Preservar a liberdade de imprensa é defender a democracia

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Seminário reuniu dezenas de jornalistas de vários países europeus

Seminário no Parlamento Europeu discutiu principais problemas do exercício do jornalismo , desde o condicionamento dos governos, à guerra da desinformação.

Joaquim Paulo, em Estrasburgo

Com a guerra na Ucrânia em pano de fundo, a correlação entre a qualidade dos sistemas democráticos e a imprensa livre está no cerne das preocupações das instituições europeias. Na semana passada, em Estrasburgo, dezenas de jornalistas oriundos de meios de vários países marcaram presença no seminário “Preservar a imprensa livre: o papel da União Europeia”, que decorreu no Parlamento Europeu.
A iniciativa coincidiu com a entrega do prémio que honra a memória de Daphne Caruana Galizia, uma jornalista maltesa assassinada em 2017 na sequência do trabalho que desenvolveu em torno dos temas anticorrupção. Os jornalistas Clément Di Roma e Carol Valade receberam o galardão com o documentário “República Centro-Africana: a capacidade de influência russa”
No discurso de abertura dos trabalhos, Pina Picierno, vice-presidente do Parlamento Europeu, considerou que “neste momento haver jornalismo forte é uma necessidade do sistema democrático”. “Nalguns casos, no meu país os jornalistas pagam um preço muito alto por exercer a profissão”, aludiu a italiana, para quem “o primeiro ataque ao Estado de direito é à imprensa livre”.

Vera Jourová, vice-presidente da Comissão Europeia para a Transparência e Valores, reforça a ideia da pressão ilegítima sobre a atividade dos jornalistas em Itália, onde há profissionais “com proteção policial da Máfia “por fazerem trabalho de investigação. Mas os problemas não estão concentrados numa região ou país. Na leitura da checa, a “politização do jornalismo está a crescer em toda a Europa” e “a primeira vítima de uma guerra é a verdade”.
“Quanto menos se confia nos jornalistas, mais espaço há para a desinformação”, salientou a responsável da pasta dos Valores e Transparência, criticando a forma como a Rússia está a atuar no espaço mediático a propósito do conflito na Ucrânia. A comissária europeia defendeu, no passado mês de setembro, a aprovação da legislação para a proteção da liberdade de imprensa e a salvaguarda da pluralidade, que defende, entre outros aspetos, a independência editorial dos orgãos de comunicação social públicos em relação aos governos.
Cinco anos depois da morte da mãe, Matthew Caruana Galizia continua “à espera de uma acusação” sobre os casos de corrupção denunciados. E clama justiça, pedindo medidas para evitar os efeitos da desinformação. “Ela não foi assassinada apenas porque as pessoas não gostavam dela. A propaganda que se fez no nosso país foi o que a levou a ser assassinada e a minha mãe estava a investigar alta corrupção no setor da energia em Malta”, observou o… jornalista de investigação, que lidera a fundação que tem como propósito garantir justiça no caso da morte da progenitora.
“Os homicídios de jornalistas na União Europeia estão ligados à corrupção de alto nível. Espero que haja condenações de todos os envolvidos no assassinato da minha mãe”, advertiu o maltês.
“Sem liberdade de imprensa não podemos ter liberdade”, sustenta Roberta Metsola, a maltesa que lidera o Parlamento Europeu e que fez questão de participar no encerramento do seminário em França.
No fim do dia, para a comissária para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, a bósnia Dunja Mijatovic, o segredo é um: “Não podemos nunca desistir e estas iniciativas ajudam a dar visibilidade aos problemas da liberdade de imprensa. Uma das principais lições da Daphne é que não devemos ficar em silêncio perante abusos. Ela fez a escolha de falar e com independência, em nome do interesse público”. E isso tem um preço. Muitas vezes demasiado alto.