Na aldeia de Casal dos Ramos, a meio caminho entre as Caldas da Rainha e Alcobaça, existe o Espaço Lirium – Harmonia Natural e Sustentabilidade, um projecto de cultivo e partilha de conhecimento na área da jardinagem e agricultura, em comunhão com a natureza. Esta propriedade, que tem perto de um hectare, poderá dar lugar a um ecocampismo e a acolher visitas de estudo, onde os mais novos tomarão contacto com toda aquela biodiversidade.
As plantas, sobretudo aromáticas e produzidas de forma biológica, são comercializadas na Praça da Fruta das Caldas.
Neste espaço não entram pesticidas e toda a produção é feita de modo biológico. Em perto de um hectare de terra convivem todo o género de plantas, desde as hortícolas às aromáticas, passando pelas espontâneas, com árvores de fruto pelo meio. “Há uma desordem natural nas coisas, um caos organizado”, conta Ricardo Ferreira, explicando que algumas das plantas são colocadas em locais estratégicos pois têm a função de repelentes ou atractivos de insectos.
A planta do funcho, por exemplo, não deve estar junto das outras culturas. Deve estar na horta, mas nas suas bordaduras, e assume funções de repelente de roedores (afasta os ratos) ou, aquando da floração, atrai insectos úteis para a polonização. Já o absinto é uma das plantas mais usadas na agricultura biológica e permacultura para atrair pragas para si e depois eliminá-las. No entanto, também esta planta não é compatível com outras culturas, devendo estar separada delas.
Quando os insectos atacam, Ricardo Ferreira usa chorumes e efusões para os afastar e assim proteger a sua plantação.
Os pomares são essencialmente compostos por pereiras e macieiras regionais. Algumas delas são variedades muito antigas e praticamente esquecidas, que o agricultor tenta recuperar. “São árvores do tempo dos nossos avós”, conta, acrescentando que tem exemplares regionais desde o Algarve a Trás-os-Montes, que comercializa a pessoas também interessadas neste conceito.
O “mundo” das plantas aromáticas
Licenciado em Ciências do Ambiente, Ricardo Ferreira sempre teve um fascínio especial pela natureza. As suas férias em criança eram passadas nos parques naturais. No entanto, este contacto mais directo com o trabalho na terra surgiu há cerca de oito anos quando construiu a sua casa e ajardinou parte do terreno. Depois foi estudando mais sobre algumas filosofias e conceitos ligados à terra, como a permacultura (estratégia de planeamento da produção, aproveitando as condições e os recursos naturais locais da melhor maneira possível), a biodinâmica e a agricultura natural.
Foi alargando o local de cultivo e começou a focar-se mais nas plantas aromáticas, mas sem a intensão de comercializar. No entanto, a produção foi superior às suas expectativas e começou a vender as aromáticas em feirinhas de artesanato, até que conheceu David Barros, que produz germinados (rebentos de plantas) e que o convidou a experimentar vender na Praça da Fruta. A estreia foi há perto de cinco anos e desde então nunca mais deixou aquele mercado. Como trabalha durante a semana numa empresa de derivados de madeira, reserva os sábados para a venda das suas plantas aromáticas, e também de algumas árvores, sobretudo da flora autóctone.
Só de plantas aromáticas, Ricardo Ferreira tem cerca de 300 variedades. As mais procuradas são o tomilho, o cebolinho e o alecrim e, em certas alturas do ano, também a salsa e os coentros. Mas também há outras, mais desconhecidas e não menos estranhas, como é o caso da planta cogumelo, que tem um sabor muito semelhante ao do próprio fungo.
Na sua banca é possível encontrar o nome junto da cada espécie, permitindo assim às pessoas saber do que se trata. Para além disso, o vendedor também explica quais as utilizações que cada uma delas permite. Há quem chegue junto dele a pedir uma planta aromática para condimentar determinado prato, outros a querer uma cura medicinal ou ainda quem apareça com esquemas de jardins ou floreiras verticais para ornamentar a casa.
“Há pessoas que não sabem cuidar das plantas ou é a sua primeira experiência nesse campo”, revela, acrescentando que também disponibiliza informações no seu blog liriumaromaticas.blogspot.pt e no facebook (facebook.com/liriumplantasaromaticas) para que possam ter mais autonomia nos cuidados a prestar.
São pessoas dos 30 aos 50 anos as que mais investem em plantas aromáticas e, sobretudo, para usar na cozinha. Mas os mais novos também já começam a revelar curiosidade neste tipo de plantas, nomeadamente nas suas múltiplas funções, como é o seu uso medicinal ou mesmo esotérico, acrescenta o vendedor, dando nota das preocupações destes jovens (muitos deles estudantes da ESAD) com a natureza e culturas alternativas.
Visitas guiadas e oficinas para escolas
- Plantas de diversas espécies e variedades coabitam de forma harmoniosa nesta propriedade |Fátima Ferreira
Ricardo Ferreira dinamiza outras actividades ligadas à natureza, como é o caso das saídas de campo para identificação de plantas silvestres comestíveis. Estas realizam-se sobretudo na região Oeste e têm como cenário os locais mais desconhecidos do Parque Natural da Serra de Aire e dos Candeeiros, Planalto de Santo António, Valado dos Frades ou Mata Nacional do Vimeiro.
A próxima irá decorrer a 21 de Maio e será uma visita ao “bosque encantado” da Encosta do Sidral em Fervença (Alcobaça), onde os participantes poderão aprender a identificar árvores, arbustos, plantas aromáticas e espontâneas comestíveis.
“As visitas são interessantes porque encontramos uma diversidade da qual não nos apercebemos quando por lá passamos sem dar a devida atenção”, diz, especificando que os participantes são sobretudo pessoas da região, mas também oriundos da cidade e que têm curiosidade pelas plantas.
Também promove workshops e, no futuro, pretende continuar a investir no Espaço Lirium, de modo a permitir ali criar um ecocampismo e também dinamizar oficinas e visitas para escolas. “É uma quinta não formal, mas com muita biodiversidade”, remata.
Ricardo Ferreira também executa hortas e jardins e dá apoio técnico e de consultoria em projectos de permacultura e agricultura biológica.