“O Governo não tem vontade de construir o Hospital do Oeste”

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José Bernardo Nunes entra no terceiro e derradeiro mandato à frente da Câmara do Cadaval

O novo vice-presidente da OesteCIM mostra-se crítico com a posição do Estado relativamente à construção do novo hospital e discorda do terreno apresentado pela Câmara do Bombarral

O social-democrata José Bernardo Nunes entra no derradeiro mandato à frente da Câmara do Cadaval. Em entrevista à Gazeta, explica as razões de, enquanto candidato em três atos eleitorais consecutivos, nunca ter apresentado um programa eleitoral e desconfia das intenções do Governo quanto à construção do futuro Hospital do Oeste.
Como perspetiva o último mandato na Câmara Municipal?
Quando me candidatei em 2013 não apresentei programa, mas sim as linhas-mestras com que me pretendia nortear no cargo. Fi-lo com a convicção de que a população conhecia o meu percurso noutras instituições do concelho e que, por isso, me daria oportunidade de desenvolver um trabalho numa Câmara pequena, pobre, onde temos de contar todos os tostões para conseguir manter a situação financeira estável. Essa estabilidade financeira não é mérito destes executivos, nem do PSD, pois foi uma situação herdada ainda nos tempos do PS. É algo que tem há muitos anos. Aquilo que nos propusemos foi manter essa bitola e nem a pandemia nos obrigou a recorrer à capacidade de endividamento da autarquia. Sempre olhei para os programas eleitorais com uma certa desconfiança, porque já cá ando há alguns anos e pode dizer-se que, em regra, há muito pouca ligação entre aquilo que se promete e aquilo que, depois, é efetivamente feito. Por isso, entendi que não fazia sentido estar a prometer fosse o que fosse.
Mas não corria o risco de, em plena campanha eleitoral, ser acusado de não ter ideias?
Pelos vistos, a população acreditou em mim e concordou com a minha forma de estar e de ser na política. Aliás, recordo que na primeira eleição, em 2013, vencemos a Câmara e o PS ganhou a Assembleia e quatro anos depois vencemos de forma expressiva as eleições para os dois órgãos. No passado dia 26 de setembro, a população voltou a renovar a confiança no PSD, é certo que não repetimos a vitória estrondosa de 2017, mas, ainda assim, tivemos o segundo melhor resultado da região. Só em Arruda dos Vinhos houve uma vitória mais expressiva. Temos feito uma gestão rigorosa e só fazemos as obras que os fundos europeus nos permitem fazer, porque o orçamento não estica. Fazemos obras porque, como somos uma Câmara com uma situação financeira estável, e temos uma boa taxa de execução, conseguimos financiamento, nalguns casos, a 100%.

E que Cadaval gostaria de deixar em 2025?
A grande aposta para este mandato é a habitação social, porque temos fundos europeus disponíveis. Estamos a falar de cerca de 40 fogos, que serão distribuídos pelas freguesias em função do levantamento por parte da Ação Social. Só haverá transferência de habitantes, caso haja essa necessidade. Mas neste mandato teremos, também, de fazer um investimento no alargamento das instalações, devido à transferência de competências. Neste caso, teremos de fazer essa obra sem fundos, porque o Estado determinou a transferência de competências, mas não temos espaço para albergar todos os funcionários que ficarão a cargo da autarquia e o Estado não suporta esses encargos. Nesse sentido, temos pronto um projeto para construir um edifício administrativo junto às oficinas municipais para dar resposta às necessidades. Esperamos arrancar com essa intervenção ainda este ano.

Ainda se sente, em certa medida, a interioridade no concelho do Cadaval? Os dados preliminares dos Censos indiciam uma diminuição da população…
Quem sou eu para colocar em causa o trabalho do INE, mas há uma coisa que me parece estranha: como o número de fogos sobe vertiginosamente e o número de pessoas baixa? A segunda habitação não explica tudo. Acredito que os Censos, feitos na pandemia e da forma como foram feitos, estão muito suscetíveis de estar errados, mas não vou perder muito tempo com esse tema. No que ao futuro diz respeito, acreditamos que o fenómeno da “explosão” populacional em Lisboa, que já chegou a Torres Vedras também chegará aos concelhos mais a Norte. Porém, continuo a não acreditar no projeto de eletrificação da Linha do Oeste. A ferrovia só serviria a nossa região se a linha férrea compreendesse um percurso em que a Linha do Oeste chegava à Malveira e seguia para Lisboa, em vez de ir para Sintra. Só assim se ganharia tempo em relação à rodovia. Mas voltando à questão da interioridade, o que gostávamos era que nos dessem cobertura 5G, porque essa, sim, é uma questão fulcral para atrair população e mão de obra qualificada. Temos muitas zonas do concelho onde ainda não há rede de telemóvel e esse é um fator inibidor para quem cá se desloca ou quer viver e trabalhar.

É o autarca mais experiente do PSD no Oeste e, de resto, foi escolhido para ser vice-presidente da Comunidade Intermunicipal do Oeste. Isso aumenta a responsabilidade?
O órgão manteve o equilíbrio das forças políticas, com o PS, que tem mais Câmaras a ficar com a presidência, o Cadaval ficou com a vice-presidência na sequência da derrota do PSD nas Caldas e a CDU a manter-se no cargo, pois tem Sobral de Monte Agraço. Acredito que a minha escolha tem que ver com o facto de ser o autarca do PSD há mais tempo em funções, até porque os novos colegas de Óbidos e Alcobaça são, digamos, estreantes.

