Isabel Xavier
professora
O telefone fixo tocou, coisa rara nos dias que correm, e eu levantei-me para o atender. Do outro lado da linha, uma senhora propôs-me aproveitar a oportunidade de fazer um rastreio auditivo gratuito. Eu agradeci, mas disse que não estava interessada. Expliquei, com indicações do local e outros pormenores, que tinha feito um desses exames auditivos há pouco tempo, também num rastreio gratuito, que aliás tinha corrido muito bem, tanto no atendimento como nos resultados.
A senhora contrapôs que não se tratava do mesmo tipo de exame de certeza, já que este que agora me propunha era bem mais completo, que não se tratava apenas de medir os níveis de audição, mas também de fazer exames de despistagem de vertigens e outras coisas do género. Insistiu o mais possível comigo e eu, palerma que sou, e talvez influenciada pelo carácter positivo da minha experiência anterior, cedi.
Tal como a senhora me informara, o telefone voltou a tocar a fim de eu marcar o horário a que deveria dirigir-me ao parque de estacionamento de uma das grandes superfícies das Caldas da Rainha, no dia seguinte, para o rastreio. Quando cheguei ao local, qual não foi o meu espanto ao constatar que tudo se passava praticamente ao ar livre, numa espécie de tenda de plástico, aberta à frente e em que o plástico dos lados era solto, produzindo um barulho constante, devido ao vento que se fazia sentir nesse dia.
Afinal, o exame foi completamente igual ao que eu havia feito, com a agravante de ter sido realizado em muito piores condições, e de ter tido muito piores resultados, visto que não distingui os sons mais graves. Explicaram-me que isso era muito natural, dado o grande barulho que ali se fazia sentir. Quando questionei se não se faziam exames adicionais, responderam-me que não, que isso só aconteceria se tivessem detetado algum problema, o não sucedera.
Mas o pior de tudo não foi o logro em que caí, nem os piores resultados auditivos que obtive, mas o tom adoptado pelo jovem que me atendeu para falar comigo. Classificá-lo de “condescendente” seria de um eufemismo gritante. Dirigiu-se a mim, creio que por simpatia, querendo “meter conversa”, abordando assuntos supostamente engraçados, que não só não me interessavam nada a mim, como nada lhe podiam interessar a ele e que, de certeza, não tinham o menor interesse para o que ali decorria, como se falasse com uma criança. Saí dali o mais rápido possível, com a sensação de ser esta a primeira vez que se dirigiam a mim como “idosa”, e perguntando a mim mesma, quase em pânico: será que é isto que me aguarda daqui para a frente? ■