Os dicionários e as gramáticas colocadas em cima da mesa dão a perceber que se trata de uma aula de português, mas ao entrar é o inglês ou o alemão que reina na conversa entre os alunos. Porém, isso só acontece minutos antes de começar mais uma aula de Português para estrangeiros, que têm decorrido na Escola Josefa de Óbidos nos últimos dois anos e que reúne cerca de uma dezena de atentos alunos, oriundos sobretudo da Holanda, Alemanha e Inglaterra.
As aulas terminaram na segunda semana de Julho e, no final, todos eles falavam português, como foi atestado pela Gazeta das Caldas.
A turma é o orgulho de qualquer professor. São atentos, trabalhadores e querem aprender sempre mais, nas palavras de Helena Martins, a professora que começou a leccionar Português para estrangeiros no ano passado e diz ter encontrado a sua vocação.
São habitualmente uma dezena de alunos, todos eles holandeses, ingleses, irlandeses e alemães, a maioria aposentados. Na vida activa contam-se duas formandas ucranianas que, por trabalharem, faltavam muitas vezes às aulas que se realizavam às terças e quintas-feiras ao final da tarde.
No entanto, e de acordo com a professora, os ucranianos aprendem com muita facilidade a língua portuguesa porque a sua fonologia é semelhante. Por outro lado, os imigrantes ingleses têm muito mais facilidade em fazer-se entender uma vez que a grande maioria dos portugueses fala inglês.
Os tempos verbais constituem a maior dificuldade dos alunos. Louise Reed, de 40 anos, deixou Londres há 10 meses para vir morar para o Bom Sucesso, juntamente com as filhas e o marido, que dirige através do computador a empresa de mergulho que tem em Inglaterra.
Diz que aprender português é difícil, mas “devagar vou aprendendo”, ao contrário do seu marido que, por enquanto, apenas diz “bom dia” ou “boa tarde” na língua de Camões. As filhas estudam na escola do Vau e, em casa, já começam a falar português.
A adaptação da família Reed foi fácil, até porque, como explica Louise, no supermercado ou outro local a que vá, quando tenta falar português, os funcionários dizem que pode falar em inglês pois percebem-na.
Apenas há sete meses em Portugal, o holandês Adrianus de Leeuw já fala correctamente o português. Para isso contribuiu o pouco tempo que viveu no Brasil, há 50 anos.
Agora, com 62, reformado e a residir em A-dos-Francos – para onde se mudou definitivamente – o holandês quer aprofundar os seus conhecimentos e, por isso, frequenta o curso em Óbidos, juntamente com a sua esposa.
“Tenho que aprender português para falar com as pessoas”, diz, acrescentando que apesar de não ter sentido grandes dificuldades de comunicação, estranha a “espécie de dialecto” que encontra na vila onde reside. “Se falarem lentamente eu compreendo”, explica. Mas a verdade é que o seu português está muito melhor desde que frequenta as aulas e, por isso, quer continuar os estudos de Português.
Martin de Borst, 64 anos, também veio da Holanda e reside na Usseira desde Maio de 2006. Decidiu frequentar o curso de Português para estrangeiros, juntamente com a esposa, porque acha necessário “falar português para participar na vida dos portugueses”. Conta que na Holanda a vida está mais difícil. “Portugal está cerca de 20 anos atrasado em relação à Holanda, tudo é mais calmo”, refere, destacando que naquele país do norte da Europa, especialmente na zona poente, a vida é muito agitada. Além disso, a temperatura mais amena que encontrou neste país encantou o agora reformado técnico de marketing numa multinacional, que descobriu Portugal em 2004. E porque a vontade de aprender português é grande, o casal tem também uma professora que lhes vai dar aulas a casa, uma hora por semana. Martin de Borst já lê em português, como o atesta o livro “O coração do mundo”, que tinha em cima da secretária, mas considera que a verdadeira dificuldade da língua reside na oralidade.
No dia em que a Gazeta das Caldas acompanhou a aula, o tema era “As desigualdades entre sexos”, que motivou uma grande participação e discussão sobre as tarefas que são feitas por homens ou mulheres.
Os tempos verbais e a pronúncia são as maiores dificuldades
De acordo com a professora, este ano lectivo [que terminou há duas semanas] foi um pouco mais difícil do que o anterior porque grande parte dos alunos que já tinham iniciado quiseram continuar e foi necessário juntar na mesma turma os iniciantes. “Foi muito trabalhoso”, conta Helena Martins, que para solucionar esta diferença de conhecimentos, por vezes juntou-os em grupos e fomentou actividades que impliquem a pronúncia, leitura e aquisição de vocabulário relacionado com actividades do quotidiano. “Interessa a todos e acabam por apreciar a aula e participar”, disse.
Nas aulas os alunos começaram por aprender o abecedário, a forma como as letras se pronunciam e os sons abertos e fechados “porque aí residem as grandes dificuldades”.
Mas a motivação dos alunos acaba por facilitar a aprendizagem. “Eles são empenhadíssimos, fazem mais trabalhos de casa do que eu peço e colocam imensas questões”, refere a docente, destacando que também ela tem vivido uma grande experiência. “Por vezes tenho que recorrer ao inglês para que percebam o funcionamento da nossa língua”, diz Helena Martins, contente por também poder evoluir no seu inglês, praticando a oralidade e aprendendo expressões que não vêm nos livros.
Isabel Araújo, assessora da direcção do Agrupamento para Educação e Formação de Adultos, explica que este curso foi inicialmente pensado para os imigrantes que trabalham em Portugal. Mas em vez de ucranianos, moldavos ou russos, acabaram por ser estrangeiros oriundos dos países nórdicos, aposentados ou que trabalham à distancia, a aproveitar estas aulas.
Alguns deles querem agora integrar a turma de Português para portugueses, que lhes possibilitará aprofundar o funcionamento da língua e da cultura portuguesa.
Agradeço que me faculte algumas ideias de como trabalhar L.P. com adultos. Estou a residir em Angola e fui convidada para um projecto, como ensinar a ler e escrever em Português.
Obg.