Sabino Félix é a cara do Chega para o combate eleitoral em Óbidos. O ex-vereador do PS acredita que nada será como dantes na política local
O Chega concorre pela primeira vez em eleições autárquicas, mas o cabeça de lista em Óbidos acredita que o partido pode fazer a diferença num concelho em que a mudança é urgente.
O que o leva a ser candidato pelo Chega, quando há quatro anos integrou as listas do PS? O que mudou no seu posicionamento político?
O meu posicionamento político sempre foi o mesmo: sou de direita, apologista da iniciativa privada e considero que o Estado só deve existir enquanto serviço público para ajudar as pessoas e as empresas. Sempre me identifiquei com a direita democrática. Em 2017, fui convidado para ir nas listas do PS e confesso que não liguei ao partido, mas sim às pessoas, porque conhecia bem o candidato Vítor Rodrigues. Aliado a esse facto, considerava que o PSD já estava na Câmara há tempo a mais. Há nepotismo em Óbidos, o que se explica com as ligações entre partido e autarquia, pelo que decidi participar na candidatura do PS, porque entendia que o concelho não estava a ir na direção certa. Depois, na oposição, entendia que deveríamos apresentar propostas e alternativas de forma construtiva, até para ajudar a quem está no poder. Não foi isso que aconteceu e comecei a deixar de me identificar com o PS, sobretudo a nível nacional. Creio que há um aspeto que ajuda a explicar essa falta de oposição nos últimos quatro anos: o vereador Paulo Gonçalves usou uma estratégia de marketing para se dar a conhecer, utilizando o nome da mulher. O que digo é que quando se está quatro anos como vereador da oposição e ninguém o conhece, creio que está tudo dito…
Quais são as prioridades do Chega para Óbidos?
Temos propostas concretas em várias áreas. Vamos querer começar por organizar a casa, em termos de governança somos um dos piores concelhos do país ao nível da transparência. É preciso gerir os recursos públicos com rigor e reorganizar os serviços da Câmara, para dar boas resposta aos munícipes. A nossa preocupação na constituição da lista não teve em conta a origem geográfica dos candidatos, só com o intuito de ir buscar mais votos, mas sim o percurso de vida das pessoas. É por isso que temos uma médica na lista. Há problemas muito graves em Óbidos ao nível da saúde e a nossa prioridade é garantir cuidados de saúde primários a todos os munícipes. Isso também é dar apoio social. Embora a saúde diga respeito ao Estado, se for necessário, contrataremos um médico, que ficará a prestar serviço através dos Bombeiros ou de uma IPSS, que já têm alguma capacidade instalada. A saúde tem sido descurada. O PS fez a apresentação das candidaturas nas imediações do Centro de Saúde, com a presença do secretário de Estado da Saúde [Lacerda Sales], e não teve uma palavra sobre o estado lastimoso do Centro de Saúde.
O concelho está há duas décadas na mão do PSD. É possível iniciar um novo ciclo?
Nem tudo foi mal feito pelo PSD, mas há prioridades que estão invertidas. Em Óbidos, primeiro preocupam-se com os bilhetes para o cinema e só depois com as necessidades básicas da população. É mais importante a propaganda e os espetáculos do que o essencial, mas não nos podemos esquecer das bases. Uma casa sem bases, mais tarde ou mais cedo, acaba por ruir. E creio que é isso que vai acontecer este ano ao PSD. Nota-se que há muitas pessoas que têm vontade de mudar. Pode não acontecer porque somos um concelho pequeno e um dos maiores empregadores é a Câmara. É impossível dizer que o PSD fez tudo mal em Óbidos, porque esteve lá 20 anos, mas há muita coisa por fazer. E os números demonstram-no.
Refere-se, concretamente, a que números?
Óbidos é um concelho que tem condições únicas. Somos um concelho do litoral, que tem um castelo e uma lagoa, que tem mar, mas, depois, se analisarmos os dados oficiais, verificamos que o índice de jovens e idosos é muito penalizador para o concelho. E o salário médio de um trabalhador em Óbidos é inferior em cerca de 25% à média nacional. Isto é um indicador. Não vale a pena venderem o El Dorado, parece que descobriram a última Coca-Cola do deserto… Olhem para as pessoas. Olhem para fora das muralhas. Há um povo para além das muralhas.
E o que será um bom resultado para o Chega? Entrar no executivo?
Um bom resultado é ganharmos as eleições. Temos um projeto, uma ideia e não nos vamos desviar do nosso rumo.
Há um recorde de candidaturas no concelho. É um sinal de descontentamento da sociedade?
