Câmara das Caldas mantém impostos para 2019, oposição aponta falta de justiça social

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A Assembleia Municipal das Caldas da Rainha aprovou as propostas da Câmara para o IRS, o IMI e a derrama, mas a maioria PSD não se livrou das críticas da oposição, que considera que a política do executivo não tem em conta a justiça social na questão da devolução do imposto sobre os rendimentos.
A sessão do passado dia 30 de Outubro ficou também marcada por divergências em relação ao projecto de investimento para a antiga fábrica da Secla. Enquanto a esquerda quer ver o assunto mais debatido, inclusivamente de forma pública, a direita diz que os empresários que adquiriram o terreno têm um projecto que respeita o PDM daquela área e que as regras não podem ser alteradas a meio do jogo. Também a possibilidade de investimento na Linha do Oeste foi abordada nesta sessão. O PCP salientou que há financiamento comunitário, a 85%, para renovar toda a linha.

 

A Câmara das Caldas vai manter para 2019 a sua política fiscal. Tinta Ferreira, presidente da Câmara, fundamentou a proposta de não alterar a cobrança de impostos em relação ao ano passado “dentro do princípio da estabilidade fiscal”, acrescentando que o este é o município do Oeste “que cobra impostos mais baixos”.
A proposta do executivo mantém o IMI no valor mínimo de 0,30%, e com reduções de 5%, 7,5% e 10%, respectivamente para famílias com um, dois e três, ou mais filhos.
O município mantém uma majoração de 10% para uma lista de 47 edifícios degradados. Tal como no ano passado, este foi um ponto criticado por toda a oposição, não pela medida em si, mas por esta ser uma lista desactualizada e que só tem em consideração edifícios nas freguesias urbanas. Manuel Isaac (CDS/PP) afirmou que esta é “a lei mais injusta que existe”, uma vez que trata de forma diferente os cidadãos de concelho para concelho. Arnaldo Sarroeira (BE) votou contra por entender que deveria haver um tecto a partir do qual as deduções não seriam aplicadas, uma vez que “um edifício com valor patrimonial de 60 mil euros não é a mesma coisa que um de 300 mil”. Já Vítor Fernandes (CDU) absteve-se por entender que as deduções deveriam atender aos rendimentos e não ao número de filhos.
No imposto sobre os rendimentos (IRS), dos 5% a que os municípios têm direito da receita deste imposto cobrado pelo Estado, a Câmara das Caldas continuará a devolver aos munícipes 2%, arrecadando os restantes 3%.
Se no ponto anterior a oposição foi unânime, neste as opiniões dividem-se. Enquanto o PS defende que a autarquia devia ir mais longe e devolver 2,5% aos seus munícipes, a CDU, o BE e o CDS/PP defendem que a autarquia deveria arrecadar os 5% a que tem direito.
Vítor Fernandes (CDU) disse que ao devolver a verba a autarquia está a “beneficiar só alguns, quando a verba podia ser usado para o bem de todos”, acrescentando que a maioria das autarquias do distrito de Leiria fica com a totalidade da verba deste imposto. Arnaldo Sarroeira (BE) afirmou que, ao devolver os 2%, a Câmara está a “deformar a progressividade do imposto aplicado aos cidadãos”.

O CDS/PP vai mais longe na crítica à política da Câmara em relação a este imposto. “Quando a Câmara não precisar de ir à banca, quando tiver dinheiro para obras, então distribua o IRS”, afirmou Manuel Isaac. Duarte Nuno, seu colega de bancada, foi mais longe, tendo relacionado a política de IRS com a de derrama. Na sua opinião, a autarquia caldense “aplica derrama às empresas porque precisa da receita, mas devolve IRS aos mais abastados”.
Os centristas foram os únicos que se opuseram à proposta em relação à derrama, que se mantém em 0,75%. As empresas cujo volume de negócios não ultrapasse os 150 mil euros continuam a beneficiar de isenção. O mesmo tratamento, por um período de três anos, têm as novas empresas que se instalem no concelho e criem pelo menos três postos de trabalho. As que já estejam instaladas no município também têm acesso a isenção deste imposto, por dois anos, se realizarem investimento superior a 1 milhão de euros ou criarem três ou mais postos de trabalho.
Por unanimidade, passou a proposta de Taxa Municipal de Direitos de Passagem a 0,25%.

