“Não gosto de confundir fé com fezada”, afirmou Fernando Santos nas Gaeiras

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Gazeta das Caldas

FernandoSantos1A Paróquia Nossa Senhora da Ajuda convidou o seleccionador nacional Fernando Santos a partilhar a sua experiência sobre a fé cristã, na passada sexta-feira à noite, dia 17 de Abril. A nova igreja das Gaeiras esteve cheia para assistir ao discurso do treinador, que em nenhum momento escondeu o carinho que sente pela vila, chegando mesmo a admitir que os “valores da aldeia” contribuíram bastante para a formação da sua personalidade. Fernando Santos revelou também ser um cristão esclarecido: não gosta de misturar a fé religiosa com o futebol, defendendo que o sucesso da sua carreira desportiva se explica com muito trabalho e dedicação e não com “milagres”.
Sem papéis nem discurso previamente preparado, Fernando Santos falou com simplicidade e poucas formalidades para o público presente na igreja. De início, a emoção fez-se sentir nas suas palavras: “Não está fácil, é um orgulho enorme estar aqui a falar para pessoas que conheço desde que nasci praticamente”. Quando tinha seis anos, o pai comprou uma casa nas Gaeiras e por isso desde tenra idade começou a criar recordações. Em jovem, Fernando Santos chegou a integrar a equipa de futebol gaeirense e a participar nas procissões com os amigos, “na altura por malandrice, porque as raparigas achavam piada”. Hoje, sempre que passa pela vila, faz questão de participar na missa. Mas nem sempre foi assim.
Durante muitos anos, contou o seleccionador, manteve-se afastado da Igreja, com dúvidas sobre a natureza da fé cristã. Em Março de 1994 voltou a aproximar-se, não só para acompanhar o percurso dos filhos, que celebravam o crisma, mas também graças ao livro “A Fé Explicada”, oferecido por um padre de Cascais, que o ajudou a encontrar as respostas que lhe faltavam.
Hoje, Fernando Santos é um cristão esclarecido, defendendo que a fé significa acreditar “num Deus encarnado pelo filho, Jesus Cristo, que morreu e ressuscitou”. Por isso, segundo o ponto de vista do seleccionador, todos os outros significados associados à palavra “fé”, como “acreditar” ou “esperança” são insuficientes para explicar o seu verdadeiro sentido. Aliás, Fernando Santos fez questão de distinguir “fé” de “fezada” e, se a primeira está ligada à Igreja, a segunda pode aplicar-se ao futebol. “As fezadas são as manias e as superstições que as pessoas têm”, explicou o treinador, que também já teve as suas “fezadas”. Quando começou a treinar o Estoril – e a vencer jogos – usava sempre o mesmo fato de fazenda. A partir de certa altura, assim que começou a perder, ainda trocou de fato algumas vezes, até “perceber que uma coisa não tinha nada a ver com a outra”.
No seu discurso, Fernando Santos sublinhou igualmente como ninguém deve ter vergonha de afirmar a sua fé, acrescentando que “respeitar uma fé é essencialmente respeitar a fé dos outros”. O facto de trabalhar com atletas de várias nacionalidades com diferentes crenças tem ajudado o treinador a ganhar cada vez mais respeito por outras religiões. “Ou não fosse o primeiro mandamento de Deus “amai-vos uns aos outros”!…”, recordou. Por outro lado, é de opinião que a fé em nada influencia o seu sucesso profissional, embora reconheça que o tenha ajudado a crescer enquanto homem. Por exemplo, durante o período em que viveu na Grécia (onde permaneceu durante sete anos consecutivos, tanto como treinador como seleccionador), Fernando Santos relembra que passado uma semana queria fazer as malas e voltar para Portugal. “Nos primeiros tempos, a fé ajudou-me bastante, porque senti que ao ir à igreja tinha algo em comum com a comunidade grega, partilhávamos o mesmo ideal”, contou o treinador aos presentes. Também quando comandava o Estrela da Amadora, nos anos 90, foi a fé que impediu o técnico português de “abandonar o barco”, na altura em que a equipa se arriscava a descer de divisão.