Os espanhóis Javier Carbajo e Sara Rojo foram os grandes vencedores da noite com uma caricatura de Bashar-al-Assad, feita a quatro mãos. O cartoon, recebeu também o primeiro prémio na categoria de Caricatura e foi publicado no jornal espanhol ABC em Abril de 2018.
“Este desenho deu muitas voltas e foi bastante complicado”, reconheceu Sara Rojo. Para o completar, tiveram de recorrer a trabalhos anteriores, como uma ilustração com o Iraque ao fundo. “Somos muito abertos relativamente a misturar técnicas e formas”, disse a autora.
Entre os nove premiados desta edição, Javier Carbajo e Sara Rojo arrecadaram o maior prémio monetário, no valor de 10 mil euros, juntamente com presentes oferecidos pelos patrocinadores do evento. Ainda na categoria de Caricatura, o júri atribuiu o segundo prémio à obra Angela Merkel, de outro espanhol, Joaquín Aldeguer, publicado na revista El Jueves, em Novembro de 2018. O autor, que fez a primeira caricatura aos sete anos, disse que o desenho vencedor retrata a despedida da chanceler alemã que, “embora esteja um pouco triste, continua a manter a sua postura habitual”, explicou.
O terceiro prémio foi para Martin Luther King, do autor brasileiro Cau Gomez, publicado no Le Monde Diplomatique, em Abril de 2018. O trabalho homenageia o activista norte-americano e recorda que actualmente “vivemos num mundo inseguro e intolerante”, disse o autor.
Reportando-se ao seu país, Cau Gomez afirmou que este é liderado por um presidente “intolerante, racista, homofóbico” e acrescentou que dedica o prémio a Marielle Franco, (a vereadora do Rio de Janeiro e activista dos direitos humanos que foi assassinada com nove tiros) e ao antigo presidente Lula da Silva, o qual quer ver livre da prisão.
Cartoonista português distinguido
Na categoria de Desenho de Humor, o primeiro prémio foi atribuído ao mexicano Boligán, para a obra Reload, publicada em Novembro no jornal El Universal. O seu trabalho reflecte sobre o ser humano na época em que estamos a viver, de forma critica, humorística e sarcástica. “Tal como carregamos a bateria durante dez minutos para podermos continuar a falar ao telemóvel, nós próprios temos necessidade de poder “recarregar” a bateria”, explicou o autor, que já foi júri do WPC e se estreou como concorrente nesta edição.
O segundo prémio foi para Cheias em Veneza, do português André Carrilho, um cartoon publicado no Diário de Notícias em Novembro do ano passado.
Na sua opinião, este certame é cada vez mais fundamental tendo em conta os ataques à liberdade de expressão, sobretudo nos EUA, América do Sul e nalguns países da Europa.
O terceiro prémio distinguiu Autocarros, do autor francês Constantin Sunnerberg, publicado no Courrier International, em Dezembro.
Cartoon Editorial para cubano
O cubano Ramsés Morales foi o vencedor do primeiro prémio na categoria de Cartoon Editorial, com o seu desenho Cuba Pal Taller, publicado no website americano OnCuba. O cartoonista enalteceu o facto de ter vencido na categoria que melhor representa a sua profissão. Humor editorial é o que faz há 20 anos e foi “justamente com este desenho que encerra um conteúdo tão importante para mim e para a minha terra, que está a sofrer tantas mudanças”, explicou sobre a obra.
O desenho mostra um carro dos anos 50 em reparação e colocado em cima de blocos de cimento.
Ramsés destacou a forma como foi acolhido nas Caldas, cidade que diz ser parecida com a sua, Trinidad, situada no centro de Cuba. Foi a primeira vez que participou e venceu.
O segundo prémio foi para A Causa do Medo, do turco Halit Kurtulmus, publicado na plataforma de cartoons holandesa Cartoon Movement, em Novembro de 2018. O artista búlgaro Nikolov Tchavdar, arrecadou o terceiro prémio pelo seu trabalho America First, publicado em Junho do ano passado nas páginas do jornal búlgaro Prass Press.
