
Uma casa de férias transformada em alojamento local, uma pensão que deu lugar a um hotel, uma padaria de Peniche que abriu duas pastelarias nas Caldas, uma imobiliária que trabalha o turismo residencial, uma empresa tecnológica que desenvolve sites e trabalha em marketing digital, e outra que está a desenvolver um projecto para abrir portas através de um smartphone. Estes foram os projectos de empreendedorismo apresentados aos alunos da Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste, a 13 de Janeiro, nas terceiras Jornadas do Empreendedorismo.
Não crescer demasiado para não perder a identidade, mas não perder a ambição de querer mais, foi um dos conselhos dados pelos empresários que, no dia 13 de Janeiro, conversaram com os alunos da Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste.
A dificuldade de encontrar recursos humanos especializados foi também uma ideia comum aos dois painéis que apresentaram diferentes ideias de negócios, realçando boas prácticas.
A Casa da Lagoa é uma aposta de Sofia Cardoso, que não tinha qualquer tipo de formação na área hoteleira. Antes de abrir o seu negócio, esta professora de Matemática que tinha tido uma carreira artística, foi gestora do portal Casa Sapo e trabalhou na Várzea da Rainha.
Em 2014 fez obras na sua casa de férias em frente à Lagoa de Óbidos – que só era usada dois meses por ano – e transformou-a num alojamento local. Colocou-a no Booking e dois dias depois recebeu a primeira reserva.
“De algo que dava despesa e se deteriorava, criei uma forma de a sustentar e uma fonte de rendimento”, contou. Actualmente e durante a época alta, com menos horas de trabalho do que quando trabalhava por conta de outrém, consegue receber o mesmo dinheiro.
“Não é difícil criar um alojamento local, mas o conceito tem de ser pensado e a localização é muito importante”, disse a agora empresária.
Sofia Cardoso não concorda com a polémica da possível concorrência dos alojamentos locais aos hotéis. “São conceitos diferentes, para públicos diferentes, com necessidades diferentes”, defendeu, notando que os custos de operação nos alojamentos locais são mais baixos, porque não oferecem os mesmos serviços que um hotel.
Neste caso, além do alojamento, a proprietária oferece um cabaz de boas-vindas com produtos da região (vinho, doce caseiro, fruta da Praça, queijo, tostas e água). “Quando os clientes chegam de uma viagem extenuante, não temos serviços, portanto temos de garantir que no momento em que se instalam, não têm de sair para comprar comida”, explicou. Além disso, na Casa da Lagoa, existem os temperos básicos e os produtos de limpeza.
A vista para a lagoa e os serviços do condomínio (piscina, court de ténis e jardim), bem como a localização (perto da praia e da escola de vela) são as mais-valias que Sofia Cardoso nota no seu estabelecimento.
A empresária, que actualmente está a preparar a abertura de uma unidade semelhante na ilha do Baleal, queixou-se da falta de seguros adequados a esta actividade e da falta de recursos humanos.
Pão de algas e pão do mar
Luís Calé, do grupo de pastelarias Calé, explicou que este negócio começou com o seu pai, em 1980 e que daí para cá já teve outras denominações, sempre com o mesmo objecto social.
“Quando abracei o projecto, nos finais dos anos 90, vivia-se uma altura de consumo em massa e não havia grandes superfícies dentro das cidades”, contou. Até 2008 manteve a panificação, mas depois estendeu a actividade à pastelaria e abriu mais espaços comerciais em Peniche.
Este grupo fornece escolas, o município de Peniche, mercearias, pastelarias e hotéis também em Óbidos, Lisboa e Algarve. Tem também duas pastelarias nas Caldas – as ComTradição. “Vimos as Caldas como um excelente sítio para investir, mas foi quando a economia deu a volta para baixo”, explicou Luís Calé, acrescentando que foram obrigados a fazer uma reestruturação ao plano de retorno do investimento.
“Nos últimos anos temos sentido uma forte saída de pessoas de Peniche, muita gente emigrou até porque a pesca não está a dar e se a pesca não funciona, tudo se ressente”. O empresário afirmou que costumam trabalhar com barcos de viagem e “se antes eram 80 barcos, hoje são 20”.
Luís Calé achou que crescer para trabalhar em massa talvez não fosse o caminho porque corria o risco de perder o controlo da situação. Então procurou marcar pela diferença. Decidiu desenvolver o pão de algas e, mais recentemente, o pão do mar, que é feito com farinha de bivalves e não leva sal.
Actualmente o grupo atravessa uma fase de reestruturação em que pretende apostar nas novas tecnologias e na certificação dos produtos.
“Onde tenho sentido maiores dificuldades é nos recursos humanos pois não consigo ter ninguém especializado nem ao balcão, nem na padaria e pastelaria, e não é porque pago mal, porque não me importo de pagar mais”, afirmou.
