Albufeira de Valência – uma lagoa, cultivo

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Gazeta das Caldas

Albufeira de ValenciaA dez quilómetros da cidade espanhola de Valencia, há um género de lagoa que envolve um extenso parque natural, com ligação ao mar mediterrâneo, com uma extensão de 23,94 km² e rodeada de 223 Km2 de arrozais. Contudo, a sua bacia hidrográfica tem uma área de 917 km2, separada do mar por uma restinga arenosa estabilizada de dunas e pinheiros e é um excelente atractivo para inúmeras espécies de aves migratórias. Nesta restinga podem-se encontrar belas praias que atraem muitos banhistas.
Este exemplo de uma zona húmida que tem um valor ambiental e simultaneamente económico para milhares de pessoas, pode servir de alguma forma para equacionar muitas das questões que se colocam na nossa lagoa de Óbidos.
Enquanto parque natural, tem uma protecção especial ambiental, que apesar de muitas restrições, torna toda aquela área com um enorme potencial turístico, atraindo diariamente, mas especialmente ao fim de semana e no Verão, milhares de visitantes que ali passam uma jornada, tomam as suas refeições nos inúmeros restaurantes, observam a fauna e a vegetação, fazem percursos pedonais, cicláveis e lacustres em bateiras tradicionais. Outro elemento interessante é o facto de terem construído plataformas de observação do pôr do sol, onde se juntam algumas centenas de pessoas para observarem tão belo fenómeno sobre as águas da albufeira.
Tal como a Lagoa de Óbidos, que une dois concelhos (Caldas da Rainha e de Óbidos), também a Albufeira de Valencia une os municípios de Ribera Alta, Ribera Baja, Huerta Sur e o próprio município de Valencia, que é também a capital da região. Isto para além dos outros municípios circundantes que estão ligados aquele santuário natural através de rios que desaguam naquele ecosistema. A Albufeira está ligada ao mar através de três canais ou “golas” que permitem a entrada e saída de água, ao sabor das marés.
O prato típico da região valenciana é o célebre, em português, “arroz à Valenciana”, mas que na sua origem se pode chamar de paella, de muitos géneros e sabores, como arroz à la banda ou arroz negro, etc. O fenómeno desta prato já levou, na senda da experiência internacional das pizzerias italianas, a emergirem um novo género de restaurantes denominados de “arrocerias”, especializados em pratos à base de um arroz especial, que é cultivado naquela albufeira.
A Albufeira tem inúmeros canais e ancoradouros de pequenas embarcações que a atravessam com pescadores ou turistas, beneficiado da calma das águas e da beleza da paisagem, bem como de um clima bem agradável e clemente, tanto no Inverno como no Verão, compensando respectivamente as mais baixas e altas temperaturas das áreas urbanas. Especialmente ao domingo vêem-se muitas dezenas de grupos a fazerem aqueles passeios, alguns cantando e tocando os instrumentos tradicionais daquela região valenciana.
Antes e depois dos passeios pela Albufeira, dirigem-se aos inúmeros restaurantes (“arrocerias”) onde vão degustar as mais variadas iguarias, mas especialmente os pratos à base de arroz ou de feijão verde (“fideos”), ou ainda mariscos ou peixes, parte pescados ali, cozinhados de outra forma. O cultivo do arroz (“redondo”) iniciou-se no séc. XIX, constituindo um habitat determinante para garantir o equilíbrio ecológico de todo aquele sistema natural, para além de um meio fundamental de criação de valor e riqueza.

A experiência de assistir à confecção de uma paella

Os restaurantes de Albufera têm nas traseiras cozinhas especialmente equipadas com um género de linha de montagem de pratos à base de arroz, cuja confecção nunca demora menos de uma hora, razão pela qual quem pretende fazer uma refeição daquele tipo deve encomendá-la com antecedência ou então, esperar deliciando-se com as várias “tapas” (petiscos) que os restaurantes do país vizinho oferecem em profusão.
Nessa chamada linha de montagem, as paellas ou “arrozes” dividem-se em dois grupos: de um lado as paellas à base de peixe e marisco, do outro, as paellas à base de carne, uma vez que no primeiro caso a parte mais substancial da confecção é gasta na preparação do acompanhamento de legumes (cebola, pimentos, alhos, calda de tomate, açafrão, folhas de louro, água, azeite e sal).
Todos estes ingredientes estão a apurar durante bastante tempo, a que se acrescenta caldo de peixe preparado com inúmeras espécies daquela região, que lhe dão um paladar e um cheiro muito saboroso. Depois, na fase final, é lançado o arroz, o peixe e/ou o marisco, que acompanha o resto da cozedura. O arroz é seco com a colocação, com grande precisão, das brasas feitas de ripa de madeira. Este prato é cozinhado nas conhecidas paelleras, género de frigideiras de várias dimensões que podem ser utilizadas para quatro, seis, oito, 12, 20 ou mais comensais. O arroz, juntamente com o conteúdo escolhido, apresenta-se seco, muito saboroso e com um aspecto que faz crescer água na boca. Tradicionalmente cada grupo come directamente na paellera, cada pessoa com o seu garfo, podendo ser servido maionese para refrescar o sabor. Nos arrozes de peixe, há um muito em voga, que é o arroz negro, que é feito à base de choco com tinta.
Nas paellas de carne. Especialmente de frango ou coelho, primeiro é feito um refogado da carne com azeite, presunto em cubos, linguiça, cebola picada, pimentos, folhas de louro, pimentão picante e ervilhas ou favas. Este refogado em lume brando demora bastante tempo, operação que é acelerada quando se aproxima a hora de servir, quando se junta água e outros condimentos e o arroz, que depois é cozido e seco, como referimos antes na paella de marisco.
É evidente que se torna difícil descrever com pormenor o processo da elaboração destes pratos, havendo muitos ingredientes que são segredos dos cozinheiros, que permanecem longas horas em frente aos fornos. Os preços num restaurante mediano, apesar de qualidade na preparação deste prato, é acessível para uma bolsa média, podendo custar em cerca de 10 euros.
Os valencianos são pessoas muito prazenteiras e amantes da cozinha, fazendo da sua confecção uma festa, tanto no restaurante, como em casa, onde frequentemente se juntam dezenas de familiares e amigos ao fim de semana, para prepararem e deliciarem-se com a paella, em ambiente festivo, com muito comida e bebida.