Os desenhos foram avaliados por um júri internacional que integrou, para além do representante da organização, António Antunes, os cartoonistas Maria Picassó (Espanha), Óscar Grilo (Argentina), Cássio Loredano (Brasil) e o designer Manuel Peres (Portugal). Participaram na competição 900 obras publicadas em 68 países.
Perto de 300 dos melhores trabalhos a concurso fazem parte da exposição que está patente no CCC, com entrada livre, até 28 de Julho.
Ainda integrado no WPC decorreu, na manhã de sábado, uma sessão de desenho ao vivo na Rua Miguel Bombarda. Os cartoonistas premiados desenharam caldenses de todas as idades, que faziam fila para verem os seus traços fisionómicos enfatizados.
A liberdade de expressão e os perigos dos totalitarismo estiveram em destaque no Word Press Cartoon
Bordalo Pinheiro e o seu gato Pires abriram as hostes da gala, que decorreu no CCC na noite de sábado (4 de Maio) e premiou os melhores cartoonistas do mundo. O percursor da caricatura em Portugal (interpretado por José Ramalho) falou sobre a criação da sua figura mais emblemática, Zé Povinho, e não deixou de estabelecer ligação com o trabalho de António, seu sucessor no retrato humorístico. Lamentou, inclusive, a polémica que surtiu o seu cartoon que retrata um Trump cego conduzido por um cão guia, com o rosto do primeiro ministro israelita, Benjamin Netanyahu (ver caixa).
O humor marcou presença com a dupla belga Elastic & Francesca. O palhaço Stéphane Delvaux (Elastic), com mais de 30 anos de carreira, veio acompanhado por Françoise Rochais (Francesca) que é campeã do mundo de malabarismo, contanto com alguns números no livro de recordes do Guiness.
A comédia lusa foi garantida por Pedro Tochas, que conhece bem as Caldas.
O artista de Leiria contou aos espectadores que foi nas Caldas que, há mais de 20 anos, começou a fazer espectáculos de rua, sobretudo na rua das Montras e na Praça da Fruta.
Tudo isto no tempo “em que ainda havia comboios”, lembrou o performer, que partilhou histórias e arrancou fortes risadas do público.
“O pessoal vinha cá para ver a cerâmica, as termas e um velho a esfregar-se num poste… na altura não percebi, mas agora já com uma certa idade, vejo que se uma pessoa põe o braço para trás já não o consegue trazer para a frente… o velho era esperto!”. As piadas, muito centradas em vivências do artista, passaram por histórias em locais repressivos como Singapura, mais liberais como a Noruega, ou ainda no nosso país, onde explicou como foi ser “palhaço-segurança” num torneio de ténis.
A cerimónia, apresentada por Inês Lopes Gonçalves, contou ainda com a presença da Orquestra do Monte Olivett, dirigida por David Santos, e voz de Ana Cristina Matos.
Liberdade de expressão envolve riscos
Pelo palco passaram personalidades marcantes do cartoon internacional, da imprensa portuguesa e autarcas locais. O cartoonista e director do salão, António Antunes, salientou que publicar um cartoon é “lutar pela liberdade de expressão, o que envolve riscos”. O responsável sublinhou o facto de se festejar a 14ª edição do WPC um dia depois de se comemorar o Dia Mundial da Liberdade de Expressão. “Não tenho grandes ilusões relativamente ao peso relativo dos cartoons no meio de toda esta parafernália de tecnologias e meios”, mas esta forma de expressão continua a ser “um pequeno grão de areia que, às vezes, pode fazer alguma diferença”, disse no palco do CCC.
Os cartoons agora premiados foram seleccionados por um júri internacional, que reuniu nas Caldas em Fevereiro. Uma escolha que nem sempre é fácil. Pelo meio há “discussões e campanhas eleitorais por um desenho ou outro…”, contou António, destacando que o facto de escolher amigos para a selecção final facilita a tarefa. Os membros do júri analisaram propostas relacionadas com “as fake news de Trump, as idiotices do Bolsonaro, a tragicomédia do Brexit, as matrioskas de Putin, o olhar misterioso e calculista de Xi e o cortejo costumeiro de fomes, guerras, refugiados e o evidente aquecimento global”.
