Crónica do Québec (Canadá)

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Motards de Inverno

Devido aos nossos longos Invernos e à obrigação legal de que todos os veiculos motorizados, (bicicletas excluídas, obviamente) entre os dias 15 de Dezembro e 15 de Março de cada ano, sejam obrigados a circular com pneus especiais para a condução na neve, por motivos de segurança, as motas e motorizadas não podem andar  nas nossas estradas durante aquele período. Não impede que, chegado o dia 16 de Março os adeptos daquele meio de transporte estão normalmente preparados para invadirem não só as longas e gratuitas auto estradas canadianas como os pequenos caminhos das nossas localidades, tendo passado uma boa parte das longas noites do Inverno quebequense na preparação dos seus «preciosos» engenhos, para a primeira saída primaveril. E o termo precioso nem se pode considerar um eufemismo se considerarmos os montantes exorbitantes que são obrigados a dispender anualmente em chapas de matrícula e seguros, para poderem beneficiar de meia dúzia de meses de prazer sobre duas rodas. Mas para todos aqueles que conhecemos e que são adeptos indefectíveis da condução de motos de grande cilindrada, não são alguns milhares de dólares a menos na conta bancária que os vão impedir de saborear toda a excitação, que aparentemente provoca a condução dos potentes engenhos de duas rodas.
Este ano quiseram os «deuses» no entanto que bem antes do dia 15 de Março já a neve praticamente desapareceu da superfície dos solos, e os termómetros, dir-se-ia que se esqueceram de que estamos no Québec, que, como dizia o poeta est le pays de l‘hiver. Em mais de trinta e cinco anos que já levamos de residência nestas paragens é a primeira vez em que, praticamente desde o início de Março, em vez de neve, temos tido chuva, e em vez da habitual côr branca que cobre habitualmente a imensidão dos nossos campos agrícolas, logo aqui a algumas centenas de metros da nossa casa, somos presenteados com um colorido acinzentado até onde a vista alcança, mais do género das paisagens alentejanas de Dezembro ou Janeiro. Seja devido ao tão propalado aquecimento global, ou apenas um mero capricho meteorológico, amanhã, Domingo, dia 18 de Março de 2012, numa altura em que as temperaturas máximas médias do ar, nesta época do ano, não vão normalmente além dos 4 graus centígrados, e em que a temperatura máxima recorde até hoje registada não ultrapassou os 12 graus, estão previstos uns primaveris 23 graus positivos.
Estes dias de Verão precoce que se irão ainda manter durante cerca de uma semana, farão com que os hábitos e vivências das pessoas sofram uma alteração radical. Até a «aldeia das neves» na Ilha Sainte-Hélène, que foi tema duma crónica anterior  e que se deveria normalmente manter em actividade até ao próximo dia 31, teve de «fechar» mais cedo, já que as lindas e dispendiosas construções de gelo que faziam as delícias de pequenos e graúdos, deram lugar a montões de uma massa branca, suja e disforme, que normalmente apenas vemos lá para meados de Abril. Aqui em casa até costumamos dize que, se a Primavera oficialmente começa a 21 de Março, no Québec surge sempre um mês mais tarde.  Diga-se no entanto que esta extemporaneidade climática é bem aceite por praticamente toda a população, que pode assim gozar mais uns dias de  temperaturas amenas.
Mas como não há bela sem senão, à falta de chuva de que se queixam em Portugal, contrapõe-se aqui a falta de neve. É que os nossos agricultores estão há muitas gerações habituados a ver os seus terrenos cobertos duma camada de gelo de alguns centímetros,durante pelo menos quatro longos meses, e as sementeiras são feitas em função destas características climáticas. Esperemos assim que este mês adicional de temperaturas muito acima do normal, com muita chuva e muito pouca neve, não sejam demasiadamente prejudiciais aos nossos agricultores, e, por conseguinte, com reflexos negativos no custo de vida de todos nós, consumidores.
Já os nossos motoqueiros, para utilizar o termo horroroso que costumamos ver escrito na, por vezes tão mal tratada língua de Camões, não ficarão minimamente preocupados com tal, se considerarmos até que, o custo médio por quilómetro percorrido, na satisfação do seu hobby favorito, acaba por ficar mais barato na equação tempo/utilizacão, dos seus engenhos motorizados.

J.L. Reboleira Alexandre