«Ovas & Outros Sentimentos» de Francisco Milheiro

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Livro dedicado ao leitor e a Teixeira de Pascoaes, as suas páginas revelam essa divisão funda entre duas figuras e dois modos de fazer literatura. A começar pelo título, há neste livro breve (31 páginas) uma dupla inscrição: Natureza e Cultura, Pascoaes e Pessoa.
O poeta vive perto da Natureza («As folhas verdes /crescem, sobem, /de repente. As folhas / mortas, precipitam-se / em queda livre / sobre o solo.) mas lê o Mundo através da Cultura. Depois da advertência («Há demência em toda a poesia»), o poeta dialoga com autores diversos:  Al Berto, Luís de Camões, Brecht, Mário Cesariny, Herberto Helder e Fernando Pessoa:  «Tudo existe em sua/ ilusão de existir./ Tudo é, nada é sentir.»
Num quotidiano dominado por códigos («O ácido números do código de barras») e computadores («O papel com o nib está lá dentro, perdido») o horizonte está cada vez menos humanizado: «A vida é assim, e / o humanismo, uma / minudência de cristal. /Trespassa-se.» Só o amor resgata essa hostilidade: «Pende sobre mim /a memória dos teus cabelos/ o cheiro a amoras frescas: / aromatizante enriquecido/ com óleos naturais, lê-se/ no contra-rótulo da embalagem.» Ou, dito de outras maneira: «Cai, dolente, o mundo/ sobre os teus ombros.»
(Editorial Hespéria, Capa: Salomé Duarte, Design: Fernando Estevens)

José do Carmo Francisco

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