Chegou o frio.
E dei comigo a pensar se o velho dito que encima este escrito, será uma realidade em desuso, não por estar errado, tão só por ser velho!
Velho é, hoje, sinónimo de empecilho, obstáculo à dinâmica voraz das novas realidades, à velocidade ultrassónica que ofusca as “mentes modernas”.
Será o sinal dos tempos?
Mesmo que, em termos europeus, os anciãos, pelo seu saber de experiência feito, tenham sido a reserva da sociedade então mais avançada e justa, como era o caso na Grécia…
E, nessa lógica, subsistem em termos políticos, os senados como reserva do conhecimento e da ponderação que “tutela” a sociedade.
Com os “modernismos” que nos estonteiam, muitos velhos são amontoados em “lares”, deixados nos hospitais, se alguns mais novos vão de férias, de verão, de Natal; enfim…
Deu-me esta diatribe, por causa de uma prática alimentar muito esquecida, e porque o Natal está à porta: a dos aproveitamentos!
Hoje quase nada se aproveita: nem sei se ainda se aproveitam as sobras do bacalhau da consoada tradicional para preparar “a roupa velha”!
Deixamo-nos trucidar pela catadupa de “ofertas imperdíveis e imprescindíveis” com que a publicidade nos martela e acabamos, em média – a estatística é uma “ciência” muito pouco compreendida – e por exemplo, com dois ou três telemóveis em uso e outros tantos “abandonados” nas gavetas, expressão máxima do consumismo desenfreado para que nos virámos com o “despejar” dos fundos europeus…
Voltemos às papas: a grande maioria dos portugueses – por a isso obrigados – começou a vida a “poupar” e pela comida!
A frase “uma sardinha para três” é um infeliz, mas verdadeiro ex libris, até aos anos sessenta do século passado.
Para aquilatarmos da distância temporal que separa o consumo hodierno dos hamburger – seja qual for a marca preferida – da alimentação de subsistência dos habitantes do interior do país real da nossa meninice, recupero o “historial” do arroz de substância.
De manhã começava-se ou por acender a lareira de chão, na cozinha, ou por espevitar as brasas, se o lume subsistiu ao decurso da noite, acrescentando mais lenha.
As trempes, várias, com as suas panelas de ferro (ou estas, de três pés), e a maior a que se enchia de água, chegavam-se ao lume.
Numa das mais pequenas, assentes no borralho, começava a morrinhar o caldo para onde se deitava um cibinho de toucinho (se fosse do rosado, daquele junto ao osso do presunto, era uma festa), um olhinho de couve, que o frio e a neve amaciavam, um ramo de cheiros, daqueles que se tinha ao pé da porta.
O preparado era lento, ia condensando o sabor, até à hora da ceia, altura em que se deitava para o caldo as mãos cheias, estritamente necessárias, de arroz, carolino (o que então se conhecia e utilizava).
É usual dizer-se que este é o arroz português por excelência, carolino, porque veio da Carolina do Sul, donde este tipo é originário. É o que absorve melhor os sabores dos temperos. Mas é preciso saber cozinhá-lo…
Os árabes trouxeram o arroz para a Península Ibérica quando da invasão, em 711.
No reinado de D. Dinis surgem as primeiras referências escritas sobre a cultura do arroz, reservado à mesa dos ricos.
No séc. VXIII criaram-se incentivos á sua produção, especialmente nas regiões dos estuários dos principais rios de Portugal.
Por volta de 1900, a cultura do arroz era nas “terras alagadiças dos vales do Vouga, Mondego, Sado, Mira e Guadiana”. São cerca de 25 mil hectares de arroz, maioritariamente carolino, 70% da variedade Aríete.
João Reboredo
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