O funcionamento das instituições europeias é algo que parece complexo, mas, depois de visitarmos a capital da Europa percebe-se que, na verdade, é algo bastante simples: a democracia a funcionar.
Isaque Vicente, em Bruxelas
Uma comitiva de autarcas do concelho do Bombarral e jornalistas da região foi convidada pela eurodeputada socialista Margarida Marques para visitar, na semana passada, o Parlamento Europeu e conhecer melhor o funcionamento das instituições europeias.
Numa viagem de dois dias até à capital da Europa, foi possível perceber que, afinal, embora possa parecer algo complexo, Bruxelas é algo muito simples: trata-se tão e somente da democracia a trabalhar.
O grupo visitou o Parlamento Europeu, onde os 705 eurodeputados (entre os quais, 21 portugueses) decidem. Uma curiosidade: o hemiciclo do Parlamento Europeu na Bélgica (que adotou um modelo híbrido entre o francês e o alemão) não tem 705 lugares. São 857 cadeiras! Os 705 eurodeputados (entre os quais 61 caras novas, comparativamente com o último mandato) pertencem a sete famílias políticas que representam quase duas centenas de partidos políticos nacionais.
O Parlamento tem cerca de oito mil funcionários e os custos linguísticos para que cada deputado se possa expressar na sua própria língua representam um décimo do orçamento.
No Parlamento Europeu a igualdade de género é uma meta que ainda não foi atingida. Atualmente, entre os 705 eurodeputados, 41% são mulheres.
Num discurso à margem da visita, a socialista Margarida Marques referiu-se a um caso de desigualdade em relação ao género feminino em pleno século XXI que foi votado em Parlamento.
“Na semana passada aprovámos no Parlamento Europeu uma proposta que obriga a que os Conselhos de Administração das empresas cotadas em bolsa tenham que ter uma quota de mulheres, uma proposta feita há dez anos, levou dez anos a ser votada. Não é a burocracia de Bruxelas que leva a que demore dez anos!”, exclamou. “É a vontade política. Se houver vontade política e urgência, conseguimos tomar decisões nos tempos necessários”, defende, salientando que não quer “dizer que não há burocracia”, mas é a vontade “que é fundamental para que as decisões possam avançar”.
A resposta à pandemia de Covid-19 ou à guerra na Ucrânia são exemplos. “Aprovámos um instrumento que nunca tinha existido, pela primeira vez na resposta europeia à covid foi criada dívida europeia, que é um passo de gigante na UE e foi sempre recusado no passado”, salientou a bombarralense.
Uma Europa mais… europeia
Margarida Marques considera que “a resposta que a UE deu à crise de 2011 foi significativamente diferente da que deu à covid” e que “na anterior aumentou a disparidade entre os Estados membros”, que nos mercados tinham taxas de juro diferentes. Já na resposta à Covid-19, com o fundo Next Generation EU, a Comissão Europeia emite dívida e vai aos mercados em nome dos 27 estados membros com um rating de triple A (AAA), ou seja, em condições altamente favoráveis. “Tem sido um sucesso, cada vez que há emissão de dívida a procura é entre 10 a 13 vezes superior à oferta, o que revela bem a credibilidade da UE”, refere. “Aprendemos com os erros da resposta à crise em 2011 e com a covid a UE teve um comportamento diferente, mais europeu, mais de solidariedade de facto e não apenas de palavra”.
Atualmente, o desafio é tornar permanentes estes mecanismos que foram criados. “Sabemos que quando foi criado o Next Generation EU, era uma vez e limitado no tempo”, admitiu Margarida Marques, defendendo no entanto que “as lições que aprendemos permitem criar um mecanismo permanente, que possa apoiar na transição climática e na transição digital e evitar que estas transições, que têm que ser feitas, criem uma maior fragmentação entre os estados membros”.
Sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia, a eurodeputada disse que “viola a lei internacional e, além do impacto que tem na Ucrânia, põe em causa os direitos, os princípios e valores europeus” e destacou a importância de, além de criar propostas para financiar a Ucrânia, apresentar iniciativas que possam mitigar os efeitos da guerra na Europa.
O Bombarral na Europa
O grupo foi convidado pela eurodeputada ao abrigo de um programa de visitas que permite a cada deputado convidar 100 pessoas por ano para conhecerem o funcionamento das instituições europeias. “O primeiro grupo de visitantes que trouxe a Bruxelas foi da zona do Oeste, mal fui eleita, em 2019, penso que em novembro”, contou. Depois vieram dois anos de pandemia, sem visitas à capital da Europa. Seguiu-se um convite aos alunos da escola Fernão do Pó. “Como este ano é o Ano Europeu da Juventude, organizámos um evento, todo o grupo socialista, com nove deputados, em que cada um trouxe 22 jovens e depois fizemos um evento com os nove grupos”. Essa iniciativa permitiu que os nove grupos formulassem propostas políticas, que depois foram apresentadas à presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola. Posteriormente, num debate no Parlamento Europeu sobre o Ano Europeu da Juventude, Margarida Marques e dois eurodeputados jovens, Sara Cerdas e João Albuquerque, abordaram essas mesmas propostas. “É um exemplo de um programa de visitas, em que nos esforçamos para dar continuidade às propostas, e não apenas ser só mais uma viagem a Bruxelas”, partilhou.
Para o Oeste, a visita traz uma maior proximidade entre os membros da comitiva e as instituições europeias e uma perceção do seu laborar, das suas políticas e dos seus valores. “A União Europeia é mais que um banco que distribui fundos!”, sublinhou. “Também não desvalorizo a dimensão da sociabilidade. É simpático e engraçado, creio que em nenhuma Assembleia Municipal, onde vou regularmente, achei que havia um ambiente tão positivo como aqui”, brincou.
A voz das regiões em Bruxelas
Não foi, portanto, por acaso que antes visitámos o Comité das Regiões, que nasce em 1994 precisamente para afastar a ideia da distância entre uma Europa elitista e os cidadãos europeus. Representa, como o nome indica, as autoridades locais e regionais europeias nas instituições europeias e é um órgão consultivo.
Os seus 329 membros são eleitos numa eleição indireta, segundo a representação demográfica, sendo designados pelos estados membros. No caso de Portugal são 12 membros.
O grupo foi recebido pelo presidente do Comité das Regiões, o português Vasco Cordeiro, que falou das “circunstâncias que estamos a viver em toda a Europa, que estão relacionadas com os efeitos de uma guerra em que todos estamos envolvidos, não é apenas da Ucrânia e da Rússia, é uma guerra que toca a todos os que defendem e promovem um conjunto de princípios que nos são caros”.
No final do dia, uma visita à Casa da História Europeia. Trata-se de um museu interativo, com seis andares de objetos e estórias, de memórias comuns de momentos que marcaram o percurso do continente europeu.
Prenda de Natal para o leitor
E não pense, caro leitor, que a Gazeta das Caldas foi a Bruxelas pela altura dos tão tradicionais mercados de Natal e não trouxe aos seus leitores uma prenda: vá às nossas redes sociais que trouxemos-lhes imagens de alguns momentos do espetáculo de videomapping de Natal que encontrámos na Grand Place de Bruxelas no final do primeiro de dois intensos dias!