Ferreira da Silva de “O Grito” aos nossos dias

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F2UXY8~0 Foto-2---Ferreira-silva+-Barroso041 Foto-3---Ferreira-da-silva-Af Foto-4---JantarHomenagemExcelente repasto, excelente companhia, longe das “forças vivas”?! da terra, o que decorreu em Abril na Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste nas Caldas da Rainha.
Souberam interpretar a preceito o artista.
No final os discursos da praxe. Mestre para aqui, mestre para ali…
Picasso não aceitava o tratamento por mestre, citaremos Jean-Paul Crespelle no seu livro: Picasso – as mulheres/os amigos/a obra.
“…Juan Gris…logo no primeiro encontro tratou-o por “mestre”, o que deixou Picasso atónito. Picasso não tinha ainda pensado que pudessem dar-lhe esse título, reservado aos pontífices ridículos da arte académica. Nunca o aceitou, mas tem tolerado, nestes últimos anos, que os amigos íntimos lhe chamem “maestro”, título que o diverte pela sua ambiguidade. Apesar de se ter irritado, embora ironicamente, com Juan Gris, começou então, por piada, a chamar “mestre” a todos os seus amigos.”… fim de citação.
Ferreira da Silva é um artista plástico de vanguarda no panorama artístico nacional, que vou ombrear aqui e agora apenas com os que também foram ceramistas em grau substantivo.
Começo com Jorge Barradas o primeiro que nos nossos tempos aplicou no barro as suas formas modernistas em peças que vidrava na Fábrica Viúva Lamego.
Também pintor de elevadíssima craveira, as suas estilizações bem características deram-nos figuras e formas de grande beleza e notáveis painéis de azulejos.
Manuel Cargaleiro, seu seguidor na Viúva Lamego, para mim talvez ainda mais criativo na cerâmica do que na pintura, é em ambas muito apreciado.
Depois Querubim Lapa( não gosta de ser mestre, prefere  professor que foi, de cerâmica, na Escola  de Ensino Artístico António Arroio, com o devido reconhecimento) Cecília de Sousa, Manuela Madureira, Artur José, Maria de Lurdes Castro, José Sanches..
Mas para este escriba, que também foi das “químicas”(químico-farmacêutico) – e que arte apenas coleciona – Ferreira da Silva é o maior ceramista português dos nossos tempos.
Porque não gravou apenas sobre o barro o seu traço, como tão bem fizeram os que atrás citei, mas  inovou!  inventou! transformou! criou formas diferentes de dimensões apreciáveis que depois pintou e vidrou como ninguém e vou citá-lo :”com alquimia e metamorfose”.
Interpretou a Arte do seu tempo, modelou o barro como poucos, arriscou no forno a transformação (al)química de vidros e engobes com resultados nunca antes conseguidos.
Vidrados mate e brilhantes, a ouro, amarelo alaranjado de urânio, verdes cobreados, azuis intensos… espessos, negros sombrios, cinzas profundos… de um “arco-íris” muito seu que o forno nem sempre concedia à primeira.
Mas para quem não se recorde, o “nosso” Luís Ferreira da Silva, ganhou o prémio nacional de escultura Soares dos Reis em1964 com “Grito”, “Assemblage” de ferros reconvertidos de sucata em arte maior, de que Pedro Oom, em entrevista à revista Artes & Letras de 1963,incluida na colectânea de textos de Mário Cesariny: A Intervenção Surrealista, disse: “…recorde-se a última exposição de artes plásticas da Fundação Gulbenkian e veja-se até que ponto se pode “aburguesar” a posição libertadora em que se sentiam muitos dos que naquela exposição colaboraram.
De tudo o que me foi dado ver, só um objecto, “Grito” de Ferreira da Silva, era efectivamente um grito discordante entre todo aquele conformismo de “estetas”.
Nem um Júlio Pomar, um Jorge Vieira, um Jorge de Oliveira, um Fernando de Azevedo ou um Vespeira escaparam…” fim de citação.
Ferreira da Silva é um artista plástico sem mestre que se forjou à boca dos fornos da Estatuária Artística de Coimbra (Frutuoso), na Cerâmica Bombarralense Lda., na Olaria de Alcobaça (OAL), na Vestal e na Secla onde foi artista residente com as intermitências próprias do seu génio.
Nestes locais de intenso labor cerâmico contactou com artistas como Vasco Pereira da Conceição, Maria Barreira, Jorge de Almeida Monteiro, Júlio Pomar, António Quadros, António Areal, José Aurélio, Hansi Stael e tantos outros que seria fastidioso enumerar. Também foi gravador de mérito. Em Paris foi bolseiro da Fundação Gulbenkian em tempos do Maio de 1968.
Fundou em1975 a Ceramex na Benedita onde produziu grés fino para hotelaria, formas e decorações inovadoras, destinadas sobretudo à exportação.
E não pára.
Em conclusão: degustei pratos deliciosos “desenhados” para celebrar a obra do Ferreira da Silva, com quem aprendi, a ouvi-lo e a ver as suas peças, quase tudo do pouco que sei de cerâmica.