A cerimónia realizou-se, uma vez mais, junto ao monumento alusivo à efeméride, criado por José Santa -Bárbara
Emanuel Sebastião tinha apenas três anos quando, na madrugada de 16 de março de 1974, uma coluna formada por cerca de 200 soldados saiu do Regimento de Infantaria 5 (RI5) e seguiu rumo a Lisboa para ocupar o aeroporto da Portela e derrubar o governo de Marcello Caetano. Atualmente tenente coronel de Engenharia, na reserva, e presidente do Núcleo da Liga de Combatentes das Caldas da Rainha, foi convidado a falar sobre o acontecimento, que viria a ser conhecido como o Golpe das Caldas, na sessão comemorativa do seu 49º aniversário, que decorreu na passada quinta-feira, junto ao monumento evocativo. “É uma história ainda muito próxima e que ainda não tivemos tempo de escrever e de ouvir falar sobre todos os pormenores”, começou por dizer, sobre o acontecimento que abriu portas ao 25 de Abril de 1974. “Diz-se que foi uma tentativa falhada de fazer o 25 de Abril mas, 49 anos depois podemos afirmar que foi uma tentativa que deu origem a que o 25 de Abril ocorresse 40 dias depois”, considera Emanuel Sebastião. E concretiza: a revolução aconteceu de uma “forma que não foi tão complexa como seria de esperar porque o poder instituído já não estava à espera. Ficaram com a percepção de que, como o 16 de março falhou, provavelmente os militares não se conseguiriam organizar da melhor forma. Só que houve uma coisa que mudou tudo, os militares que depois foram colocados em várias unidades, a nível nacional, levaram o bichinho da revolta para todo o lado”. Na opinião do orador, “na tentativa de desmembrar um grupo separaram-nos por vários sítios e acabaram por minar aquilo que seria a relação de confiança que havia naqueles locais”. Os militares puderam também aprender com o que correu mal neste golpe falhado e, 40 dias depois, conseguiriam fazer a revolução, referiu.
Ainda que o 16 de Março tenha “ficado na história como um golpe falhado, foi um grande princípio para o 25 de Abril”, referiu Emanuel Sebastião, enaltecendo os militares da altura pelos “riscos muito elevados” que correram.
Também presente na cerimónia, o presidente da Assembleia Municipal, Lalanda Ribeiro, referiu-se ao 16 de Março como um “dia histórico” e que não pode ser dissociado do que viria acontecer 40 dias depois, a 25 de Abril de 1974. Para Lalanda Ribeiro não se tratou de um “golpe falhado” mas antes de um golpe importante para o que viria a acontecer a seguir. Considera que é uma data que se tem de celebrar e, tendo em conta que no próximo ano se assinala o 50º aniversário deste acontecimento, deve de ser comemorado a nível nacional, juntamente com o do 25 de Abril. Preocupa-o o facto dos jovens não saberem o significado e a importância que a data teve para a conquista da liberdade e deixou a sugestão à autarquia para que possa fazer chegar aos alunos o livro “Nascida das Águas e o 16 de Março de 1974”, da autoria de José Ruy. Um repto que foi aceite pela vereadora Conceição Henriques, que considera que “só faz sentido comemorarmos os 50 anos da efeméride da cidade se tivermos um trabalho antecipadamente junto dos jovens”. A autarca disse ainda à Gazeta das Caldas que o programa das celebrações ainda não está fechado, mas que será conhecido ainda durante este ano.
Na sua intervenção, Conceição Henriques salientou que o 16 de Março pode ter, “aos olhos de alguns, fracassado, mas representou um prenúncio do acontecimento mais relevante da história recente do país, com a revolução do 25 de Abril, que haveria de instituir o regime democrático em Portugal”. Volvidos 49 anos sobre os acontecimentos que pautaram o final do Estado Novo, é “hoje claro que o regime atingira o seu limite temporal”, disse, dando conta do isolamento do país, ao nível externo, e da ausência de liberdades individuais no país. “Contudo, a inevitabilidade da queda do Estado Novo nada retira ao mérito dos militares que tomaram a iniciativa de desafiar o poder instituído”, ressalvou, dando nota que as prisões políticas aumentaram nesta fase final do regime. A autarca falou ainda da “notável dose de coragem e determinação necessária para que estes homens, alguns sem terem completado 20 anos, arriscassem uma revolta cujo resultado era incerto, mas cujas consequências poderiam ter de pagar – como pagaram – a elevado preço” e que, por isso, são agora homenageados.
Para Conceição Henriques há uma lição a retirar do 16 de Março: “a manutenção do estado de direito e da democracia plena é o único garante de uma sociedade justa, equitativa, desenvolvida e pacífica”.
Também presente, o coronel Armando Ramos, que na altura comandou a coluna militar do RI5 para Lisboa, mostrou-se satisfeito com a cerimónia. “Houve aqui um fator importante que foi não confundirem. Hoje, para mim, não confundiram, foi dado esclarecimento e o devido mérito ao 16 de Março”, disse à Gazeta das Caldas. Também o major general Adelino de Matos Coelho participou na efeméride e lamentou a pouca afluência de caldenses na cerimónia, que marca um momento importante para as Caldas. Relativamente às intervenções, refletem que “as pessoas estão a perceber a coletividade destes movimentos”. O mais graduado militar vivo que participou no golpe de Estado falhado explica que este foi “um movimento coletivo. Quando saímos daqui íamos convencidos de que estávamos inseridos no Movimento dos Capitães”, disse, acrescentando que a seguir à revolução foram “libertados pelos vencedores do 25 de Abril”. ■