Um sargento que apostou na web
Ruben Bettencourt, da Pixelsbrand, que se dedica às áreas de marketing digital, desenvolvimento de websites e branding, alertou para a importância de uma imagem profissional.
Este jovem, que deixou de ser sargento do Exército para abrir a sua empresa, está a iniciar um projecto com Rui da Bernarda, da Mercearia Pena, no qual pretendem torrar café de vários países em Portugal. Awaked Coffee será o nome do projecto que prevê a entrega do café à porta do cliente.
O também mentor do TedX nas Caldas (que contou com a parceria da EHTO), afirmou que para uma empresa estar presente no on-line, tem de o fazer de forma profissional, porque caso contrário arrisca-se a perder clientes. Depois é preciso fazer as pessoas irem ter ao site, facilitando-lhes o caminho e, por fim, o produto tem de ter qualidade.
A empresa não tem dívidas, nem empréstimos para pagar. “Trabalhamos com o dinheiro em caixa”, esclareceu.
Ruben Bettencourt salientou a dificuldade em encontrar mão de obra qualificada para a sua empresa nesta região, uma realidade que a ESAD não consegue alterar. “Os alunos da ESAD são, na sua maioria, de fora das Caldas, e quando acabam a universidade querem ir para os grandes centros ou voltar à sua cidade”, afirmou.
Abrir portas através de um smartphone
Leonardo Lino, da Porter, é um engenheiro informático que está a desenvolver um projecto que permite aos utilizadores abrir portas através do smartphone.
Explicou todos os passos para criar uma startup e esclareceu que este tipo de negócios tem tudo a ver com o trabalho em equipa.
Refutou a tradicional ideia de ‘tenho uma ideia espectacular, não posso dizer nada a ninguém’. “É completamente errado, ninguém quer saber da vossa ideia, existem milhares de startups por esse mundo fora com ideias parecidas e ideias não chegam, o que conta é a execução”.
Aconselhou os jovens a tentarem primeiro atingir a estabilidade financeira com um emprego, para depois tentarem apostar na sua ideia de negócio e a contratar pessoas melhor que os próprios fundadores.
Notando que em troca de investimento, muitas das vezes cedem-se percentagens das empresas, realçou que “a partir do momento em que percam 60% do controlo da empresa, ninguém irá investir em vocês”.
De pensão a hotel
Artur Domingos e o genro Henrique Correia apresentaram o Água D’Alma, um hotel que nasceu da antiga Pensão Nazaré, que se tornou residencial e, mais tarde, em hotel Penedo Furado, na Foz do Arelho.
No último ano recebeu um investimento de 500 mil euros que permitiu mudar todo o edifício e criar uma marca de raiz, apostando na tecnologia como facilitador do negócio.
Um dos passos mais morosos foi a verificação da internet em busca de informações relativas ao antigo hotel, para depois actualizar tudo. “Era mais fácil ter criado páginas novas, mas ia perder-se o histórico”, fez notar Henrique Correia.
Conforme explicou, e tendo em conta que o Água d’Alma não faz parte de uma cadeia hoteleira, os meios de distribuição “são essenciais para o negócio”. Por exemplo, “o Booking representa 70% das nossas reservas”.
O empresário Artur Domingos, que estudou seis meses na EHTO, salientou que foi durante esse tempo que lhe foi sugerido o Facebook. “Esta é a importância dos contactos entre a escola e as empresas”, afirmou o proprietário.
Vender uma casa por dia
Luís Sacadura, da Casas de Prata, apresentou a sua imobiliária como “a mais pequena – em espaço físico e pessoas – das Caldas e talvez a que mais factura pois vendemos uma casa por dia”.
Esta empresa entrou no mercado em 2008, na altura da bolha imobiliária. Actualmente gasta em divulgação uma média de 8.000 euros mensais e praticamente todos os seus clientes são estrangeiros.
“Vale mais ter crédito do que ter dinheiro, mas para isso é preciso ter atitude”, afirmou, destacando a importância de criar uma marca e de que esta se faz 24 horas por dia.
O empresário defendeu também que o rigor da hotelaria é extremamente útil para qualquer área da vida e alertou os alunos que “por cada cliente que tratamos mal, cinco pessoas vão saber” e que, por oposição, “cada um que tratarmos bem, pode tornar-se no primeiro vendedor da nossa marca”.
No início das jornadas, Daniel Pinto, director da EHTO, disse que este encontro tenta promover uma cultura de inovação e empreendedorismo. “Estas jornadas têm como principal objectivo transmitir aos alunos uma atitude de fazer acontecer”, afirmou.
Já Célia Antunes, professora da disciplina de Empreendedorismo, realçou que neste fórum, acima de falar de negócios se falou de pessoas.
