Guilherme José
livreiro “Malfeitor”
O sistema capitalista sobrevive do desvinculo entre o sujeito e o coletivo, e isso acontece nos dias de hoje sobre as máximas da liberdade e afirmação individual. Esses pensamentos, infinitamente diluídos nesta época pós-moderna, tanto corroem – quando levados ao extremo – o meio social, quanto o sujeito, pois esse, mergulhado na maior das ignorâncias, deixa de olhar para a sua individualidade como uma pertença comunitária, para passar a justifica-la enquanto força de automatização subjetiva, apenas possível de emancipar-se por via da profissionalização, instância tal que conduzirá o indivíduo à meta final: a busca pelo seu reconhecimento através da participação ativa no mundo de consumos. Aqui, podemos concluir que o sujeito foi direcionado por um conjunto de forças (entenda-se, os mercados) que, por via de uma dialética meramente capitalista e neoliberal, não só lhe vendeu uma nova conceção de liberdade, como o entregou a uma esfera substancialmente niilista, onde a sua consciência passou a unificar-se com o não-idêntico (tudo aquilo que não é sujeito, mas produto).
Essa forma de exploração, desta vez, com a aparente colaboração do sujeito hiperindividualista, é um corrompimento autêntico – sobre a justificativa da profissionalização – da conceção de trabalho proferida por Hegel. Para o filósofo, a função desta atividade realmente é a de individualizar o sujeito, mas não o subjetivando a um expoente máximo, aliás, o trabalho de acordo com a perspetiva hegeliana serve para suspender a satisfação imediata dos desejos, e não o seu contrário, como a sociedade hedonista nos propõe.
É considerado trabalho, para Hegel, toda a atividade na qual transferimos a nossa vontade para o objeto trabalhado, a fim que a natureza não se imponha ao “Eu” e o escravize a um determinado meio. No entanto, o que é mais risório em todo este contexto, é o facto dos ditos anticapitalistas de esfera exclusivamente marxista, não compreenderem que a deturpação do conceito hegeliano se deve sobretudo a Marx; quando o próprio, arranca toda a componente idealista dialética de Hegel (talvez, por não a compreender) para transmutá-la num materialismo dialético onde o objetivo do trabalho já não é o de atingir o “espírito”, mas antes, o de reproduzir uma consciência material da existência, restringindo assim, o trabalhador, ao único sistema que lhe é possível: o económico. ■