“É o maior choque da minha vida!”, afirma o padre Eduardo sobre os casos de pedofilia no seio da Igreja.
Os casos de pedofilia na Igreja “são uma monstruosidade”, diz o padre Eduardo Gonçalves, que considera tratar-se de “um autêntico pesadelo” e está impressionado com a extensão dos crimes. “Foi algo que passou ao meu lado e, na verdade, não dei por isso”, referiu. O pároco diz que ao longo da carreira teve conhecimento de apenas um caso na região e revolta-se com a situação.
“Para mim, isto merece tolerância zero e pergunto-me como é possível este tipo de crimes no seio da Igreja? E estive ao lado daqueles que cometeram estes crimes… O que se passou nesta instituição para que aparecesse esta monstruosidade?”, questiona
Conta que vários padres, seus colegas acabaram por pedir dispensa para casar mas quando se trata de crianças “é totalmente inadmissível…”. E reforçou: “Ao chegar a esta idade este é o grande choque da minha vida”, resumiu o pároco.
Eduardo Gonçalves esteve na Foz de 1970 até 1997, altura em entendeu que “era tempo de mudar”. E então pediu ao Cardeal Patriarca D. António Ribeiro e foi para Salir de Matos “onde havia outro tipo de exigência de prática cristã”.
Em 1990 também deixou a direção do Ramalho Ortigão e passou a leccionar Latim, disciplina que ensinou até 2004 quando se reformou por ter atingido o limite de idade. Nesse ano, houve um novo desafio. Foi convidado para ser capelão do hospital.
“Fiquei passado… mas não tive coragem de dizer que não a D. José Policarpo”, referiu o padre que, então, até tinha receio de entrar em hospitais. Pediu conselhos a outros capelães de hospitais de Lisboa e do IPO mas, no ínício, custava-lhe pois “lidar com o sofrimento, quando este é irreversível, é muito complicado”. E não esquece as idas ao serviço de oncologia, onde acompanhou pessoas que viveram “experiências arrasantes”.
A rotina implicava a ida a vários serviços mas acabava sempre a volta na Maternidade “onde a vida nova brotava por todos os lados!”.
No Hospital das Caldas não havia espaço dedicado à religião e procurou “transformar uma sala de arrumo numa pequena capela onde os familiares dos doentes poderiam passar algum tempo”. “Algo com o mínimo indispensável dedicado à paz interior”, salienta o padre, muito satisfeito pois a pequena capela, inaugurada em 2007 ainda hoje se mantém em funcionamento.
Quando saiu do Hospital foi convidado para integrar o Olha-te, projeto de apoio a doentes oncológicos e famílias desde 2010. E aceitou o convite e fá-lo através de sessões de musicoterapia, já que é um melómano convicto. E é também um viajante inveterado, já fez cruzeiros e percorreu vários países, alguns com a escola.
Identifica-se profundamente com o Papa Francisco, “pois consegue ser um Humanista, que olha para ao homem, independentemente da sua Fé”, diz o sacerdote, que vê a situação económica atual com muita preocupação. “Há pessoas a passar fome ou outras sem dinheiro para pagar a casa”, observa.
Entretanto, o padre teve saudades da Foz do Arelho, da Serra do Bouro e do Nadadouro e, por isso, está de regresso, dividindo tarefas com outro sacerdote. E um dos últimos batismos que fez, encheu-o de orgulho. Um casal homossexual que lhe pediu para batizar a filha adotada de 10 anos e que sofre de deficiência profunda.
“Vi o carinho com que a tratavam e houve uma grande proximidade entre todos. Percebi que Deus a queria como filha e, como tal, facilitei o processo”, rematou o padre que apesar de ter saído das salas de aula, continua a dar explicações de Latim a quem precisa.