“É mentira que nunca tenha havido uma vaga de migração como a actual”

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“É mentira que na História nunca tenha havido uma vaga de migração tão grande como a actual”, afirmou Eva Gonçalves, designer gráfica portuguesa que vive em Berlim (Alemanha) há quase dez anos e que veio às Caldas apresentar a revista Nansen, que se dedica ao tema das migrações.

“É mentira que na História nunca tenha havido uma vaga de migração tão grande como a actual”, disse Eva Gonçalves. A designer gráfica portuguesa, que reside em Berlim, na Alemanha há nove anos e meio, veio às Caldas na tarde de 27 de Junho, à recentemente inaugurada Loja do Sr. Jacinto, apresentar o segundo número da Nansen Magazine, uma revista alemã que se dedica ao tema das migrações e com a qual colabora.
A Nansen tem o seu nome inspirado no explorador norueguês que se converteu em activista político e que, no fim da I Grande Guerra, criou passaportes para centenas de milhares de refugiados. Esses documentos ficaram conhecidos como os passaportes Nansen. “Começou com a ideia do passaporte, que é um documento pessoal, mas muito libertador”, fez notar.
Apesar de ser criada durante a actual crise de refugiados, a publicação não pretende fazer um retrato apenas dessa realidade, mas sim “um retrato mais vasto da migração”.
O primeiro número dedicou-se à comunidade turca em Berlim e o segundo à lusofonia, focando-se na comunidade afro-portuguesa.
Cada edição foca-se numa personalidade, famosa ou não. Neste número trata-se de Kalaf Epalanga (um dos fundadores da banda Buraka Som Sistema), que, segundo Eva Gonçalves, “contraria o mito do imigrante africano em Portugal, que vive nos subúrbios, é pobre e está ligado ao crime”. Kalaf foi escolhido por ser a antítese desse estereótipo e “relevou-se uma pessoa bastante conhecedora deste tema e com uma posição consolidada e conciliadora”.
Este era um tema ao qual Eva Gonçalves já tinha dedicado alguma reflexão. “Eu venho de uma família com ligações ao colonialismo e tenho tentado perceber qual é a memória que passa e é uma coisa bastante desligada daquilo que foi o colonialismo”, afirmou.
A revista é publicada por uma editora totalmente independente e todos os colaboradores são pagos, pelo que a sua publicação é “difícil de concretizar”.
Entre o primeiro e o segundo número da Nansen passou um ano e meio, até pela dificuldade em financiar um projecto deste tipo. “Fizemos um crowdfunding, mas não resultou”. Depois ganharam um prémio de uma fundação suíça que lhes permitiu lançar o número dois e pôr em prática um plano que poderá permitir a auto-suficiência da publicação.
Em vez das 400 cópias do primeiro número, foram lançados 1000 exemplares que custam 15 euros cada um. Dentro de seis meses deverá sair o terceiro número.
Presente na cerimónia estava Jorge Varela, presidente da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, que contou que, quando iniciou funções, várias pessoas se queixavam do elevado número de estrangeiros a residir na freguesia e que sentiu “uma necessidade não de mudar a realidade, mas sim a sua percepção”. Foi nesse sentido que lançou um projecto para estudar as comunidades existentes, procurando depois a integração das mesmas.
A apresentação nas Caldas foi promovida pela Associação Design Ofícios e Cultura (ADOC).