Um dia juntaram-se numa biblioteca dois jornalistas que já receberam o prémio Gazeta, que são professores e escrevem livros, para falar com uma escritora sobre viagens que lhes alteraram a vida. Para lá das grandes histórias há muito que fica por contar, entre os 25 anos de cobertura jornalística de conflitos armados relatada por Paulo Moura e a guerra entre o Homem e os lobos em Trás-os-Montes, de Ricardo J. Rodrigues.
O jornalista parece insensível e é muitas vezes criticado por estar a relatar em vez de ajudar. Mas, tal como nos casos do INEM ou dos Bombeiros, este está numa missão: a de relatar. “No momento é preciso ser racional, agir, tomar decisões”, disse Paulo Moura, algo que foi corroborado por Ricardo Rodrigues: “depois é que cais em ti, mas sentes as coisas e de que maneira”.
E como é que depois de viverem situações extremas, mantêm a sanidade mental? “Ajuda muito pôr o último ponto final no último texto e conversar, conviver e beber uns copos sobre o assunto”, explicou Ricardo Rodrigues.
Na maior parte das vezes Paulo Moura foi cobrir as guerras sozinho. “Não há dinheiro para enviar duas pessoas”, até porque é tudo muito caro nos países com conflitos armados.
“A câmara fotográfica ou de filmar intimida”, notou Ricardo Rodrigues. “Torna tudo mais perigoso”, corroborou Paulo Moura.
Hoje em dia as coisas estão a mudar e em cenários de guerra o jornalista passou a ser um alvo. É que, segundo Paulo Moura, “o fundamentalismo islâmico vê o jornalista como um símbolo da cultura ocidental”.
Mas há outros problemas com o jornalismo. “Os jornalistas têm-se deixado confundir com o poder e muitas pessoas sentem que eles fazem parte do poder”. Por outro lado, os cidadãos não vêem o repórter como alguém que lhes dá voz, mas sim alguém que se quer aproveitar. “Mas na verdade o jornalista é o representante dos cidadãos”, lembrou Paulo Moura.
Na sessão integrada no Books&Movies – festival de literatura e cinema de Alcobaça, que se realizou no dia 12 Novembro na biblioteca municipal, falou-se ainda das fake news.
Políticas para o interior são urgentes
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Ricardo Rodrigues apresentou o livro “Malditos – Histórias de Homens e de Lobos”, que fala sobre a guerra ancestral entre o Homem e os lobos que ainda hoje se vive em Trás-os-Montes.
A obra trata uma questão que é sensível porque ambas as populações têm de ser protegidas. Mas trata também da desertificação do território, de um interior cada vez mais esquecido. O abandono não favorece ninguém. Nem os lobos.
Ricardo Rodrigues salientou a necessidade urgente de políticas de valorização dos territórios e notou que o que está a ser massivamente construído no interior não serve as populações locais, mas sim as do litoral. São disso exemplos as barragens e os eucaliptais.
Ricardo Rodrigues partilhou ainda a história de Isabel Batata Doce, uma “mascote de pelotão” trazida pelas tropas portuguesas de Angola com apenas dois anos. Isabel entrou um dia no arquivo do Diário de Notícias porque sabia de uma nota que falava da “pretinha que os portugueses salvaram do mato”. Queria saber quem era e de onde vinha, queria conhecer a família.
Num trabalho de investigação intenso, que implicou um envolvimento pessoal diferente, Ricardo Rodrigues acabou por conseguir levar Isabel Batata Doce ao encontro da irmã. Mas esta não é só a história da Isabel pois há outras mascotes de pelotão que ficaram esquecidas e há muitas vidas que literalmente se perdem numa guerra. “É a história dela e a de muitas pessoas”, afirmou.
Já Paulo Moura apresentou “Depois do fim”, que é uma espécie de diário de coisas que passou nos 25 anos em que cobriu os principais conflitos armados a nível mundial. São memórias que se não ficassem registadas desta forma, acabariam por se perder.
O autor notou que o fundamentalismo islâmico veio, de certa forma, substituir o comunismo, porque depois da guerra entre americanos e russos, agora a guerra é entre os fundamentalistas e o Ocidente.
Na sua experiência, Paulo Moura notou que os temas, as palavras, os motivos e até as pessoas são as mesmas nos vários conflitos.
Ana Zanatti foi a homenageada
A actriz e escritora Ana Zanatti foi a homenageada desta edição pela sua carreira, mas também pelo papel activo que tem tido na luta contra a discriminação da homossexualidade.
A Gala Books&Movies teve como surpresa o facto de ser Salvador Martinha o apresentador, que a pontuou com vários momentos de humor. Os artistas locais mostraram o que se faz em Alcobaça em termos de música e dança.
Na gala foi entregue o prémio deste ano, que foi para o escritor beneditense António Catarino. O roteiro de viagens de Alcobaça escrito foi eleito pelo júri, composto por Salvador Martinha, Inês Silva (vereadora da Cultura) e os escritores Tiago Salazar e Raquel Ochoa, tendo sido premiado com 5 mil euros.
O Moturista Acidental
O escritor e jornalista Tiago Salazar apresentou o seu mais recente livro: “O Moturista Acidental em Lisboa”, que é uma compilação das histórias por que tem passado na sua nova vida desde que conduz um tuk-tuk em Lisboa.
A sessão decorreu com Pio de Abreu, na biblioteca. O psiquiatra que é também escritor (autor da obra “Como tornar-se doente mental”) falou sobre o quão moldável a mente humana é e disse que “a coisa mais importante que temos são as palavras, a linguagem”.
Pio de Abreu notou ainda a complexidade das redes sociais, que trazem o isolamento, mas por outro lado são fortes agentes na disseminação das manifestações.
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