e I. aos 28 de Novembro de 1902
O Presidente da Comissão
Francisco António Pereira”
Rafael Bordalo Pinheiro aceitou o lugar. A Associação Comercial, um projeto que já conta 115 anos foi ao longo de todos estes anos uma pedra fundamental no desenvolvimento da cidade e continua nos dias de hoje a ser um parceiro imprescindível no progresso e modernidade.

A carta convite pela primeira vez aqui transcrita, por especial deferência do Museu Rafael Bordalo Pinheiro, a quem endereço os meus mais sinceros agradecimentos, é uma homenagem a todos os homens e às poucas mulheres que ao longo de todos estes anos, deram o melhor de si, em trabalho voluntário numa Associação que constituí um eixo fundamental do desenvolvimento das Caldas da Rainha. Parabéns Associação Comercial.
Isabel Castanheira
As origens da ACCCRO e o seu papel no desenvolvimento das Caldas
A ACCCRO foi fundada a 12 de Outubro de 1902 por um grupo de 45 sócios. Mas a sua génese é um pouco anterior. Com recurso a uma pesquisa sobre a história da associação realizada por Paula Cândido, Gazeta das Caldas conta-lhe o que esteve na sua origem e também a influência que teve na dinamização e no crescimento da própria cidade.
Já desde meados da última década do século XIX se percebia em vários artigos de jornal, como O Círculo das Caldas e O Futuro, a necessidade de os comerciantes e industriais da cidade se unirem numa associação, como estavam a surgir outras pelo país, para dinamizar o comércio e a própria cidade.
Vivia-se nessa altura um período em que o termalismo caldense perdia fulgor e era necessário intervir para colmatar a falta de movimento no comércio.
Desde a sua fundação, verificou-se um papel interventivo junto do poder local e central para que se dinamizasse a cidade. Uma das primeiras acções de relevo foi a intervenção directa que a então denominada Associação Comercial e Industrial das Caldas da Rainha teve para que a instalação do Regimento de Infantaria 5 nas Caldas. O interesse era sobretudo a banda que lhe estava associada e que era uma das responsáveis pela animação do Parque durante o Verão.
A dinamização sócio-cultural da cidade era fundamental para que o comércio pudesse prosperar e a associação fazia-o através da organização, realização e promoção de numerosos eventos. Foi responsável por concursos hípicos, eventos desportivos, encontros populares com ranchos, espetáculos no Teatro Pinheiro Chagas, bailes no Casino, sessões de cinema no Salão Ibéria, concertos musicais, touradas, entre outros.

O desenvolvimento das próprias Caldas da Rainha passavam muito pela acção dos seus comerciantes e da pressão que estes faziam para o melhoramento das infraestruturas. A estrada para Santa Catarina foi uma luta assumida também desde cedo, mas não foi a única. A ACICR teve influência na chegada às Caldas de serviços como os correios e a rede telefónica, no incremento da actividade bancária, na criação do Museu José Malhoa e também na própria elevação das Caldas a cidade, em 1927.

A formação direccionada para o sector foi também sempre tida como fundamental e, tanto nesta fase inicial como mais tarde já como Grémio do Comércio das Caldas da Rainha (denominação utilizada entre 1940 e 1974), o funcionamento da Escola Comercial e Industrial de Rafael Bordalo Pinheiro mereceu-lhe especial atenção, com diversas intervenções ao nível das estruturas.
Durante a II Guerra Mundial, a agremiação de comerciantes teve também um papel social, por exemplo através da distribuição de senhas de racionamento do pão.
À medida que as carências ao nível dos serviços públicos foram sendo colmatadas a influência a nível “político” da associação foi diminuindo, mas esta manteve sempre a sua participação na vida social da cidade, através da organização de eventos e na promoção turística.
J.R.