O Orçamento Participativo nas Caldas da Rainha

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Em 2013 o Orçamento Municipal de Caldas da Rainha vai ter uma verba de 150 mil euros para investir em projectos propostos por cidadãos. É justo reconhecer o papel dos dois vereadores do PS na Câmara Municipal que protagonizaram esta proposta. A partir de agora os munícipes têm ao seu dispor uma ferramenta de efectiva proximidade às decisões da Câmara Municipal e uma possibilidade de propor e escolher os projectos onde o Município vai gastar o dinheiro. Pessoalmente, creio que é um bom ponto de partida e o aumento da verba a inscrever anualmente dependerá também do interesse e participação dos cidadãos no processo.
Estamos neste momento em plena discussão do Orçamento Participativo para inscrição do exercício de 2013 e esta primeira discussão padece de alguns problemas e limitações. Todo o processo teve início em 2 de Outubro e as propostas têm de estar aprovadas até final de Novembro, para integrarem em tempo útil o Orçamento Municipal de 2013. Esta compressão dos prazos e aceleramento do processo veio a revelar um conjunto de limitações e contradições que não foram resolvidas nas duas Assembleias Participadas inicialmente previstas, e por pressão da participação dos cidadãos alargadas a uma terceira em benefício da transparência do processo e da efectiva participação dos cidadãos.
Termos um Orçamento Participativo em Caldas da Rainha é um bom ponto de partida para estimular a participação da população. Como também já afirmámos em sede de Assembleia Participada, mais importante do que os resultados, é o desenrolar do processo. Mais importante do que dizer aos cidadãos que o dinheiro é investido em iniciativas propostas por eles, é saber como são escolhidos os projectos, e de que maneira. Por isso foi tão contestada a decisão que a CMCR trouxe à segunda Assembleia Participada, que “matava” a parte mais importante do Orçamento Participativo: a participação activa dos cidadãos e a possibilidade de fazerem escolhas, votando nos 13 projectos concorrentes. Felizmente, os três vereadores presentes lá perceberam, que estavam a “cavar a sepultura” do OP à nascença, e inflectiram caminho aceitando um recuo na rejeição da maioria de projectos e remetendo a decisão para uma terceira sessão da Assembleia Participada.
Mas o OP também é um ponto de chegada. O primeiro OP em Portugal foi realizado em Palmela no ano de 2002. Depois disso outros municípios aderiram a este modelo de estímulo à participação. Podemos citar alguns exemplos: Lisboa, Odemira, Odivelas, Cascais, Oeiras. Como mais recente Aveiro, que na sua primeira experiência de OP teve uma adesão de quase 700 munícipes. A nível mundial, podemos apontar o OP da cidade de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul, desde 1987 – é o caso mais estudado por todas as universidades do mundo que se debruçam sobre esta matéria.
Cá por Caldas a discussão pública do OP também tem história. Em 2001, este assunto foi tema recorrente em muitas sessões da Tertúlia Noites da Galáxia, que tinha lugar então na Livraria Galeria Nova Galáxia. Os impulsionadores deste assunto foram o professor António Maria de Sousa, e o ceramista e escultor Armando Correia. Pessoas atentas e cultas, com uma visão cosmopolita do mundo, com perspectivas avançadas da democracia,. É justo também mencionar aqui os contributos do Eng. Lacerda Fonseca, grande conhecedor e estudioso dos temas da participação e do aprofundamento das democracias. Justo também será reconhecer o papel do deputado do BE à Assembleia Municipal, Fernando Rocha, desde sempre um activista do OP.
Creio que devemos reconhecer alguma ingenuidade aos vereadores do PS. A pressa de concretizar um processo participativo em dois meses, quando o mesmo leva cerca de nove meses a um ano, revela também a precipitação de alguém que propôs um modelo sem o estudar. O oportunismo da proposta, em ano pré-eleitoral, é demasiado evidente para virem agora acusar outros de eleitoralismo. E quererem projectar nos outros, o que não conseguem reflectir no seu próprio espelho é deselegante.
É importante que o OP sobreviva ao seu “ano zero” e possa fazer um caminho de acordo com as boas-práticas que têm vingado noutras geografias. Para além das divergências naturais de quem faz política activa e defenda visões diferentes para os mesmos assuntos, é mais importante o caminho colectivo de aprofundamento da democracia. Que esta primeira experiência nos sirva de ensinamento, para transformarmos as limitações deste ano em potencialidades do próximo.

Lino Romão