Caldas cidade da caricatura
Caldas da Rainha deve passar a ser conhecida por Caldas da Caricatura. A sugestão foi deixada, durante a cerimónia, pelo caricaturista búlgaro Tchavdar, e a vereadora Maria da Conceição Pereira concorda que a cidade possa receber esse epíteto. “É uma cidade da liberdade, da luta pela democracia e da liberdade de expressão, ou seja, os ingredientes que fazem a caricatura”, salientou.
A autarca demonstrou também vontade para que o evento continue nas Caldas. A autarquia pagou este ano 180 mil euros à organização do World Press Cartoon, valor que inclui o espectáculo, exposição, viagem, estadia dos premiados e do júri.
A autarca reconhece que se trata de um esforço financeiro, mas que a caricatura está no ADN das Caldas, sobretudo graças ao legado de Bordalo Pinheiro. “Se há cidade onde se justifica este evento é as Caldas da Rainha”, disse Maria da Conceição Pereira, acrescentando que têm tentado criar mais eventos em torno da caricatura.
A vereadora falou também da intenção de criar um espaço museológico que possa ser o embrião para um futuro Museu da Caricatura nas Caldas, tendo em conta que ainda não existe nenhum no país. A Casa Amarela, integrada no Centro de Artes, está a ser recuperada e poderá albergar este projecto num dos seus espaços de exposição.
O WPC, que nas edições anteriores se tem realizado em Junho, este ano antecipou-se um mês, de modo a permitir que as escolas possam fazer visitas acompanhadas à exposição patente no CCC.
António garante que desenho polémico não é anti-semita
Sobre a publicação do seu desenho no New York Times o cartoonista e director do salão, António Antunes, afirmou à Gazeta das Caldas que se lhe tivessem contado esta história há alguns anos, “não teria acreditado”. Primeiro publicaram o seu desenho, depois retiraram-no por o considerarem anti-semita, quando “na verdade não o é”, garante António. Diz que se trata de um trabalho anti-sionista (contra a política de violência de Israel) e acrescenta que o jornal norte-americano possui na sua base financiamento judaico e isso explicará a retirada do desenho.
Depois de tal atitude, o jornal ainda cortou relações com o Syndicate (agência distribuidora de material jornalístico) que lhes vendeu o desenho sem que o autor tivesse disso conhecimento.
António diz mesmo que se trata de um mistério a forma como o seu desenho foi parar ao New York Times dado que “há 10 anos que eu não mando trabalhos para os EUA”. Em última análise, poderá ter sido um acto de pirataria através das redes sociais.
O responsável do WPC vê com bons olhos a permanência do certame nas Caldas, corroborando da ideia de criação de um espaço de destaque à caricatura na cidade. “Se não for um museu, que seja uma galeria onde se realizem boas exposições com os respectivos catálogos”, disse, acrescentando que gostaria de apostar em parcerias internacionais de modo a manter a chama do cartoon viva durante todo o ano.
Índios da Amazónia vão visitar a fábrica Bordallo Pinheiro
No próximo dia 17 de Maio um grupo de índios da tribo Kaiopós, do Amazonas (Brasil), fará uma visita à Fábrica Bordallo Pinheiro. Os visitantes deslocam-se a Portugal no âmbito da nova colecção da fábrica, Amazónia, apresentada em Janeiro passado e que, em parceria com a associação brasileira Ecoarte, visa obter fundos para ajudar à reflorestação da Amazónia.
Antes, realizam eventos em Lisboa e depois seguem para Coimbra e Porto. Por fim, visitarão Ílhavo e serão acolhidos nas instalações da Vista Alegre.
A Fábrica Bordallo Pinheiro vai continuar a colaborar com o WPC e com o caricaturista António, mentor da coleccção Figurões. A continuidade da colecção está assegurada com novos modelos previstos para breve. Quem o diz é Nuno Barra, administrador da Visabeira e da fábrica caldense, cuja ampliação foi recentemente inaugurada pelo primeiro ministro, António Costa.