
O ministro Mário Centeno para quem Zé Povinho foi duro em 2016, deve estar ultimamente a sorrir ao ver que finalmente encontra um pouco de sossego, depois de meses de suplício com a crise que criou com as negociações para a constituição da administração da CGD e com as regalias que quis oferecer ao Dr. António Domingues.
Ao fim e ao cabo, indirectamente, quis facilitar-lhe a vida, para lhes esconder rendimentos e património, mas o Dr. Domingues, ingrato, quando se descobriu que havia legislação que o impedia, deu o dito por não dito e acabou por lhe apresentar uma factura elevada, que quase lhe custou o lugar.
A falácia dos “erros de percepção mútua” são o que o povo chama uma desculpa de mau pagador, mas certamente por pudor ou vergonha nunca falaram em concreto o que um queria esconder e o que outro se dispunha a autorizar, e no final ficou o pobre Mário Centeno (um professor genuíno que não domina os contornos da alta política) a penar.
Ficou também prejudicado com esta polémica, que ofuscou os louros do seu recorde no défice de 2,1% no final de 2016, o valor mais baixo da democracia portuguesa desde 1974, bem como da criação de emprego, que para os teóricos só era cientificamente possível com crescimentos no PIB acima dos 2%.
Zé Povinho quer desta vez realçar as crenças e os dotes do ministro Centeno e desculpar-lhe as mais que prováveis incongruências nas suas decisões sobre a administração da CGD. Afinal a saída do procedimento dos défices excessivos da União Europeia é obra e foi necessária muita competência técnica (e alguma sorte) para conseguir o que outros não obtiveram à custa dos métodos mais fáceis como o de cortar rendimentos a quem não pode fugir para os paraísos fiscais.



No meio destas tempestades que caíram sobre o Ministro Centeno eis senão quando descobriu lá nas catacumbas do seu ministério que durante quatro anos o anterior governo do seu arqui-inimigo Passos Coelho escondeu os dados estatísticos sobre as transferências de capitais para as offshores, que totalizaram nesse período mais de 10 mil milhões de euros.
Este presente que serviu de bandeja ao seu primeiro, foi a pesada arma de arremesso no debate parlamentar da passada semana, ainda antes do ex-secretário de Estado Paulo Núncio, do CDS, ter assumido a responsabilidade do problemático “esquecimento” devido a um também erro de “percepção mútua” com os funcionários superiores da Autoridade Fiscal.
Ignorando o que Paulo Núncio iria dizer dias depois, o ex primeiro-ministro Passos Coelho fez uma cena de virgem ofendida no Parlamento para impressionar, tendo posto a viola no saco com aquela confissão.
Falta ainda saber a posição da ministra das Finanças da época, a inevitável e inefável Maria Luís Albuquerque que, provavelmente, como aconteceu com as swaps, virá dizer que não sabia nem tem nada a ver com o assunto.
Afinal aqueles que consideravam que os portugueses andavam a viver acima das suas possibilidades, não tiveram o mínimo sobressalto com a omissão dos envios de dinheiro criado no país para os paraísos fiscais. Estes milhares de milhões, mais os milhares de milhões desaparecidos no BES, PPN, BANIF, BPP, para não falar nas imparidades da CGD e de outros bancos do sistema, são bem a prova para Passos Coelho, Maria Luisa Albuquerque e Paulo Núncio, da insensatez da sua estratégia e especialmente do seu discurso acusador com aqueles que ganham pouco.