Trabalho e inclusão

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Desde que iniciámos estas crónicas, em Março de 2015, já tivemos algum retorno dos leitores, na maior parte das vezes de apreço e de viva voz. Também nos chegaram alguns comentários por email e por mensagem privada no facebook, normalmente depois da partilha através do site da Gazeta das Caldas.

Comentários e mensagens simpáticas, calorosas, que funcionam como um incentivo à contínua reflexão sobre a cidade, o concelho, a região, e o país ou o mundo. Sendo certo que, num jornal local, o leitor mais se interessa pela leitura da sua terra, não é menos verdade que hoje vivemos na tal aldeia global, sintetizada pela metáfora do bater de asas de uma borboleta na Amazónia que provoca uma tempestade no Extremo Oriente.
Vem esta introdução a propósito de um desses contactos de um leitor que até agora não consegui dar resposta. Diria para já, em minha própria defesa, que esta resposta é uma resposta que muitos procuram, alguns já há décadas a esta parte.  Nessa já razoavelmente distante crónica, de finais de 2015, reflectia-se brevemente sobre as actuais característica dos campos políticos da esquerda e da direita, no contexto do que era então um novo governo, saído na maioria parlamentar que resultou das últimas eleições legislativas. No email recebido desse leitor vinha um desafio, muito interessante, por sinal: convocava-me então esse caldense a levar mais longe a minha reflexão sobre a esquerda moderna, de que se tinham dados alguns sinais na crónica anterior. Confesso que o repto para além de interessante também se revelou algo assustador. E no imediato fui incapaz de lhe corresponder. Tal caderno de encargos não está, provavelmente, ao alcance deste modesto e irregular cronista. Ainda que goste de pensar sobre o tema, o vagar nem sempre abunda, antes pelo contrário, e outros afazeres prioritários impõem-se muitas vezes por via das obrigações profissionais.
Mas a agradável provocação era de tal modo generosa que até trazia em anexo algumas pistas de reflexão. E vinda de um companheiro de tertúlias, de longa data, que admiro e respeito, deixou sempre a vontade de voltar a este tema. Não será certamente assunto para se esgotar numa crónica pelo que antecipadamente solicito, penhoradamente, a paciência dos nossos leitores.
Assim, talvez fosse útil, nos tempos que correm, fazer essa reflexão sobre a actualidade de um projecto socialista começando pela sempre actual problemática do trabalho. Ou seja, na delicada relação “trabalho x capital”, identificada por Marx há mais de 150 anos, depois de muitas conquistas sociais desde finais do séc. XIX e até aos anos 70 do séc. XX, o capital tem vindo sempre a recuperar influência. De tal modo que as remunerações de ambos os lados revelam uma assimetria assustadora nos últimos 40 anos. Ou seja, enquanto a remuneração do trabalho cresceu globalmente cerca de 1%, o capital viu o seu retorno aumentado na casa das centenas, entre 300% a 400% conforme os autores e fontes consultadas. Vê-se bem por aqui quem está a perder ou a ganhar a luta de classes, para voltar a um conceito marxista.
As sociedades ocidentais lideram um processo de transformação em que todo o planeta depende mais do consumo do que da produção. O emprego continua a ser um bem social que deve ser repartido. Só reduzindo os horários, ele chegará a todos. Mais actividades ligadas aos sectores sociais e culturais devem ter acesso a remuneração, não pela importância produtiva mas pela relevância social e cívica. A forma como as sociedades retribuem no futuro a cidadania activa pode ser determinante para a inclusão e sustentabilidade das democracias no planeta do consumo.

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