Uma política para a cidade?

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As verbas do novo Quadro Comunitário de Apoio, teoricamente, estão disponibilizadas desde Janeiro de 2014. Na prática, após um ano e meio, ainda há regulamentos por aprovar, o que, obviamente, tem impedido a apresentação de candidaturas e, por consequência, o acesso a financiamentos, em particular nas áreas das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional.

Neste contexto de crónico protelamento foi divulgado, em sede de Assembleia Municipal, um documento intitulado «Perspectivas 2020» o qual, visando a estruturação dos fundos da política de coesão e dos respectivos Planos Operacionais, define prioridades assentes no Crescimento Inteligente, Sustentável e Inclusivo. Por dentro destes três vectores fundamentais incluem-se itens de indiscutível importância tais como a investigação, desenvolvimento tecnológico, inovação, tecnologias de informação e comunicação, incremento da competitividade das pequenas e médias empresas e dos sectores da agricultura e pescas, transição para uma economia com baixas emissões de carbono, protecção ambiental, transportes, emprego, inclusão social e combate à pobreza, investimento no ensino e na aquisição de competências ou o reforço da capacidade e eficiência da administração pública. À partida e em abstracto, torna-se difícil não reconhecer a pertinência destes temas, ainda que, se olharmos com um pouco mais de detalhe, por exemplo, a questão do emprego, lá se encontra a aposta «num mercado de trabalho flexível» apto a «responder de forma empreendedora aos desafios da Região». Poder-se-ia questionar qual o real significado destes conceitos quando, lamentavelmente, se tem vindo a constatar que no léxico neoliberal a palavra flexibilidade equivale tão só a precariedade e desemprego e a resposta empreendedora quase sempre a trabalho sem direitos. Porém, ressalta de forma inquestionável que a abordagem e o modo de realização destes assuntos marcará decisivamente a vida de Caldas e dos caldenses daqui até ao final da década, evidência comprovável, desde logo nas linhas gizadas para a Intervenção Territorial Integrada para o Oeste que vão desde a eficiência energética, reforço da rede de infraestruturas sociais e de saúde (sector em que é expressamente reconhecido a necessidade de reduzir desigualdades, e em concreto, quanto à cidade e ao seu Hospital, se aponta para a remodelação do Serviço de Urgências, a expansão do S. O. Aberto da Urgência Geral, a remodelação do edifício da Consulta Externa e a do edifício e do equipamento do piso cirúrgico, a modernização e ampliação da Unidade Cirúrgica do Ambulatório), passando pelo abastecimento de águas, melhoramentos na ETAR, investimento em infraestruturas de educação pré-escolar e ensino básico, promoção, protecção e desenvolvimento do património natural e cultural (circuitos pedonais nas margens da Lagoa, preservação do Paul de Tornada), até à Cultura para todos (associada a uma bolsa de voluntariado, que, apesar de estimável, importará sublinhar, neste domínio, ser aquele um objectivo não atingível, de todo, apenas com a congregação de boas vontades).

Ora, a enunciação de todos estes aspectos faz sobressair a sua condição absolutamente determinante para o futuro próximo da Comunidade, e justificaria portanto, por parte do executivo municipal, uma outra capacidade e empenhamento genuíno na mobilização cidadã, auscultando atempadamente opiniões, propostas e sugestões, recolhendo pareceres, aferindo medidas aptas a estabelecer um diagnóstico profundo, favorecendo parcerias institucionais alargadas, num debate aberto e participado e não, como se verifica, um acastelamento autocentrado, produtor tendencial de factos consumados.  A legitimidade eleitoral duma maioria política com um mandato temporal preciso não pode ser invocada quando as decisões que vierem agora a ser tomadas e que tocam toda a população, se estendem muito para lá dos limites efectivos desse mesmo mandato. É imprescindível tirar ilações dos erros do passado – A Regeneração Urbana, que se propõe «garantir a gestão sustentável e inclusiva dos espaços urbanos» é considerada uma prioridade transversal. Mas impossível será não pensar nos pontos negativos patentes na primeira fase desse plano de acção e de como eles fazem lembrar, quase um século depois, as palavras que Raul Proença, um notável filho desta cidade, escrevia em 1927 no seu «Guia de Portugal»: «As Caldas da Rainha são uma das terras mais banais do país (construções de péssimo gosto)».

Oxalá pois não venha a ser esta uma derradeira e irremediável oportunidade perdida!

 

José Carlos Faria

 

jcrffaria@gmail.com