As pranchas revivalistas de Luís Brito e Pedro Falcão

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surfEm 2013 dois caldenses iniciaram um projecto que consiste em criar pranchas de surf revivalistas, inspiradas em modelos com quase 50 anos que eram usuais na Califórnia e na Austrália.
Gazeta das Caldas foi conhecer a história por detrás da Fly Black Board, a marca criada no ano passado por Pedro Falcão e Luís Brito, dois amigos caldenses com duas paixões em comum: o rock n’roll e o surf.

A ideia de criar a marca de pranchas de surf começou em 2011, quando o designer Pedro Falcão fez uma exposição intitulada de “The Great Disaster” no Museu Nacional de História Natural e queria lá colocar um auto-retrato. “Mas eu não queria uma fotografia tradicional, queria um objecto que me representasse”, disse à Gazeta das Caldas. E esse objecto era uma prancha de surf.
Decidiu então ir ter com um amigo na Ericeira que tem a profissão de shaper (artesão de pranchas de surf). Nico é um dos artesãos que fazia pranchas dentro do que Pedro Falcão pretendia: modelos retro e, portanto, não profissionais. Estes modelos são exemplares actuais e aperfeiçoados dos que eram feitos antigamente, nos anos 70, na Califórnia e na Austrália.
“Queria uma prancha preta, com uma inscrição e com algumas características mais técnicas” e acabou por surfar nela e por fazer uma fotografia, à escala real, para a referida exposição. Este foi o momento em que a paixão de Pedro Falcão pelo surf conheceu uma nova fase. “Eu quero fazer pranchas!”, percebeu o designer.
Foi aí que recorreu a Luís Brito. “Tinha ouvido dizer que o Brito estava a fazer pranchas muito boas” e, como já o conhecia desde o princípio da década de 90, quando ambos tocavam bateria, decidiu ir ter com ele.
“Um shaper é um autor”, prossegue Pedro Falcão e como se identificava com a visão e cultura de Luís Brito, estava encontrado o parceiro para um projecto que consistia em criar modelos de prancha vintages.

Desenhar o passado com o filtro dos dias de hoje

Para o design, Pedro Falcão vai beber inspiração à década em que nasceu (anos 70), ao pós Woodstock. “Sou completamente fascinado por essa década, seja na música, no surf, na arquitectura, na arte… Em tudo…”.
Por outro lado, não lhe interessa pegar em modelos antigos e fazer igual. “São formas desenhadas no passado, mas com o filtro dos dias de hoje”, contou.
As Fly Black Board não são pranchas de alta performance. “São mais fáceis de surfar e oferecem uma estética, um estilo diferente ao próprio surfista” afirmou.
Pedro Falcão nasceu nas Caldas em 1971 e foi viver para Lisboa em 1995, onde actualmente trabalha. Na altura estava a estudar Pintura na antiga ESAD (depois de ter pedido transferência de Tomar) e foi contactado por Mário Feliciano (também ele caldense) para o ajudar no design da revista SurfPortugal.
Ainda assim, nunca se separou das Caldas, onde tem família e amigos e que visita com frequência. Para além disso, sempre que pode, gosta de surfar nas ondas da Foz do Arelho.
Mas foi no Baleal que começou a fazer surf quando tinha 14 anos. “É uma paixão que conheci em 1985 e nunca mais larguei”, disse.

Esculturas com uma funcionalidade

Neste “negócio a dois”, o shaping é da responsabilidade de Luís Brito, que começou a desenvolver esta arte por gostar de trabalhos manuais (além de ser também um amante do surf). O facto de ser das Caldas e de ter estudado na ESAD deu-lhe a conhecer pessoas com novas abordagens sobre a arte e o design. “As pranchas são esculturas com uma funcionalidade” explica.
Há cerca de sete anos fez a sua primeira prancha, mas a experiência não correu bem.
O processo de produção prolonga-se durante cerca de 15 horas divididas entre três ou quatro dias, dado que é uma construção faseada. Os blocos de poliuretano, que constitui a principal matéria-prima deste artesão, são comprados em bruto. Primeiro é dado um desbaste principal ao bloco para dar a forma pretendida à prancha e depois esta é fibrada com fibra de vidro a fim de reforçar o núcleo porque este é demasiado frágil. De seguida é lixada e por fim é polida.
A importância de um shaper deve-se às alterações que este pode fazer na prancha consoante as características do surfista e das ondas que este quer apanhar.
Para já, Luís Brito assume que gostava de montar um negócio de pranchas de surf, mas não para competir com as marcas que já existem. “Gostava de ser o shaper local, o shaper da Foz do Arelho e ver as pessoas da zona a surfar com as pranchas que eu faço…”, disse.
Quanto às Fly Black Board, diz que estas não são pranchas de competição e que o seu objectivo é poderem servir para praticar um surf mais clássico e de fruição da natureza.

Surf – uma forma de estar

Luís Brito nasceu em Lourenço Marques (hoje Maputo) e veio em 1976, com apenas um ano, para as Caldas. Doze anos depois já surfava na Foz do Arelho.
“O que o surf tem mais de único é a sensação de liberdade e simultaneamente de algum controlo sobre a energia da natureza, é conseguir deslizar na onda, andar dentro dela… É mágico. É uma sensação única de autocontrolo”.
Mas o que começou por ser um desporto, acabaria mais tarde por se tornar uma actividade profissional. Aos 13 anos, quando surfou as primeiras ondas, Luís Brito estava longe de pensar que viria a ser shaper .

Isaque Vicente
Ivicente@gazetadascaldas.pt