Uma pequena luz bruxuleante, o Dr. Manuel de Sousa Oliveira

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Na continuação do oportuno e muito esclarecedor artigo da edição anterior, do Dr. Mário Tavares, gostava de fornecer mais alguns dados da vertente cultural e pedagógica do nosso amigo comum, o Dr. Manuel de Sousa Oliveira.
Assim, ver-se-á que a sua ação relacionada com a vinda às Caldas, em Janeiro 1960, da II Exposição de Arte Moderna, é apenas uma (embora relevante, até para as Caldas) das suas múltiplas intervenções no espaço público, sempre animado pelo desiderato de contribuir para a informação e o esclarecimento dos cidadãos, porque aí também se faz oposição aos que pensam que a divulgação cultural pode ofuscar o brilho das elites, de que emanam os que mandam.
No período em que esteve à frente do Museu de Arte e Arqueologia de Viana, (de 1956 até 1967 talvez … não pude confirmar) fez a primeira tentativa de organização do catálogo-guia do espólio do Museu, fazendo imprimir um opúsculo centrado na documentação lapidar. Por terem sido
detetados erros, este não foi posto à venda, por provável decisão do Dr. Sousa Oliveira. É significativo este facto, a verdade científica e só esta deve ser objeto de divulgação.
Paralelamente à sua ação à frente do Museu, participou em várias explorações arqueológicas na região de Viana do Castelo, de que destaco a Cidade Velha de Santa Luzia (cf. “Cidade Velha de Santa Luzia, Viana do Castelo”, in Revista nº 64 (1-2), Janeiro-Junho, por Abel Viana e Sousa Oliveira).
Já nas Caldas, colocado como professor de História na então Escola Industrial e Comercial Rafael Bordalo Pinheiro, antes do 25 de Abril, a sua ação pedagógica manteve a mesma marca de água antes referida, como o comprovam o empenhamento que punha, no espaço de aula, na
promoção de uma educação mais aberta e crítica dos seus alunos, e também no âmbito da escola, de que a criação do Clube de História (referido no artigo anterior do Dr. Mário Tavares) é um exemplo.
Como os seus alunos de então podem testemunhar, o Dr. Sousa não se limitava a seguir o livro oficial como um papagaio: disponibilizava os seus próprios livros aos alunos e trazia jornais para a aula, como instrumentos de trabalho que ajudariam o aluno a apreender melhor os conteúdos dos programas, alargando a sua compreensão cultural simultaneamente.
A sua autoridade na relação com os alunos construía-se através do brilho e paixão que punha na sua exposição das matérias, objeto de admiração daqueles, que não os paralisava porque ao mesmo tempo eles sentiam a sua proximidade ao docente, porque este estava sempre do seu lado, mesmo quando aguardava a sua vez na bicha da cantina, onde ia na fila dos alunos e não a que estava reservada aos professores.
Mesmo quando, com alguma truculência, chamava a atenção aos alunos de alguma ignorância, elas sabiam que isso era como a tremelga socrática que os queria despertar do sono dogmático.
A sua relação com alguns colegas marcou-se por algum distanciamento, porque o posicionamento ideológico funcionava como separador das águas. A que não era alheia alguma prudência, como a suas atitudes de querer sempre a porta da aula fechada (para evitar a intrusão ou escuta do que aí se passava) e de se ocupar habitualmente a ler nos intervalos das aulas.
Estes dados mostram-nos o homem em toda a sua verticalidade: independência de espírito, paixão pela cultura, que se deve preservar do desgaste do tempo porque ela é o alicerce de toda a obra de emancipação cultural e política.
É a esta luz que a sua bibliofilia, a menina dos seus olhos de que falava por vezes apaixonadamente aos seus alunos, toma o seu verdadeiro significado.
Por isso fez a doação do seu espólio à Fundação que tomou o seu nome, em Ponta Delgada.

Vasco Tomás