Editorial – As termas são para fechar ou potenciar?

1
496

Enquanto que em Portugal a saúde parece ser tratada mais como um fenómeno económico-financeiro e menos como um assunto social e humano, os tratamentos termais, para além das iniciativas tomadas por alguns grupos privados, é para o Estado um assunto arrumado, ou seja, tem valor zero.
Veja-se a forma como estão a ser tratadas as termas caldenses, propriedade do próprio Estado e fundadas por uma rainha no século XV, que tiveram o seu apogeu e que nos últimos 50 anos têm vindo a decair até quase ao abandono, que é actualmente proposto.
Noutros países, especialmente nos mais desenvolvidos, o tema é encarado de outra forma e visto de forma estratégica e pró-activa, não só para ajudar a curar ou evitar algumas doenças, como de uma forma mais inteligente, para a prevenção das consequências que o actual ritmo de vida provoca na qualidade de vida das pessoas.
Apesar da esperança de vida ter aumentado fortemente no último século, só é interessante para o ser humano viver mais anos se tiver a necessária e desejável qualidade e condições de vida com autonomia, bem estar e um certo grau de felicidade.
Os Estados preocupam-se cada vez mais com o funcionamento dos seus sistemas de cuidados de saúde e de segurança social, que, para além de serem cada vez mais custosas em termos financeiros (graças às crescentes inovações), permitem às pessoas viverem mais anos e desfrutarem de alguma compensação pelos anos de trabalho que tiveram ao longo da vida.
Por coincidência, neste preciso momento em França ocorrem simultaneamente dois acontecimentos que dão nota de algum interesse para estes temas, de uma forma irónica.
Por um lado, estreou há dias neste país uma comédia cinematográfica intitulada “Mince Alors!” que brinca com a “ditadura da linha” resultante da vontade de muitas gente mudar a sua imagem de obesidade. O filme, realizado por Charlotte de Turckheim, com Victoria Abril, Lola Dewaere, Catherine Hosmalin, como cabeças de cartaz, tenta demonstrar de forma animada as curas de emagrecimento que podem ser realizadas em tratamentos termais, tendo utilizado como cenário as Thermes de Brides-les-Bains, e mesmo alguns dos banhistas que as frequentam como figurantes do filme, o que dá uma certa actualidade ao tema.
Ao mesmo tempo, foram conhecidos os resultados de um estudo científico da responsabilidade dos professores Thierry Hanh e Patrick Serog, sobre os tratamentos termais para o combate ao peso excessivo e à obesidade, que é hoje uma doença que atinge uma parte importante da população mundial e causa de muitas outras doenças de outras origens, de todos os outros sistemas que compõem o corpo humano.
Estes cientistas utilizaram como observatório os utilizadores das termas de Brides-les-Bains, Capvern-les-Bains, Vals-les-Bains, Vichy e Vittel, tendo comparado os resultados dos programas de combate à obesidade nestes estabelecimentos com outros que seguem programas apenas de mudança do estilo de vida e apoio medicamentoso.
Foram acompanhados cerca de 250 pessoas, com uma idade média de 51 anos e um índice de massa corporal em torno dos 31,2Kg/m2.
O grupo que frequentou as termas seguiu os tratamentos de cura de ingestão de líquidos, banho de água termal, cobertura de lama termal, massagem sob aplicação de água mineral, exercícios na piscina e conselhos dietéticos. Além disso, seguiu um programa de actividades físicas não obrigatórias e podiam seguir um regime dietético durante o período dos tratamentos termais.
O outro grupo seguia apenas um regime de dieta. Os resultados foram claros em favor do regime termal. O primeiro grupo teve uma perda de peso de 3,86 kg e uma redução de 1,44Kg/m2 de massa muscular, enquanto que o segundo grupo, sem termas, teve apenas uma perda de peso de 1,56 kg. e de massa muscular de 0,60Kg/m2.
Segundo os especialistas franceses, uma “ruptura com o quotidiano e uma ajuda psicológica” permitida pelas termas é um factor determinante, assim como o facto de se gerar um “círculo virtuoso” em que o “aquista pode melhorar as suas doenças associadas à obesidade(como dores osteo-articulares, diabetes, etc.) e reduzir os seus consumos de medicamentos”. Ainda acrescentam que para muitos “um tratamento termal anual permite dar continuidade a estas melhorias no longo prazo”, para além  e não “haver nenhum efeito secundário indesejável”.
É evidente que este estudo também se destinou a justificar o financiamento pela Segurança Social francesa dos tratamentos termais de mais de meio milhão de pessoas todos os anos (com cerca de 30% por ano de novos aquistas), nas 104 estações balneares em actividade existentes em França.
Este país possui o primeiro património hidromineral europeu, detendo algumas das mais importantes e mais conhecidas  estâncias do mundo, produzindo um volume de negócios anual de 850 milhões de euros com um PIB termal de 450 milhões de euros, envolvendo mais de 100 mil empregos directos, indirectos e induzidos.
Um país que quer reforçar o seu PIB, melhorar a qualidade de vida dos seus nacionais e diminuir o seu défice com o estrangeiro, não pode encarar este tema de forma tão displicente e pouco cuidada.
O ministro da saúde, que é mais um perito económico do que da saúde, mais facilmente devia compreender estes números e estas questões. Talvez assoberbado com a crise financeira do sistema e incapaz de ter uma visão anti-sistémica destes problemas, fica insensível a esta discussão e Caldas da Rainha não é capaz de inverter este discurso e esta forma de ver o problema da saúde.

1 COMENTÁRIO

  1. O problema das termas é que a Medicina em Portugal é curativa, luta-se contra qualquer coisa, que é o que dá lucro à industria e aos profissionais livres. Prevenir não dá lucro aos privados, por isso o Estado não investe na prevenção e os tratamentos termais são curativos mas essencialmente preventivos