Uma caricatura de Boris Johnson foi a vencedora do World Press Cartoon cuja gala, com restrições, aconteceu no dia 19, no CCC, pelo quarto ano consecutivo. Na sessão, pontuada por participações on-line de premiados de todo o mundo, Caldas foi anunciada como cidade da irreverência.

Uma caricatura de Boris Johnson, do alemão Frank Hoppmann, mereceu a distinção com o Grand Prix da 15ª edição do World Press Cartoon (WPC), cuja gala voltou a realizar-se no CCC pelo quarto ano consecutivo.
A apresentação deste salão internacional coube à apresentadora da RTP, Inês Gonçalves, que foi chamando a atenção para o facto de se viverem dias estranhos com ameaças à liberdade de imprensa em vários países do mundo.
“Jornais sem cartoons são jornais incompletos”, comentou a apresentadora, antes de chamar António, o director do evento ao palco.
Para o cartoonista que trabalha há décadas no jornal Expresso, a caricatura “faz parte do ADN da cidade das Caldas e por isso o evento não pode parar”. O autor deixou ainda nota de “quem gosta e defende a liberdade de expressão, também defende o cartoon”.
O presidente da Câmara, Tinta Ferreira concorda que a cidade tem o cartoon no seu ADN dado que “Bordalo Pinheiro nos deixou essa marca”.

Caldas conhecida pelo mundo

O autarca referiu também que as Caldas, através do WPC “é conhecida e falada um pouco por todo o mundo”.
Tinta Ferreira considera que hoje, as novas tecnologias “permitem hoje dar a conhecer uma cidade por todo o planeta”.
O presidente da Câmara referiu na sessão que as Caldas da Rainha está empenhada com o WPC, até porque o cartoon é “uma forma de expressão da democracia e da liberdade e que temos que preservar e manter”, rematou.
Já o director da Gazeta das Caldas, José Luís de Almeida Silva, aproveitou a ocasião da entrega de prémios aos vencedores para felicitar António por continuar a lutar com os seus cartoons “contra candidatos a autoritários e manipuladores”. O responsável fez também referência ao jornal satírico francês Charlie Hebdo. “Este é o momento de homenagear as pessoas que lutam a nível global lutam pela liberdade de imprensa, pelo saber e pela livre opinião”, rematou.
Entre outras personalidades caldenses, ligadas às escolas e aos museus, a vereadora da Cultura, Maria da Conceição Pereira sublinhou o facto das Caldas da Rainha ser hoje a Cidade Criativa da Unesco. A autarca salientou que a localidade deve também ser conhecida pela sua irreverência e luta pela liberdade. A vereadora fez referência ao Levantamento das Caldas que aconteceu a 16 de Março de 1974. “Foi das Caldas que saiu o primeiro grito de liberdade”, destacou.
Quem subiu ao palco concorda que as Caldas deveria ser a cidade da caricatura e do humor. “Caldas é uma espécie de aldeia gaulesa da irreverência”, sintetizou a apresentadora Inês Gonçalves que durante a cerimónia deu a conhecer que é casada com um caldense.

Quem
defende a liberdade de expressão também defende
o cartoon

António

Ao longo da noite não faltou animação com o humorista belga Elliot Jenicot – que já esteve presente na edição de 2017 –e que começou a sua intervenção mostrando imagens do próprio a chegar à região num pequeno barco, na Lagoa de Óbidos.
Ao longo da sua participação foi inevitável as várias referências às novas circunstâncias que vivemos por causa da covid-19.
O duo humorístico italiano Luce & Tino também divertiram os presentes e mais uma vez o novo coronavírus foi uma referência incontornável.
A animação musical esteve muito bem entregue à Orquestra Ligeira Monte Olivett dirigida pelo maestro David Santos. Durante o espectáculo o grupo prestou homenagem a Amália.