PROJECTO PARA A SECLA DIVIDE DEPUTADOS

Assunto quente na reunião de 30 de Outubro foi também o projecto existente para o terreno da antiga fábrica Secla 1, ainda no período antes da ordem de trabalho. Vítor Fernandes (CDU) foi o primeiro a pronunciar-se e recomendou que o assunto baixasse à comissão porque “muita gente defende que devia ser ali construído o museu da Secla, ou o alargamento do Museu da Cerâmica”. Além disso, o comunista disse que o projecto não deveria avançar sem discussão pública.
O centrista Manuel Isaac lembrou que há 15 anos houve interesse de um investidor, mas desde então nem a Câmara nem a oposição fizeram algo para impor condicionantes ao investimento naquela zona. O deputado municipal do CDS disse que os promotores do projecto foram à Câmara saber o que podiam e não podiam fazer, e que o projecto só tem que obedecer às regras definidas pelo PDM. E questionou: “Depois disso querem mudar as leis. Andamos a brincar?”.
Manuel Isaac defendeu que deve haver uma “grande discussão para que população saiba o que se passou porque hoje é a Secla, amanhã é outro edifício”, criticando o facto de aquele espaço ter ficado de fora do levantamento dos edifícios históricos a preservar.
Manuel Nunes (PS) também defendeu que o assunto baixasse à comissão. O socialista disse que compreendia as palavras de Manuel Isaac porque o PS está “cansado de perguntar pela revisão do PDM”, assim como por outros documentos estruturantes para o concelho, como a Carta Educativa, o Plano de Igualdade de Género, o Plano da Zona Industrial dos Vidais, da frente marítima e lagunar da Foz do Arelho, ou os planos de pormenor do Nadadouro e da Foz Arelho.
Alberto Pereira (PSD) disse também concordar com Manuel Isaac quanto à preservação, mas disse que a Câmara impôs condições para isso “à luz do PDM e do bom senso”. Quanto à questão do alargamento do Museu da Cerâmica, disse que “o dinheiro não abunda e o que há a fazer é concentrar recursos para ter bom museu”.
Tinta Ferreira disse que há projectos para recuperar a Secla 2 e que, em relação à Secla 1, o comprador analisou o que podia fazer. Por isso, o presidente da Câmara acrescenta que não sabe o que se pode fazer para alterar um projecto que lhe pareceu “uma óptima forma de reabilitar aquela zona”, com um hotel de três estrelas com cerca de 100 quartos, um restaurante, uma unidade comercial e espaço público requalificado.
O edil caldense disse que a informação prévia está válida e o executivo não a pode indeferir, “a não ser que queiram indemnizar o proprietário e eu não estou disponível para isso!”.
Além disso, acrescentou que há o compromisso do promotor do projecto em relação à memória da Secla, “com os quais seremos intransigentes”. Estes compromissos consistem na manutenção de um pórtico de entrada com as letras Secla, a preservação de uma pintura de Hansi Stael, o restaurante terá uma sala Secla, com peças da própria unidade industrial. Há ainda a possibilidade de o hotel ser parcialmente revestido com peças feitas com moldes da Secla, que são propriedade do município. O hotel e o hipermercado terá também peças relacionadas com a fábrica.
Tinta Ferreira disse ainda que o projecto do hotel está aprovado e que o do supermercado já deu entrada na Câmara e a resposta não pode ser demorada, dado que “há prazos a cumprir”.

RESÍDUOS URBANOS PODEM PASSAR A SER PAGOS

Durante a sessão, Tinta Ferreira anunciou que a Valorsul poderá estar a preparar-se para aumentar “significativamente” aos municípios o custo do depósito dos resíduos sólidos urbanos, o que para as Caldas pode significar um aumento de despesa entre 0,8 milhões e 1,4 milhões de euros. Tinta Ferreira lembrou que as Caldas é um dos oito concelhos do país que ainda não cobra os resíduos urbanos aos seus munícipes. No entanto, caso o cenário de aumentos se torne efectivo, deixará de ter condições para manter essa isenção.
O debate sobre esta matéria com os deputados da oposição centrou-se em alternativas. Manuel Isaac (CDS/PP) sugeriu que o assunto fosse discutido no seio da OesteCIM, no sentido de se pensar um projecto que aproveitasse todos os resíduos domésticos orgânicos para produzir biogás, que poderia depois ser vendido aos agricultores. O seu colega de bancada, Duarte Nuno, defendeu uma posição que é habitualmente apanágio da esquerda – os serviços como a água, a energia e a recolha de lixo “não deveriam ser concessionados, por serem estratégicos”. O deputado realçou que o saneamento básico já significa perto de metade da facturas da água e quis saber quanto irá custar aos munícipes o aumento relativo à recolha de resíduos sólidos urbanos. Tinta Ferreira respondeu que tendo por base os valores actuais, cada caldense pagaria em média três euros a mais na actual factura da água.
Arnaldo Sarroeira (BE) sugeriu que se pensasse na recolha porta a porta nas zonas da reabilitação urbana, para reduzir o quantidade de lixo que vai parar ao aterros. José Filipe (PS) sugeriu que pensassem em estratégias, como campanhas de prevenção para evitar que o lixo chegue ao aterro.
O deputado Alberto Pereira (PSD), que foi no mandato anterior vereador da educação, disse que já existem campanhas de sensibilização nas escolas. Tinta Ferreira acrescentou que as juntas de freguesia também estão a fazer trabalho desse âmbito, com um programa de pequenas centrais de compostagem acompanhadas de acções de formação. O presidente da Câmara disse ainda que o concelho está em sétimo lugar entre os 20 concelhos que a Valorsul serve em recolha selectiva, mas admitiu que reduzir a tonelagem de resíduos seria uma forma de conter o aumento dessa despesa.