Fala do equilíbrio de forças, mas os independentes têm mais Câmaras no Oeste do que a CDU…
Tenho o maior respeito pelos independentes e ainda bem que eles estão na política local. Aliás, há muitos anos que defendo uma certa despolitização das Juntas de Freguesia, nomeadamente nas freguesias até 1.000 habitantes. Considero que seria mais vantajoso que as candidaturas fossem de grupos de pessoas do que de partidos. Os interesses das populações devem sobrepor-se aos interesses dos partidos. A Comissão Executiva resultou da votação dos presidentes de Câmara. O que posso dizer é que hei-de sempre preservar os interesses do meu concelho, em detrimento dos interesses do meu partido.

Uma das questões em cima da mesa na última campanha eleitoral foi a construção do novo Hospital do Oeste. Mantém a posição de não acreditar na obra, mesmo sendo, agora, vice-presidente da OesteCIM?
Mantenho a mesma posição: o Governo não quer construir o Hospital. A competência para decidir esta matéria é do Governo. Querem pedir a 12 presidentes de Câmara que indiquem um concelho? Isto é de quem não quer fazer a obra. A localização não deve ser matéria de discussão no interior da OesteCIM, porque cabe ao Governo escolher o terreno e executar a obra. Colocar os municípios a discutir a localização é criar condições para não haver o investimento. O Governo tem autonomia e poder para o fazer.

Mas qual é a opinião do presidente da Câmara do Cadaval sobre a localização?
Se me perguntam, digo-lhe que considero que a melhor localização é na zona do Bombarral, mas nunca na localização que a Câmara do Bombarral definiu para esse efeito, porque esse terreno fica dentro da vila. O Hospital tem de ficar junto à A8. E tanto pode ser a Sul do Bombarral, na zona do Outeiro da Cabeça, que fica perto da Lourinhã e a caminho de Torres Vedras, como a Norte, na saída da Delgada, onde existe espaço para construir um hospital com 40 ou 50 hectares e capacidade de expansão e com bons acessos rodoviários. Fazer um Hospital e obrigar os utentes a terem de atravessar uma vila não faz, para mim, qualquer sentido. Além disso, nestas duas localizações é possível criar uma ligação à Linha do Oeste. Mas volto a dizer que não haverá novo Hospital do Oeste, porque nenhum Governo mostrou verdadeira vontade de o fazer. ■

“A grande aposta para este mandato é a habitação social”

“A melhor localização [para o Hospital] é no Bombarral, mas nunca na localização que a Câmara definiu para esse efeito”

José Bernardo Nunes

“Devemos tirar partido da diversidade do Oeste”

Aposta no turismo é essencial para o presidente da Câmara do Cadaval, para quem a aposta no Turismo do Centro não podia “dar bom resultado”

José Bernardo Nunes contesta a forma como a Entidade Regional Turismo Centro de Portugal tem levado a cabo a promoção do Oeste e considera que os municípios devem trabalhar mais em conjunto, por forma a obter sinergias num setor “vital” para o futuro da economia da região e que se possa “tirar partido da diversidade do Oeste”
Para o presidente da Câmara do Cadaval, mesmo não sendo possível reverter a extinção da Região de Turismo do Oeste ou criar uma nova estrutura intermédia “tem de ser possível fazer algo no turismo fora do Turismo do Centro”.

Autarca destaca a capacidade que a região tem de apresentar ao visitante vários produtos turísticos de qualidade

“Termos uma entidade que engloba 100 municípios, ou seja, quase um terço de todos os municípios do país, com sede em Aveiro, não pode dar bom resultado”, observa o social-democrata, considerando que, neste particular, a Comunidade Intermunicipal do Oeste em “feito um bom trabalho” na “na promoção territorial da marca Oeste”, embora “haja sempre muito por fazer”.
“Acredito que a OesteCIM tem de melhorar essa promoção, mas é essencial que existam promotores, com projetos válidos, que se queiram envolver nessa estratégia de promoção”, frisa o chefe do executivo municipal do Cadaval, profundo conhecedor do enoturismo, setor em franco crescimento. Mas nem sempre foi assim.
“Há cerca de 10 ou 15 anos não havia espaços de enoturismo para mostrar na região, porque os produtores estavam numa fase em que a prioridade era vender o vinho que produziam. Aliás, temos empresas na região que apenas se dedicam à exportação, mas o cenário já começa a mudar”, frisa o presidente da Câmara do Cadaval, que sublinha a existência, no âmbito dos 12 municípios da Comunidade Intermunicipal do Oeste, de “projetos muito interessantes” no enoturismo e que funcionam como “complemento” à oferta turística da região.

Autarca diz que promoção territorial feita nos últimos anos pela OesteCIM é positiva, mas que é possível fazer mais

“Vale a pena trabalhar em conjunto este setor. Aliás, no Oeste apenas os concelhos de Peniche e da Nazaré não certificam vinho, mas esses dois municípios têm um papel muito importante em termos de turismo”, nota José Bernardo Nunes, que avaliza, ainda, o projeto do Geoparque do Oeste, que tem “muito interesse” e permite ajudar a alavancar outra área de desenvolvimento turístico, “com um peso económico cada vez mais relevante”, ligada à natureza e aos recursos naturais. ■