Capital psicológico / Mara Correia – Como é que eu pude ser tão cega?

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Este texto é dedicado à Filipa, a propósito das nossas conversas sobre ideal e realidade, sobre o levantar ou baixar os braços perante objetivos importantes na vida. Este é um texto sobre o desafio que é para nós – psicólogos – ajudar pessoas a alcançarem-nos.
Cegueira intencional. Acontece nas mais variadas áreas da nossa vida: há coisas que nós podíamos saber, que porventura até teríamos obrigação de saber – mas escolhemos não as saber. A expressão cegueira intencional tem origem no direito, e remonta já ao séc. XIX. O cego intencional é aquele que decidiu não ver algo que era do seu conhecimento. O cego intencional – não sendo culpado (às vezes até se finge de vítima) – é responsável.
Na psicologia, a cegueira intencional decorre da nossa própria limitação humana: o nosso cérebro é limitado na sua capacidade de processar e entender tudo o que acontece. Por isso mesmo, selecionar a informação é a forma mais adaptativa de lidarmos com a realidade e variedade de coisas que se passam. No entanto, esse filtro que nos ajuda a funcionar é também o filtro que nos pode cegar. Isto porque temos um “defeito”: temos a tendência de selecionar a informação que nos faz sentir melhor em relação a nós próprios no imediato, que nos “protege” dos nossos medos. Por exemplo, o medo de mudar, o medo de entrar em conflito, o medo de perder alguém e ficarmos sós.
Provavelmente é no Amor que somos mais cegos ou que somos cegos mais vezes. Até nos perguntamos: como é que eu fui capaz de ser tão cego(a)? Mas podemos ser cegos em várias coisas… quando escolhemos voltamos a fumar, quando voltamos para aquela pessoa, quando suportamos demasiadamente aquele ambiente de trabalho, quando escolhemos não ver o que se passa com um amigo ou um familiar, quando quebramos a dieta, o plano alimentar, o programa de fitness… Em vez de suportarmos a dificuldade de mudar para cumprir um objetivo positivo, construímos uma desculpa na nossa cabeça. Há coisas que nós preferimos não ver, para podermos continuar a ter comportamentos que na realidade nos fazem mal – mas que tornam o nosso dia-a-dia aparentemente mais agradável ou menos doloroso. É assim com todos nós.
Por isso, pode ser muito importante ter ajuda. Ela pode determinar o sucesso ou o fracasso de um plano, assim como evitar que as exigências impostas pela nossa cabeça e a culpa por acharmos que não suficientemente persistentes nos desamparem e roubem a esperança. O fracasso é sempre uma possibilidade, mas a nossa maior força advém da nossa maior vulnerabilidade. Terá sido esse o maior ensinamento que a “ressurreição” da Páscoa nos terá dado.

 

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