Fez a pergunta e deu a resposta… Há um descontentamento generalizado. As pessoas percebem que não há uma construção de Óbidos, há é uma desconstrução. Não vou dizer que alguns deles não têm construído bem a vida, porque têm uma série de negócios ligados à Câmara, mas e o concelho? Há decisões incompreensíveis, como esta história das dragagens. A Câmara decidiu que os dragados devem ir para o mar, quando se sabe que 20% daquela areia tem metais pesados, que estamos a mandar para o Vau e para a Amoreira. Estamos a correr riscos sem necessidade. A Câmara entendeu que não se deviam depositar as areias na margem sul, onde podiam secar e ser enviadas para as pedreiras, porque há um projeto de aquacultura para ali… Não podemos salvaguardar um projeto de um privado em detrimento de duas freguesias e toda uma série de pessoas que podem ser prejudicadas com isto. É como estarmos em casa, fazermos a limpeza e enviar o lixo para debaixo do tapete.
A habitação é um tema recorrente no concelho…
Sim, porque os jovens não conseguem comprar casa em Óbidos. Há pessoas que estão nas autarquias e não sabem o que um jovem passa hoje em dia, a ganhar 600€ ou 800€ por mês e sem possibilidade de comprar habitação. Queremos criar mecanismos que permitam aos jovens que não têm possibilidade de dar uma entrada para comprar casa que o possam fazer com apoio da autarquia. Apoio direto e indireto. Vamos oferecer parte dos projetos de arquitetura, vender lotes a preços mais reduzidos, dar 15% em materiais e ter bancos parceiros, que permitam, em escala, dar melhores condições a quem construir casa em Óbidos. E se o município tiver de ser avalista desses jovens, que o seja. É engenharia financeira, mas terá de haver limites para os apoios e tudo dentro da lei.
Pegando nessa proposta e centrando a questão nos aspetos ideológicos. O Chega é um partido de extrema direita?
Não. É um partido de direita conservadora. Há coisas que têm a ver com a nossa cultura que devem manter-se. Devemos evoluir enquanto sociedade e temos de aceitar as minorias, mas as regras têm de ser para todos. Não sou radical, não sou racista. Fala-se muito do André Ventura, dos ciganos e dou um exemplo da minha atividade profissional: em cada 100 pessoas de etnia cigana que me contactam a pedir trabalho, 99 dizem que não podem passar recibos verdes, porque têm apoios do Estado… O Estado não funciona.
A situação financeira da Câmara preocupa-o?
Óbidos tem problemas como todas as autarquias têm. A questão financeira tem suscitado dúvidas, porque o município tem apresentado sempre a melhor “fotografia” das contas. Isso é o que qualquer pessoa faz quando publica uma fotografia nas redes sociais. Escolhe sempre as melhores. E, depois, fazem atos de gestão que não são justificáveis, nomeadamente vender edifícios para pagar ordenados. Se temos assim uma tão boa situação financeira, por que razão estamos a pagar tantos juros de mora em empréstimos? Uma das nossas prioridades passa por olhar para as contas e equilibrar as despesas correntes com as receitas correntes. ■
“Temos de pensar em projetos com alcance regional”
Candidato do Chega critica presidentes de Câmara por não discutirem mais iniciativas em conjunto
Sabino Félix defende a instalação do futuro Hospital do Oeste junto ao Parque Tecnológico de Óbidos, mas considera que o assunto deveria merecer um amplo consenso entre os municípios da região.
“Estas questões devem ser discutidas em conjunto e, depois, tomada uma decisão. Não é possível pensar num hospital longe das Caldas, porque é uma centralidade, mas a decisão deve ser tomada em conjunto”, considera o candidato do Chega, que defende a construção de uma nova estação ferroviária no terreno junto ao Parque Tecnológico para servir o hospital.
Sabino Félix admite que uma nova NUT poderá ser “uma das pedras de toque” para desenvolver a região, mas só terá efeitos “se a mentalidade das pessoas se alterar e os municípios falarem entre eles”.
“Tem de haver um plano regional e pensar em projetos com alcance regional, pois todos os municípios podem beneficiar. A OesteCIM tem 300 mil habitantes e a zona de Lisboa tem 3 milhões. Estamos sempre a transferir riqueza para lá, não faz sentido”, frisa o cabeça de lista.
No que diz respeito à promoção do concelho, o candidato sublinha que é favorável à continuidade dos eventos de Óbidos, admitindo que a empresa municipal pode ter um papel relevante no “apoio à economia local”, sobretudo numa das propostas que apresenta: a criação de um cartão municipal com parceiros e fornecedores que dará benefícios a residentes e visitantes, mas também aos produtores locais e às empresas.
O ciclo de entrevistas aos candidatos autárquicos de Caldas da Rainha e Óbidos, levado a cabo nas últimas semanas pela Gazeta das Caldas e a 91FM culmina, tal como determinou o sorteio previamente resultado, na próxima semana com os candidatos do PS aos dois concelhos, Luís Miguel Patacho e Paulo Gonçalves, respetivamente, e Patrícia Silva, candidata do CDS em Óbidos. ■