O Hotel Lisbonense na rubrica Ontem & Hoje

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Eu, Vincent Craveiro Martins, assinante nº 14799, venho por este meio, em carta aberta, contrariar informações erradas dadas na publicação da Gazeta das Caldas de 2 de Novembro de 2012, na rubrica Ontem & e Hoje, num artigo da autoria da Exma. Senhora Isabel Xavier, referente ao Grand‘ Hotel Lisbonense.
Como interessado nestas matérias do Património Histórico das Caldas da Rainha, li o referido artigo, tendo verificado existir alguma inverdade referente à história do Hotel, o que denota falta de rigor na investigação para a produção do referido artigo, se é que houve.
Merece o artigo os seguintes reparos:
1º No primeiro parágrafo refere que a origem do nome “Lisbonense” dado ao Hotel terá como razão provável a sua localização geográfica, ou seja estar situado na rua Oriental do Passeio (actual Av. Manuel Figueira Freire da Câmara), “zona de entrada da Vila das Caldas para quem vinha de Lisboa”
Não é essa a origem mas sim uma homenagem de Vicente Paramos à sua esposa, Júlia Xavier Paramos, e um tributo à cidade de Lisboa que o acolheu aquando da sua emigração da Galiza Para a capital de Portugal.
2º Vicente Paramos não é oriundo de Tuy, conforme referido no segundo parágrafo que diz “a existência desta unidade hoteleira ficou a dever-se a Vicente Paramos originário de Tuy”. A verdadeira origem de Vicente Paramos é um pequeno povoado de se nome, San Xoán de Paramos, (5 km de distância Tuy) próximo de Guillarei na província da Galiza, Espanha.
Podemos confirmar isso com a própria família Paramos que ainda se encontra com descendência nas Caldas da Rainha.
3º A família já possuía um Hotel na zona de Sintra, é na década de oitenta, e não setenta como está citado no artigo, que esta família veio para as Caldas, abrindo o primeiro Hotel Lisbonense na rua do Olival de Cima nº28 (actual Rua General Queirós), Cito livro de Vasco Trancoso intitulado “Caldas da Rainha: um contributo iconográfico através do bilhete postal ilustrado editado até meados do século XX” . Testemunha de tal é o caro Hermínio de Oliveira, alfarrabista local, de Caldas da Rainha que viveu neste prédio e se recorda de ainda verificar vestígios da passagem do Hotel Lisbonense neste edifício.
4º A data 1890, no portão de entrada do Hotel indica o ano em que se construiu o primeiro edifício do Hotel Lisbonense, a partir desta data sofreu 3 grandes ampliações que iriam até à primeira década de 1900, como se podem verificar em postais publicitários da época e em clichés de Júlio Paramos, filho do fundado do Hotel. De Evidenciar que estas ampliações no tempo foram observadas aquando da demolição das paredes e interior do Hotel.
5º O presidente Óscar Carmona esteve no Hotel Lisbonense não só em 1927, como está referido no artigo, mas também em 1935, aquando da inauguração da estátua da Rainha D. Leonor, tendo almoçado no Hotel, com a companhia da comitiva e o Cardeal Cerejeira, patriarca da Sé e Diocese de Lisboa e Fernando Pessa, jornalista da época, existindo documentos fotográficos em base online do Arquivo Nacional da Torre do Tombo em Lisboa, (código de referência no arquivo: PT/TT/EPJS/SF/001-001/0037/1828J)
6º Vicente Paramos faleceu em 1922 e não em 1933 com referido no artigo, pois na obra: “Grand Hotel Lisbonense de Caldas da Rainha”, de Vincent Craveiro Martins, do ano de 2012 surgem documentos digitalizados tais como Letras bancárias com datas anteriores a 1933, endereçadas a “Viúva e Filhos de Vicente Paramos”, o que sustenta que o ano de falecimento foi 1922. Tal afirmação pode ser confirmada no assento de óbito do ano de 1922, presente no Cartório Paroquial de Caldas da Rainha.
Faço estes reparos humildemente fundamentados com anos de pesquisa e no trabalho que realizei, ainda em contexto académico na ESAD (Escola Superior de Artes Decorativas) e que presentemente se encontra em edição da minha autoria, disponível na Biblioteca Nacional (deposito Legal: PT- 337296/11), na Biblioteca Municipal de Caldas da Rainha e que eu terei todo o gosto de disponibilizar para qualquer duvida que ainda possam restar.
Sem mais a acrescentar, bem-haja, viva Caldas da Rainha e a história desta “Cidade Termal”.

