«Ó meu rico Santo António!» de José Viale Moutinho
O subtítulo deste livro de 177 páginas é «O taumaturgo na Literatura Popular» e José Viale Moutinho (n.1945) inclui nele as lendas, as cantigas, as quadras, as loas, as orações e os responsos mas abre o trabalho com um poema de Fernando Pessoa (datado de 9-6-1935) e um sermão do Padre António Vieira proferido no Maranhão (Brasil). Vejamos um excerto do poema: «És o que és para nós. O que tu foste /Em tua vida real, por mal ou bem, / Que coisas ou não-coisas se te devem / Com isso a estéril multidão arraste / Na nora de uns burros que puxam, quando escrevem / Essa prolixa nulidade, a história. / Que foste tu, ou foi alguém, / Só Deus o sabe, e mais ninguém.» E agora citamos o sermão: «Se vos adoece o filho, Santo António; se vos foge o escravo, Santo António; se mandais encomendas, Santo António; se esperais o retorno, Santo António; (…), se aguardais a sentença, Santo António; se perdeis a menor miudeza da vossa casa, Santo António; e talvez, se quereis os bens da alheia, Santo António.»
Por ser uma bela lenda antonianas, vale a pena citar «O sermão aos peixes»: «Santo António, conforme a regra franciscana, acompanhado de um outro frade da sua ordem, chegou certo dia a Rimini. Na foz do rio Marecchia, no Mar Adriático. Ia pregar, só que aquela cidade era de maioria cátara e, sobretudo, sabendo quem ele era, receberam-nos com escárnio. E tiveram esse procedimento durante um par de dias. O santo lisboeta queria pregar, mas não tinha a quem. Quando encontrava um grupo de pessoas e tentava falar-lhes, naquele instante ficava apenas com o frade que o acompanhava. No entanto, frei António não esmoreceu. Uma manhã dirigiu-se à praia onde apenas se encontravam os pescadores que preparavam as redes para a pesca. Nem lhes disse nada, pois dirigindo-se à beira-mar, voltado para as águas do mar, falou assim: – Vinde ouvir as palavras de Deus. Ó criaturas do Senhor! Se os ímpios e hereges não as querem escutar, elas serão dirigidas a vós! E reza a lenda que à superfície das águas do Adriático começaram a aparecer as cabeças de milhares de peixes que ficaram imóveis a ouvir o sermão de Santo António. Este acontecimento foi noticiado pela cidade de Rimini e toda a população apareceu na praia a assistir ao que se passava. Então, vendo que já tinha assistência humana, o frade despediu-se dos peixes e dirigiu-se à multidão dirigindo-lhe palavras que a chamaram aos caminhos da fé cristã.»
Uma nota curiosa deste livro é a vida militar do santo: «Santo António é alistado nas fileiras do 2º Regimento de Infantaria de Lagos. O alvará data de 24 de Janeiro de 1668.» Fica o convite à leitura deste livro tão especial como especial é a figura do Santo que lhe dá o nome.
(Editora: Colares, Capa: Painel de azulejos século XVII Museu de Lisboa, Arranjo gráfico: Sarah Goes, Patrocínio: EGEAC e Museu de Lisboa Santo António)