Trabalhos premiados

O desenho vencedor do Grande Prémio – de Boris Johnson – foi publicado no jornal online alemão Eulenspiegel, em Outubro de 2019. Entre os nove premiados, Frank Hoppman arrecadou o maior prémio no valor de 10 mil euros.
Durante a gala foram vários os cartoonistas que participaram na sessão via internet, deixando testemunhos emotivos pela liberdade de expressão. Ainda na categoria de caricatura, o júri atribuiu o 2º prémio à obra Jair Bolsonaro, do mexicano Darío, publicado no jornal espanhol Mundiario.
Christine Lagarde, do português Pedro Silva, publicado na plataforma de cartoons holandesa Cartoon Movement ficou classificada em 3º prémio lugar.
No que diz respeito ao Desenho de Humor, o 1º prémio foi atribuído ao grego Georgopalis, para a obra Message in a Bottle. O segundo prémio foi para Populismo, do nicaraguense Px Molina.
O terceiro galardoado foi para o autor croata Listes com o trabalho Novos Líderes Mundiais. Os desenhos foram feitos para as publicações Real News, Confidencial e Buduàr, respectivamente.
Na categoria Cartoon Editorial, o 1º prémio foi atribuído ao grego Aytos, pelo seu desenho “Política Mundial”, publicado na plataforma de cartoons holandesa Cartoon Movement.
O segundo prémio foi para o trabalho Tatuagem Xi Jimping, do brasileiro Cau Gomez, publicado no jornal brasileiro A Tarde. O terceiro foi entregue ao artista grego Kountouris, por Coletes de Salvamento e Coletes Amarelos, das páginas do jornal grego Efimerida Ton Syntakton.
Os desenhos foram avaliados por um júri internacional que integrou António Antunes, a jornalista Sabine Glaubitz (Alemanha) e os cartoonistas Jakub Wiejacki (Polónia), Jean-Michel Renault (França) e Osmani Simanca (Cuba) que reuniram nas Caldas, em Fevereiro passado.
A cerimónia foi antecedida por uma sessão de caricatura ao vivo que teve lugar de manhã em vários cafés do centro da cidade.
Ao todo, foram mais de mil os trabalhos que participaram na competição e que foram publicadas em jornais (impressos e on-line) oriundos de 72 países. A selecção dos melhores trabalhos deste ano – num total de 270 – estão patentes no CCC que pode ser apreciada no foyer e também nas galerias que dão acesso à sala de espectáculos.
A mostra poderá ser apreciada até 15 de Novembro.
Gazeta das Caldas apurou que a continuação do evento será apresentada ao executivo camarário, desde que se mantenha a mesma comparticipação finaceira do município e que é de 180 mil euros.

 

Em discurso directo

“Saldo muito positivo”

“Creio que o saldo do evento deste ano é muito positivo, apesar de todas as limitações. A animação do espectáculo foi muito boa. Mesmo nestas condições adversas, agradecemos às Caldas ter tido a coragem de fazer este evento, tendo apenas adiado uns meses a sua realização. Actualmente a situação do jornalismo é má e, por consequência, também é para o cartoon. Esperamos e sonhamos em reverter a situação. Vivem-se dias de opressão que as pessoas não gostam. Gostar de cartoon está directamente relacionado com a Liberdade e com a Democracia”.
António Antunes (director do World Press Cartoon)

 

“Foi uma bela surpresa ter ganho!”

“Foi uma bela surpresa para mim ter ganho! Tenho vários colegas que estão muito apreensivos com a falta de liberdade e de expressão na actualidade. De certa forma ainda dá maior importância aos cartoons. Temos que continuar a mostrar ao mundo o que está errado e devemos continuar a fazê-lo. Deixem-nos continuar a ser corajosos e a lutar e sempre que possível com humor”.
Frank Hoppman (vencedor do Grande Prémio e da Melhor Caricatura)

 

 

“Desafio outros autores a publicar”

“Estou muito satisfeito. Já tinha concorrido antes e já tinha vindo às Caldas para assistir à cerimónia em anos anteriores. Considero que deveria haver mais portugueses a concorrer e, por isso, desafio e encorajo outros autores a fazê-lo e a publicar os trabalhos em papel e nas plataformas digitais. Penso que nas Caldas da Rainha tem sido feito um bom trabalho a patrocinar esta iniciativa”
Pedro Silva (Cartoonista português premiado)

 

 

“A democracia vive em ameaça”

“Mandei bons trabalhos este ano e venci um dos prémios da noite. Hoje [sábado] os artistas estão muito condicionados a usar os meios digitais. O World Press Cartoon escolhe e privilegia os trabalhos feitos no resgate das técnicas mais antigas, o que é óptimo. Já participei na edição de há dois anos e na altura avisei que havia um grupo de neo-fascistas que aposta nas fake news e que assim vai agindo em vários países… No meu país hoje há um Presidente que não me representa, que persegue activistas e que defende o uso de armas…Veja-se o que está a acontecer na Amazónia…A imprensa está a ser perseguida de uma forma que já não se via desde a ditadura. É muito triste não haver a preservação da liberdade de expressão. A democracia vive hoje em permanente ameaça”.
Cao Gomez (Cartoonista brasileiro premiado)