Vincent Martins

A resposta de Isabel Xavier

Relativamente à carta de Vincent Craveiro Martins a propósito do texto que escrevi sobre o Hotel Lisbonense para a rubrica Ontem e Hoje, publicado na Gazeta das Caldas  de 2 de Novembro de 2012, quero esclarecer os seguintes aspetos:
1º) O conhecimento que fui adquirindo sobre o Hotel Lisbonense provém essencialmente da leitura cuidada da imprensa caldense, principalmente da que corresponde aos finais do século XIX e aos inícios do século XX, com destaque para o jornal O Círculo das Caldas. Também consultei a Gazeta das Caldas para períodos posteriores.
2º) É certo que a informação histórica recolhida através da imprensa pode, por vezes, não merecer total confiança, podendo haver alguma falta de rigor nas notícias dadas nos jornais da época. No entanto, é natural e razoável que se indique Tuy como terra de origem de Vicente Paramos por ser a localidade de referência na zona geográfica em que se insere.
3º) Com mais razão pode (igualmente) ser imputada alguma falta de rigor às informações recolhidas através de entrevistas, principalmente quando elas são prestadas na terceira pessoa e passadas algumas gerações, por mais idóneas que sejam (e são) as pessoas entrevistadas. Quando assim é, normalmente, procura-se cruzar a informação recolhida com outras fontes, por exemplo a imprensa, à falta de documentação mais fidedigna. Aliás, não há informação que deva ser considerada como uma verdade absoluta, que exclua qualquer outra possibilidade alternativa, ou qualquer outra hipótese interpretativa.
4º) Que o primeiro hotel que a família Paramos possuiu nas Caldas da Rainha se situava na rua que veio a chamar-se General Queirós, sabia-o eu bem. Contudo não me pareceu pertinente prestar essa informação num comentário expressamente dedicado a duas imagens do hotel nas instalações situadas junto do Parque.
5ª) A origem da designação “Lisbonense”, avançada da por João B. Serra no livro 21 anos pela História, 2003, Edições PH (p. 214), para além de apresentada por mim como “provável”, parece-me ser bem mais plausível do que a que é defendida por Vincent.
6º) Quanto à indicação da década de 70 do século XIX para a vinda da família Paramos para as Caldas e da década de 80 para a edificação do hotel, baseio-me num texto a que tive acesso através de Leonor Laranjeira, a quem muito agradeço, com dados por ela recolhidos junto da família Paramos. A interpretação que faço da data de 1890 inscrita no portão do Hotel Lisbonense decorre da leitura do jornal O Círculo das Caldas de 11 de Junho de 1893.
7º) Inadvertidamente, escrevi 1933 em vez de 1922 ao referenciar o ano da morte de Vicente Paramos. Do lapso cometido me penalizo e peço desculpa à Gazeta das Caldas e seus leitores, bem como à família Paramos.
8º) O facto de o Presidente da República Óscar Carmona ter estado nas Caldas da Rainha hospedado no Hotel Lisbonense noutras ocasiões para além da que referi, não invalida que tenha estado dessa vez (1927). Como se calcula, presidiu a essa referência um critério de escolha a título de exemplo. Aliás, muitos outros acontecimentos e notícias podiam ser acrescentados aos que refiro. Por exemplo, o almoço servido no Hotel Lisbonense aos congressistas do Primeiro Congresso Internacional de Turismo realizado em Portugal, em 1911, aquando da sua vinda às Caldas; a abertura de uma sucursal do Hotel Lisbonense na Figueira da Foz em julho de 1898; as referências ao Hotel Lisbonense nas revistas e jornais nacionais de que possuo informação, etc. É preciso fazer escolhas, tanto mais quando se pretende evitar um texto demasiado extenso para o fim a que se destinava.
9º) Resta dizer que para o texto que escrevi sobre o Hotel Lisbonense me preocupou essencialmente uma abordagem do significado que esse equipamento turístico foi tendo na vida das Caldas da Rainha, numa análise que fosse (também) para além do hotel, que o contextualizasse. Os espaços e as vicissitudes por que passam dizem muito das localidades em que se inserem e da sua história.
Não quero acabar esta minha resenha sem cumprimentar o Vincent pelo trabalho e pelo esforço que tem colocado em prol do conhecimento do Hotel Lisbonense. Devo, no entanto, alertá-lo para o facto de que isso não deve impedi-lo de reconhecer a validade do estudo que outros têm realizado sobre o mesmo tema. Não atribuo a Vincent nenhumas outras intenções ou más vontades para além das que ele evidencia no texto que escreveu e das que estão implícitas no próprio ato de o ter escrito. Termino, manifestando a minha indisponibilidade para voltar a este assunto mesmo que ele venha a ter futuros desenvolvimentos.

Isabel Xavier