A máquina camarária

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O desempenho autárquico depende, em grande medida, da forma como a estrutura da Câmara está pensada e implementada. A estrutura deve estar alinhada com a estratégia definida para cada mandato autárquico – as indispensáveis políticas municipais – dentro de uma visão e orientação prospectiva que se quer definida para o médio e longo prazos. Muitas das justas críticas que são feitas ao mau desempenho dos autarcas estão relacionadas, ou com a falta dessa estratégia ou com a má estruturação dos serviços que têm por missão concretizá-la, permitindo situações de paralisação, ineficiência e esbanjamento de recursos do Estado. As responsabilidades maiores recaem, obviamente, sobre os autarcas eleitos, pois são estes que aprovam, põem a funcionar e controlam a máquina camarária.
A estrutura da autarquia caldense não é a que melhor serve o município. O deputado independente Emanuel Pontes (MVC) afirmou nesta Assembleia Municipal que “não via qualquer adaptação da estrutura orgânica do município aos novos desafios que a sociedade actual obriga, verificando que o município não se adaptou nem à era da informação, nem à era do conhecimento”, tendo sido recusadas as suas propostas de melhoria. Também o vereador socialista Rui Correia manifestou em reunião de Câmara “a sua discordância em relação à aprovação do novo organograma, em virtude de se tratar de uma revisão que obedece exclusivamente a critérios de arrumação administrativa”, acrescentando que “à semelhança do anterior, nem chega mesmo a representar o trabalho que verdadeiramente se realiza nos serviços da Câmara”.
A lei n.º 49/2012 impôs alterações às estruturas camarárias, mas teve em vista apenas a redução da despesa pública no âmbito do programa da Troika, ignorando outros objectivos absolutamente essenciais relacionados com a estratégia e o desempenho organizacional. Estas alterações foram classificadas por Rui Rio, ex-presidente da Câmara Municipal do Porto, como “tecnicamente imaturas e de sensatez duvidosa”, produzindo até efeitos contrários aos pretendidos e àqueles que a autarquia tinha obtido na década anterior, em que os postos dirigentes foram reduzidos em cerca de 34 por cento. Também o Regime da Organização dos Serviços das Autarquias Locais (DL 305/2009) não define, na minha opinião, as directrizes apropriadas para uma correcta estruturação das autarquias, permitindo a existência de organogramas verdadeiramente disparatados e inconsequentes.
O conjunto de actividades e funções da autarquia deve reflectir uma adequada divisão e cooperação do trabalho, e formar uma estrutura que seja eficiente e eficaz na concretização dos planos anuais e plurianuais. Também os regulamentos (internos e externos), bem como as auditorias que verificam genuinamente o seu cumprimento, desempenham um papel estrutural fundamental, pelo que devem manter-se plenamente actualizados e funcionais, respeitando-se prazos e outros preceitos. Um organograma disfuncional gera contradições e ambiguidades, falta de coordenação e de partilha, burocracia, atrasos, stress e conflitos. Não devem existir lacunas nem sobreposições e os recursos devem ser bem combinados e plenamente aproveitados e valorizados, a começar pelos humanos. Os funcionários devem ser devidamente valorizados e aproveitados, não se compreendendo que uma autarquia contrate serviços externos quando eles estão disponíveis internamente com a mesma qualidade, ou que permaneçam dúvidas sobre o rigor e a imparcialidade dos critérios de recrutamento, selecção e avaliação.

José Rafael Nascimento
jn.correio@gmail.com

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