O dito «socialismo nórdico» tem desde há longos anos um grande impacto e poder atractivo sobre a juventude escolarizada portuguesa, e não só. Há ainda na pequena biblioteca da minha residência caldense, nunca renovada depois que abandonei Portugal em 1976, e onde, de cada vez que por lá passo fico surpreendido com tudo o que li entre os finais da adolescência e até meados da minha segunda década de existência. No meio de toda aquela literatura, onde, por entre Marx, Engels, Lenine, Rosa Luxemburgo ou Enver Hoxha, geralmente em língua portuguesa, se encontra um pequeno livrinho de uma centena de páginas cujo título é exactamente: O Socialismo Sueco.
O Canadá, menos conhecido devido à distância a que se encontra de Portugal, sempre fez no entanto parte do grupo dos países nórdicos ditos de «socialistas». País de gentes com usos e costumes livres, para alguns, libertários, onde o casamento entre conjuges do mesmo sexo há anos está legalizado, com um famoso primeiro ministro, Pierre Trudeau, com fama de playboy, cuja esposa Margareth manteve durante algum tempo, um affair com um dos membros do grupo rock Rolling Stones, que era considerado pela CIA, um perigoso comunista devido às suas relações com Cuba de Fidel de Castro. Distante portanto, dos falsos puritanismos dos nossos vizinhos do Sul da fronteira.
Este grupo de países que incluem ainda a Noruega, a Dinamarca e a Finlândia viveram durante toda a década de oitenta do século XX enormes transformações, durante as quais imensas conquistas dos trabalhadores foram sendo postas em causa. Continuam a ser no entanto sociedades relativamente justas, onde as desigualdades sociais são menos visíveis do que noutros locais do Globo que infelizmente todos conhecemos. A título de exemplo poderia mencionar que, um trabalhador manual qualificado tira do seu trabalho, proveitos similares aos de um professor do ensino básico ou secundário, e que um médico generalista (a nossa medicina está totalmente socializada e a actividade medical privada continua interdita) não recebe ao fim do mês o dobro dos que mencionei no exemplo anterior. O salário mínimo da nossa provincia desde o dia 1 de Janeiro de 2011 é de $9.50 dólares por hora e a semana de trabalho é normalmente de 35 ou 40 horas de actividade. Como também já mencionei, os salários não são mensais mas sim, semanais ou quinzenais. Não impede que, a camada dirigente do topo da pirâmide da sociedade, nos organismos públicos como nas grandes corporações, aufira rendimentos que poderia classificar de obscenos, mas o sistema fiscal é neste caso implacável e a partir de determinados escalões altamente penalizadante. Por isto mesmo, alguns dos nossos desportistas profissionais mais bem pagos, optam por estabelecer residência nos Estados Unidos, ou bem mais longe, no Principado do Mónaco, onde «morava» o mais conhecido de todos nós, o antigo piloto de Fórmula Um, Gilles Villeneuve, que após o seu falecimento em 1982 num acidente durante as qualificações para o Grande Prémio da Bélgica no circuito de Zolder, deu o nome à pista onde actualmente se disputa em Montreal, a corrida anual do Grande Circo (como aqui lhe chamam) em meados do mês de Junho de cada ano.
Vem esta longa introdução a propósito dum email que recebi duma jovem leitora da cidade do Porto, licenciada em Direito, que me perguntava sobre a possibilidade de exercer advogacia no Canadá. Sem a querer demover da intenção, e vontade que demonstrava em querer iniciar a sua actividade profissional neste magnífico país, alertei-a no entanto para todas as dificuldades que viria encontrar. O primeiro problema, seria o do reconhecimento dos seus diplomas. Ainda me lembro, que no meu caso pessoal e após ter recebido as minhas equivalências académicas, vi-me a andar para trás cerca de três anos, o que considerei um exagero, me impeliu imediatamente para o mercado de trabalho e me permitiu descobrir uma profissão que adoro, e não faria certamente parte das minhas opções iniciais quando parti do Chão da Parada.
Sendo a língua oficial do Québec o Francês, e tendo em consideração a atracção que a Província exerce sobre os habitantes do hexágono e todos os acordos de cooperação que existem entre os dois países, em resultado da crise que assola a França, neste momento e como já mencionei noutra crónica, assiste-se à chegada de muitos profissionais gauleses, que, uma vez estabelecidos esbarram nas dificuldades burocráticas que nós sentimos e que lhes são impostas pelas Ordens Profissionais quebequenses, ciosas dos seus direitos e numa tentativa de salvaguarda dos seus interesses corporativos geram o impedimento da actividade aos jovens imigrantes, que a termo, lhes fariam concorrência. Muitos há que, optam por actividades colaterais do ramo para o qual estudaram, outros voltam a inscrever-se na Faculdade a fim de passarem o indispensável exame da Ordem para mais tarde poderem exercer a sua actividade, e alguns, desiludidos, acabam por voltar ao país de origem. Alguns há igualmente que, tendo vindo com intuito exclusivo de concluirem estudos de Segundo ou Terceiro Ciclo Universitários, acabam por constituir familia com colegas da mesma escola, e claro, aqui se instalam definitivamente sem qualquer dificuldade.
Se a tudo isto juntarmos o facto da língua materna dum, ou duma jovem portuguesa ser diferente da nossa, torna-se evidente que a decisão de abandonar o país que investiu na nossa formação inicial não deve ser tomada de ânimo leve. A longo prazo, pode vir a ser no entanto altamente gratificante e valorizante o sentimento de se sentir cidadão de pleno direito deste país maravilhoso, que, citando uma antiga colega dos bancos de escola em Lisboa, e depois duma recente visita no pretérito mês de Julho, dizia, e cito: o Canadá deve ser um dos melhores sítios do planeta Terra para viver.
J.L. Reboleira Alexandre
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