Origens e Formação das Misericórdias portuguesas: estudos sobre a história da assistência (1944)

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Joana Beato Ribeiro
IHC-NOVA-FCSH; CEHFCi-UÉ; PH
Bolseira de doutoramento FCT

A investigação em torno da história da assistência em Portugal, que deu origem à obra este mês em destaque, começou a ser delineada em 1936, no entanto teria de aguardar pela equiparação a bolseiro do Instituto para a Alta Cultura (IAC) de Fernando da Silva Correia, a partir de 1939, para ser desenvolvida. À condução deste estudo está também subjacente a intenção de contribuir para a reorganização dos serviços de assistência social promovida pelo Estado Novo (decreto-lei n.º 35:108 de 1945). Daí que em janeiro de 1944, o bolseiro mostre ao presidente do IAC, alguma preocupação com o atraso da publicação que a faria perder “bastante da sua oportunidade”.
Através dos relatórios apresentados ao IAC (existentes no seu arquivo pessoal e no do Instituto Camões), é possível traçar o percurso da investigação que se prolongou até abril de 1944, assim como identificar outras atividades desenvolvidas, de que é exemplo a participação no monumental Congresso associado à Exposição do Mundo Português (1940). Apesar da publicação deste livro, Fernando da Silva Correia não considerava o projeto terminado, daí que tenha solicitado outros subsídios ao IAC, o último deles em outubro de 1960 para elaborar a obra “Desenvolvimento e evolução das Misericórdias Portuguesas”, como a Gazeta das Caldas noticiou a 31 de janeiro de 1961, mas que não lhe foi concedido.
O primeiro pedido (ao IAC) para a edição de “Origens e formação das Misericórdias portuguesas” foi feito em maio de 1942, sendo este título apresentado em setembro. Na obra, impressa na editora Henrique Torres, o autor pretende “expor (…) os elementos fundamentais da História da Assistência”, fixando alguns termos para “melhor se poder apreender e fixar a lição que essa história nos dê.” Analisa as principais causas da miséria e as formas de assistência em várias civilizações da Antiguidade. Define o papel da assistência cristã, em especial da “realização das Obras de Misericórdia”, até ao século XVI. Período também compreendido para o estudo do caso português, em que se deve destacar uma exaustiva lista de instituições de carácter assistencial. O livro termina, aí sim, com a análise da profunda remodelação da assistência que conduziu ao aparecimento do Hospital das Caldas, do de Todos-os-Santos e da própria Misericórdia de Lisboa. Fernando da Silva Correia vai introduzindo, talvez um pouco anacronicamente, alguns paralelismos com a sua atualidade; veja-se o exemplo da esmola, cujo caráter assistencial foi diminuindo ao longo do tempo, facto que deu azo a uma crítica à forma como a sociedade novecentista encarava as obrigações da “assistência pública”.
Por fim, a apreciação feita por Marcelo Caetano em agosto de 1944 (já mencionada anteriormente), revela também a opinião do autor relativamente à sua obra: “(…) como você reconhece e me disse já, não é ainda a história da assistência em Portugal nem sequer das Misericórdias: trata-se de um vasto trabalho de vulgarização, onde compendiou e resumiu anteriores estudos e documentos impressos e que portanto está em condições de prestar serviço aos futuros historiadores (…).”