No tempo da «estrada de macadame» Santa Catarina ficava muito longe das Caldas da Rainha mas, honra lhe seja feita, os responsáveis do Turismo caldense incluíam a sua igreja paroquial e o seu «cabeço do castelo» nos roteiros de divulgação. No desdobrável antigo mas ainda em distribuição no Posto de artesanato onde era a PVT, ao lado das Escolas Primárias, lá consta o título genérico (Cidade termal, da cultura, do comércio e do turismo) e as sugestões de locais a visitar fora da cidade: Capela de São Jacinto (Coto), Igreja Matriz (Alvorninha), Castro de Santa Catarina (Santa Catarina), Igreja de Santa Catarina, Almofala (Alvorninha), Igreja da Serra do Bouro, Cemitério dos Ingleses (Serra do Bouro), Paúl de Tornada, Moinho de Madeira do Zambujal (Alvorninha), Ruínas da Alfândega e Dunas (Salir do Porto) e Lagoa de Óbidos.
No passado mês de Julho participei num Encontro na EXPOESTE sobre os direitos dos idosos e a Organização ofereceu-me um saco cheio de coisas bonitas das Caldas da Rainha – um livro, a bandeira municipal, uma peça de cerâmica e um CD intitulado «Caldas da Rainha – A cidade das Águas e das Artes». Aqui a surpresa desagradável foi o facto de na lista dos locais a visitar fora da cidade se incluir apenas o seguinte: Ermida de S. Jacinto (Couto), Igreja da Misericórdia (Alvorninha) e Igreja Paroquial (Alvorninha). Para além da discrepância da grafia de Coto por Couto, há uma série de desaparecimentos na lista do Turismo caldense. A começar pelo Castro e pela Igreja Paroquial de Santa Catarina. Parece-me óbvio a mim que não sou historiador mas apenas um obscuro jornalista, o problema seguinte: tanto o Castro como a Igreja são muito antigos e a sua importância está na sua antiguidade. Assim sendo, quanto mais tempo passa, mais antigos são os monumentos e mais razão existe para serem recomendados pelo Turismo caldense ao visitante.
Dito de outra maneira: a igreja paroquial de Santa Catarina existe desde 1428 quando os moradores voltaram costas ao mosteiro de Alcobaça e seu abade, pedindo ao Bispo de Lisboa «autorização para construírem a sua igreja pondo nela um capelão ou cura a que também pagariam às suas próprias custas». Conforme se lê em «Salir de Outrora» de Carlos Marques Querido «nunca se conformou o Mosteiro de Alcobaça com a autonomia dos moradores desta vila que persistiu durante séculos em eleger o seu próprio pároco, sustentando-o, arcando com as despesas de construção e manutenção da igreja sem qualquer intervenção do abade». Já em 1706 o padre Carvalho da Costa no livro «Corografia Portuguesa» assinala Santa Catarina como «a única vila nestes coutos em que o padroado da igreja é dos fregueses»; só não explica que os fregueses construíram a igreja e alimentaram o pároco, daí o seu afastamento e rebeldia em relação ao abade de Alcobaça. Vale a pena recordar que o Tribunal de Apelação da Santa Sé em 1608 decidiu contra os fregueses de Santa Catarina e contra o bispo de Lisboa (D. Miguel de Castro) a entrega da igreja ao abade de Cister mas o povo de Santa Catarina continuou a nomear o seu pároco e a ignorar o abade de Alcobaça.
Esta história bonita de um povo rebelde que pensa pela sua cabeça e decide segundo os seus legítimos direitos contra outros interesses supostamente superiores até pode constituir um motivo de maior relevo para a indicação de interesse turístico.
Mesmo depois das obras restam ainda o retrato a óleo do bispo catarinense D. José António da Silva Rebelo (1779-1846) e três lápides colocadas na vertical da parede numa capela lateral: capitão Alberto Furtado de Mendonça (1695) e sua filha (1702), João Rodrigues Portuguez (1544) e J. Fialho e esposa, Catarina Abadessa. Fica o pedido à CMCR: não apaguem Santa Catarina, aumentem e melhorem o que já vem do passado.
José do Carmo Francisco