“O 16 de Março deveria ser assinalado com mais dignidade nas Caldas da Rainha”

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A organização foi da AJA que convidou a historiadora Joana Tornada a intervir

Casa cheia para assinalar os 50 anos do 16 de março. Celebrações “deveriam ter mais dignidade e ter sessões institucionais”

O café-concerto do CCC encheu-se de gente para participar na tertúlia organizada pelo Núcleo das Caldas da Associação José Afonso (AJA), a 16 de março, com vista a assinalar os 50 anos do Golpe das Caldas. Muitos caldenses quiseram ouvir as histórias dos militares que fizeram parte do 16 de março e também a historiadora Joana Tornada, que estudou o tema com profundidade no seu mestrado.
“O Golpe das Caldas marcou a geração de todos os envolvidos”, disse a investigadora que ainda acrescentou que o Estado Novo, que era “autocrático e fascista”, se encontrava perto do colapso e, por isso, o Golpe das Caldas foi um sucesso pois “permitiu o 25 de Abril”. E mais: “quando um Estado autoritário e repressivo se apressa a afirmar que nada aconteceu, é porque aconteceu de facto alguma coisa”, sublinhou.
Foram cerca de 200 militares que tiveram “a coragem e a ousadia” de se sublevar e partir para Lisboa para derrubar o regime, a 16 de março. Iriam tomar o aeroporto mas depois voltaram para trás quando se aperceberam que estavam sós.
O coronel Vitor Silva Carvalho – que na altura era mais conhecido como o alferes Cross “pois tinha a mania das corridas” – foi um dos militares do 16 de março e partilhou na sessão que “militarmente foi algo “muito mal feito”. Este coronel, que partilhou que tinha estado numa tertúlia com Zeca Afonso antes da Intentona, sublinhou que as questões de carreira – que chegaram a dividir os militares – “estavam resolvidas” e todos estavam unidos em “acabar com a guerra colonial”, disse Silva Carvalho.
O coronel João Lucas partilhou que foi um dos militares que foi preso e afirmou que ainda hoje tem dúvidas sobre o 16 de março. “Foi um dia e noite muito atribulados. Eu fiquei no quartel e na manhã seguinte recebi uma nota de culpa pois estaria envolvido em várias ações desde a neutralização do comandante até à ida ao paiol buscar as armas”, ironizou. João Pereira e Moreira dos Santos também partilharam as suas vivências que agora cumprem 50 anos.

Durante muito tempo, dizia-se que o Golpe das Caldas “teria sido inopinado” quando, na verdade, “quem seguiu foram militares com experiência”, contou João Pereira que era tenente miliciano na época. Depois dos militares de Abril, vários caldenses, como Jorge Sobral e o anterior autarca Fernando Costa, pediram para que o 16 de março “fosse convenientemente celebrado, com sessões de caráter institucional”. Gostariam também que fossem homenageados todos os envolvidos no 16 de março e que no futuro esta data seja celebrada “com a dimensão que merece”.
A vereadora da Cultura, Conceição Henriques, reconheceu que lhe chegaram pedidos para assinalar o 16 de março de forma condigna. A autarca explicou que volvidos 50 anos, “está na altura de olhar para o futuro”, acrescentando que estas comemorações, integradas no 25 de abril, são feitas com a sociedade civil. “Só até setembro já temos 32 ações preparadas”. Afirmou também que, além do que se passou no passado, a autarquia precisa também “de cuidar do seu património arquivístico”. E queixou-se que encontrou parte dele “no chão de uma sala da Biblioteca, a apodrecer numa tulha um pouco maior que estas duas mesas”. Esse espólio – “onde estavam documentos de 1974 e também do século XVIII”- já está todo tratado”, garantiu.
Conceição Henriques rematou afirmando que a autarquia “quer aprofundar o estudo do 16 de Março” do mesmo modo que também “resgatou o arquivo”.
Também no sábado, 16 de março, a Biblioteca do Cadaval acolheu a tertúlia “Golpe das Caldas – Sessão de Testemunhos, Memórias Vivas”. Assistida por meia centena, a sessão, moderada pelo jornalista Paulo Baldaia, contou com a partilha de memórias dos cadavalenses António Correa, Diogo Abreu e Mário Albino. ■