GEMINAÇÃO COM DERUTA (POUCO) CONSENSUAL

Os deputados municipais aprovaram por unanimidade a proposta de geminação com Deruta, cidade italiana situada na região da Umbria e com forte tradição cerâmica.
A vereadora Maria Conceição Pereira explicou que a iniciativa partiu da autarquia de Deruta, que manifestou vontade de se geminar com outra localidade numa reunião em que estava presente a Associação Portuguesa de Cidades e Vilas de Cerâmica. A ligação entre Caldas e Deruta foi proporcionada pelo director executivo daquela associação (e director da Gazeta das Caldas), José Luiz Almeida e Silva.
Maria Conceição Pereira explicou que esta é uma das principais cidades italianas em produção cerâmica majólica (faiança italiana pintada com motivos decorativos). “É das cidades italianas mais referenciadas na cerâmica pela sua qualidade e número de espaços de venda, é uma exposição permanente e tem muito activade nas suas ruas”, explicou a vereadora. Deruta tem ainda um grande museu de cerâmica, fundado em 1898, que conta com cerca de 6000 peças, e foi desta cidade que o Papa Francisco levou uma peça na visita oficial que fez ao Brasil.
Maria da Conceição Pereira realçou que a proposta de geminação não está ainda finalizada e terá que ser agora trabalhada após a aprovação na Assembleia Municipal, de modo a poder-se aproveitar os fundos comunitários que vão estar disponíveis a partir de Março do próximo ano. A vereadora disse que serão realizadas diversas iniciativas no âmbito da cerâmica, nomeadamente actividades e trocas de experiência envolvendo jovens estudantes e ceramistas.
No entanto, também este assunto não foi tão consensual como a votação indica.
Em causa esteve a política de geminações e de relações internacionais da autarquia, contestada por Joana Agostinho (PS) e Duarte Nuno (CDS/PP).
A deputada socialista disse que, ao longo dos últimos quatro anos, já se perderam fundos europeus “que podiam ajudar a ter geminações mais eficazes, com outras cidades com interesses idênticos ou complementares aos nossos”. No entanto, só agora a autarquia está a avançar para um projecto deste género, “e foi preciso alguém de fora contactar-nos”, lamentou.
Duarte Nuno criticou a forma “pouco profissional”, como o assunto chegou à Assembleia Municipal, reclamando uma apresentação mais profunda e cuidada. Lamentou que não tenha sido feita pelo município uma pesquisa para perceber se haveria outras cidades na Europa com as quais fizesse mais sentido uma geminação. “À falta de melhor ideia, vou apoiar, tenho pena que não haja mais opções e que não se tenha estudado melhor o assunto”, concluiu.

LINHA DO OESTE

Vítor Fernandes (CDU) disse na Assembleia Municipal que o PCP dirigiu à Comissão Europeia uma pergunta acerca dos investimentos que estariam disponíveis para a Linha do Oeste, e que obteve como repostas que há possibilidade de fundos comunitários com 85% de financiamento para toda a extensão da linha. O comunista acrescentou que “esta é uma oportunidade que não devíamos desperdiçar”.
Tinta Ferreira completou a informação dizendo que houve uma reunião da OesteCIM com a Secretaria de Estado dos Transportes e a CP, na qual terá sido estabelecido Janeiro do próximo ano como prazo para o lançamento do concurso púbico para a obra de reabilitação e electrificação da linha até às Caldas, e também do concurso público para a execução do projecto a Norte, até ao Louriçal. “Já é um bom sinal haver disponibilidade para gastar dinheiro no projecto, que é caro”, acrescentou.

SEM TRANSFERÊNCIA DE COMPETÊNCIAS PARA 2019

O executivo deu conhecimento à Assembleia Municipal que não aceitou receber do Estado central quaisquer delegações de competências para 2019, “porque não são dadas a conhecer contrapartidas financeiras”, disse o presidente Tinta Ferreira. Este é um assunto que voltará ainda no primeiro trimestre do próximo ano, mas apenas no que diz respeito às transferências de competências na Educação, que terão prazo de decisão até 31 de Março para o ano lectivo 2019/20.
Vítor Fernandes (CDU) concordou com a decisão da Câmara e propôs que a Assembleia Municipal a apoiasse, o que foi aprovado por unanimidade. No entanto, Manuel Nunes (PS) defendeu que o assunto fosse analisado em comissão.
Duarte Nuno disse que o CDS/PP está de acordo com a descentralização, mas não concorda com a forma como está a ser feita, uma vez que pode funcionar como “um joguete” para beneficiar autarquias da mesma cor do governo.
Os deputados municipais tiveram ainda acesso à minuta de protocolo que vai permitir à autarquia apoiar dois atletas caldenses que têm conseguido resultados de relevo a nível nacional e internacional, nomeadamente João Pereira, no triatlo, e Patrícia Carmo, na dança desportiva. Os protocolos envolverão também, respectivamente, a Federação Portuguesa de Triatlo e a Sociedade Filarmónica Alunos de Apolo.
Tinta Ferreira disse que se trata de uma aposta do município pelas perspectivas de “resultados relevantíssimos”. Os acordos prevêem a realização de acções destes atletas junto das escolas do concelho e foram aprovados por unanimidade na Assembleia Municipal.